MUDANÇA NO SISTEMA

O que é semipresidencialismo e como isso pode alterar o xadrez político no Brasil?

Modelo de governo é defendido por políticos e ministros do STF, mas criticado por partidos de esquerda, como o PT

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Marcelo Aprígio

Publicado em 18/11/2021 às 11:25 | Atualizado em 18/11/2021 às 19:53
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O ex-presidente Michel Temer (MDB) voltou a defender a implementação de um sistema de governo semipresidencialista no Brasil. A declaração foi dada nessa quarta-feira (17), no IX Fórum Jurídico de Lisboa, que contou com a participação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, um dos maiores defensores do modelo.

A fala de Temer ocorre pouco tempo após o também ministro do STF Dias Toffoli e os presidentes da Câmara e do Senado, Arthur Lira (PP) e Rodrigo Pacheco (PSD), respectivamente, defenderem a mesma ideia. Mas o que é semipresidencialismo e como isso pode alterar o xadrez político no Brasil?

Com dois impeachments em menos de 30 anos, frequentes crises políticas e institucionais e um clima de instabilidade política, vez ou outra surge o debate em torno do modelo de presidencialismo de coalizão, que vigora hoje no Brasil. Há quem defenda que ele é ineficaz e, portanto, precisa ser alterado.

É nessa esteira que cresce a defesa do semipresidencialismo. Tanto que uma proposta sobre o tema foi protocolada na Câmara dos Deputados em 2020 e poderia ser colocada em andamento por Arthur Lira, porém há inúmeras divergências quanto à aplicação do modelo no país.

O que é semipresidencialismo?

No semipresidencialismo, existe um presidente, eleito pelo voto popular, e um primeiro-ministro, escolhido pelo Parlamento. Os dois compartilham atribuições governamentais. É o que explica o cientista político Elton Gomes, professor da Faculdade Damas.

“Neste modelo, tanto o presidente eleito, quanto o primeiro-ministro possuem poderes reais, com competências muito bem divididas. Essa divisão, porém, depende de país para país”, afirma, lembrando que França e Portugal estão entre os exemplos de nações que adotam o modelo.

Defensores da proposta afirmam que o semipresidencialismo permitiria maior estabilidade política ao país. Já os críticos dizem que o modelo seria de difícil aplicação no Brasil e não traria os efeitos pretendidos.

O autor da Proposta de Emenda à Constituição (PEC), deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), argumenta que o semipresidencialismo não visa ser contra ou a favor de Jair Bolsonaro (sem partido) ou Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e sim um sistema para melhorar a governabilidade do país.

Ele defende que a mudança deixaria mais clara a coalizão formada para dar sustentação a governos. "O semipresidencialismo é uma evolução do presidencialismo. Não é um novo regime, é um novo modelo de governança."

Oposição da esquerda

Para tentar fazer a ideia andar, Moreira já correu atrás de Lira, defensor público da mudança. A campanha do pepista pelo novo modelo, porém, tem suscitado críticas de partidos da oposição, principalmente do PT, que lidera as pesquisas de intenção de voto para 2022.

Para essas legendas, a mudança trata-se de uma manobra para mudar as regras do jogo e evitar que a esquerda volte a ocupar a chefia do Poder Executivo. O principal argumento é o de que a população prefere o modelo presidencialista.

O Brasil já teve um plebiscito sobre o tema. A consulta ocorreu em 1993, e a população brasileira rejeitou a implementação do parlamentarismo, preferindo permanecer com o modelo presidencialista.

A cientista política Priscila Lapa, professora da Faculdade de Ciências Humanas de Olinda (Facho), diz, porém, que utilizar os plebiscitos feitos em 1963 e em 1993 como base na discussão não é o melhor caminho para argumentar contra a proposta.

“Essa questão de ter sido rejeitado no passado é de fato inócua, justamente por haver mudanças na sociedade e nos ciclos políticos. Acredito que valeria a pena, sim, ouvir a sociedade. As grandes reformas nunca têm a participação da sociedade em sua concepção. A sociedade precisa apontar os problemas que ela deseja ver resolvidos e dizer qual a sua disposição para essa mudança”, explica.

“Não devemos descartar essa proposta. Corremos o risco de sofrer o terceiro impeachment em 30 anos. O sistema brasileiro se mostrou frágil. Pensar soluções para ele não é inviável”, completa.

As legendas de oposição também veem a defesa de Lira como uma tentativa de se esquivar da análise dos pedidos de impeachment contra Bolsonaro. Isso porque, o presidente da Câmara tem dito que o semipresidencialismo é uma maneira de combater a instabilidade e melhorar a gestão. Ele argumenta que todos os presidentes da República foram alvo de pedidos de abertura de impeachment. No caso dos mais de cem pedidos contra Bolsonaro, cabe justamente a Lira analisar se aceita ou não a peça.

ALAN SANTOS/PR
Bolsonaro, Pacheco e Lira antes da Sessão Solene do Congresso Nacional de inauguração da 3ª Sessão Legislativa Ordinária da 56ª Legislatura - ALAN SANTOS/PR

Especialistas apontam inviabilidade

Especialistas, porém, discordam do pepista e apontam a grande quantidade de partidos como o maior empecilho para fazer o novo modelo dar certo. Para o cientista político Vanuccio Pimentel, professor da Asces-Unita, caso a proposta fosse implantada no Brasil, o modelo não surtiria o efeito imaginado pelos defensores. Ele dá como exemplo a grande quantidade de partidos por aqui, diferentemente de outros países que utilizam o modelo.

“Não devemos descartar essa proposta. Corremos o risco de sofrer o terceiro impeachment em 30 anos. O sistema brasileiro se mostrou frágil. Pensar soluções para ele não é inviável, mas podemos pensar também em como melhorar o sistema que temos hoje", diz Pimentel.

“O semipresidencialismo não é a solução para todos os nossos problemas. Ele não aumentaria a governabilidade, não diminuiria o impeachment como problema político permanente do país, não fortaleceria os partidos do ponto de vista organizacional programático", emenda.

Elton Gomes também acredita que a mudança de modelo de governo pode trazer complicações. "Seria um sistema de difícil compreensão acerca dos limites de cada ator para a população e que poderia nos levar a impasses institucionais ainda mais complicados do que aqueles que temos hoje."

"Vivemos uma crise de governo hoje que não pode ser confundida com uma crise de regime. Nesse sentido, é mais importante educar os brasileiros para a cidadania e a compreensão das instituições vigentes que pensar em amplas reformas a cada véspera de um processo eleitoral, como temos feito atualmente", conclui Gomes.

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