Eleições 2022

Federações partidárias se tornam realidade, mas estão longe de ser consenso entre analistas políticos

Mudanças foram aprovadas na última semana pelo Supremo Tribunal Federal (STF)

Renata Monteiro
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Renata Monteiro
Publicado em 13/02/2022 às 8:00
AGÊNCIA SENADO
DESEQUILÍBRIO DE FORÇAS Partidos que conseguirem formar federações dentro do prazo poderão fazer bancadas maiores no Congresso Nacional - FOTO: AGÊNCIA SENADO
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A validação pelo Supremo Tribunal Federal (STF) da lei que aprovou a criação das federações partidárias tem dividido opiniões no Brasil. De um lado, há quem defenda que o mecanismo pode diminuir a fragmentação partidária, além de fortalecer o sistema político nacional. Do outro, analistas apontam que a iniciativa foi a forma que nossos legisladores encontraram para, disfarçadamente, ressuscitar as coligações proporcionais - extintas desde 2017 -, favorecendo partidos federados.

As federações são, basicamente, um meio para que os partidos possam se aliar em uma determinada eleição, somando tempo de TV e sendo vistos como uma única sigla na hora do cálculo do quociente eleitoral. Diferentemente das coligações, o novo modelo não permite que a aliança seja desfeita após o pleito, devendo valer também para Estados e municípios e durar pelo menos quatro anos. A disputa eleitoral de 2022 será a primeira a contar com esse tipo de arranjo.

“A possibilidade de formação de uma federação entre partidos aprimora a democracia brasileira. Além de diminuir o número de legendas que existem atualmente, a novidade estabelece um mecanismo que junta os partidos de uma forma não casuística, que era o que ocorria com as coligações. Com as federações, a aliança entre as siglas é mais longa, está apoiada em um estatuto e reforça a identidade ideológica desses grupos”, explicou o historiador Thiago Modenesi, especialista em ciência política e professor do Centro Universitário Tiradentes (Unit-PE).

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Hoje, partidos de esquerda e de centro negociam a formação de federações, que têm até 31 de maio para serem oficializadas. Conversam sobre o tema PT, PSB, PV e PCdoB; PSOL e Rede; Cidadania e PSDB; PSDB e MDB; e MDB e União Brasil. Para algumas dessas agremiações, no entanto, questões regionais têm se mostrado entraves importantes para a concretização das alianças.

Em Pernambuco, por exemplo, tanto PSDB quanto o União Brasil são da oposição, enquanto o MDB integra a base aliada do governo. Caso alguma das federações hoje negociadas se concretize, as siglas que fizerem parte dela deverão estar obrigatoriamente do mesmo lado, muito embora hoje nenhuma delas aceite ceder. “Se a federação ocorrer isso vai ser muito positivo para a gente. Sou um torcedor para que aconteça”, afirmou o prefeito de Petrolina, Miguel Coelho, hoje filiado ao União Brasil. Até 2021, o gestor integrava as hostes emedebistas, mas optou por desembarcar da sigla para lançar-se pré-candidato a governador.

Entre os simpáticos às federações, comenta-se ainda que, com menos legendas, deve ser mais fácil para o Executivo negociar com as siglas representadas no Parlamento. “Um dos piores efeitos do grande número de partidos é uma fragmentação, e esse fenômeno leva à deturpação de um modelo que já tem as suas fragilidades, o presidencialismo de coalizão. Isso leva o chefe do Executivo a fazer negociações caso a caso, um a um, e eleva custos políticos, gera muita desarmonia de resultados e dificuldade de acompanhamento por parte do eleitor. Quanto mais reduzido o número de partidos, mais fortalecimento você tem da atuação legislativa e, portanto, são menores os custos políticos. Se essas federações vingarem, essa será a primeira tentativa de se ter legislaturas mais enxutas, que permitam alcançar resultados melhores”, disse a cientista política Priscila Lapa.

ELEIÇÕES PROPORCIONAIS

Analistas políticos contrários à instituição das federações partidárias, por outro lado, vêm encarando as mudanças como uma forma de burla ao fim das coligações proporcionais. Na sessão em que a legislação foi validada, inclusive, o ministro Luís Roberto Barroso, relator da matéria, comentou o caso e rechaçou a ideia. “As coligações ofereciam esse grave risco de fraude da vontade do eleitor, porque partidos sem nenhuma afinidade programática se juntavam ocasionalmente e depois seguiam caminhos diferentes (...). A lei aprovada no Congresso evita esse tipo de distorção”, afirmou o magistrado.

O economista Maurício Romão discorda. Para ele, as novas medidas seriam “uma válvula de escape para partidos sem densidade de votos e para parlamentares com dificuldades de reeleição”, e também dariam certa vantagem às legendas coligadas em eleições proporcionais.

“Na federação, os votos do conjunto de partidos são somados e você tem o total de votos do grupo, assim como ocorria na coligação. Com esses votos é que se sabe quantas cadeiras essa federação terá, passado o quociente eleitoral, e como elas serão distribuídas”, detalhou.

Na visão de Romão, além de atuarem da mesma forma que as coligações - estimulando, por exemplo, o mercado de siglas e votos -, as federações possibilitariam um “desequilíbrio de forças eleitorais”, uma vez que grande parte das legendas que concorrerão nas eleições deste ano não conseguirá entrar em uma federação por várias motivos, como o tempo curto para a formalização do coletivo, “exiguidade de tempo, ausência de afinidades programáticas, exigências de verticalidade e permanência de um mínimo de quatro anos de união”.

“As federações podem, sim, ocupar esse espaço traçado pela ausência de coligações, que já teve um efeito em 2020, foi avaliado e os partidos estão tentando buscar uma solução para reduzir esses custos. Então esses grupos de legendas podem ser vistos como uma tentativa de dar força a certos grupos, a certos ordenamentos políticos que ficaram fragilizados pela ausência das coligações. Mas vamos ver se isso vai ser suficiente para alcançar esse objetivo, porque na verdade as federações têm alguns mecanismos diferentes da coligação”, declarou Priscila Lapa.

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