Quando era criança, Raquel Lyra (PSDB) costumava acompanhar o pai, João Lyra Neto, em agendas políticas em Caruaru, no Agreste. Estava nos comícios, fazia visitas à zona rural e participava de caminhadas.
Em anos eleitorais, arrumava briga com amigos e vizinhos, defendendo os candidatos da família ou os aliados. Na escola, sempre que podia, subia num caixote para discursar.
O envolvimento da menina com a política foi precoce. Aos 9 anos, ela fez campanha para o tio Fernando Lyra, nas primeiras eleições diretas após a ditadura militar. Em 1989, ele concorria como vice-presidente na chapa encabeçada por Leonel Brizola (PDT).
Em uma foto da época, Raquel Lyra aparece vestida de "Brizola Presidente'', da cabeça aos pés, segurando sacolas com material de campanha. Mãe de Raquel Lyra, Dona Mércia Lyra conta que ela estava animada com a candidatura do tio, por quem sempre teve grande admiração.
"Essa foto foi na casa do tio dela, Fernando Lyra. A gente ia começar a fazer panfletagem com o material, quando ela se vestiu toda daquele jeito", recorda.
A chapa brizolista não levou as eleições, que deram vitória a Fernando Collor, mas o momento marcou a luta pela redemocratização do País e inspirou a futura candidata. Na Família Lyra, o calendário da vida seguia o das eleições. Sempre tinha alguém da família ou algum aliado concorrendo. Aí, todo mundo se envolvia.
Entre os Lyra, independentemente da profissão que se escolhe, não se escapa da política. É quase uma ‘herança genética’. Quem não está disputando, está fazendo acontecer nos bastidores. Até Raquel Lyra tentar sua primeira candidatura como deputada estadual, em 2011, não se tinha esperança de que alguém da geração dela fosse encarar a vida pública.
Os irmãos Fernando Lyra e João Lyra Neto casaram com as irmãs Márcia e Mércia Teixeira. Cada casal teve três filhas mulheres.
João e Mércia tiveram Nara, Paula e Raquel, que é a caçula das três. Fernando e Márcia tiveram Patrícia, Renata e Juliana.
Dona Mércia lembra que a tradição política da família começou com o pai de Fernando e João Lyra.
"João Lyra Filho era de família muito pobre e migrou de Lagoa dos Gatos para Caruaru. Ele era mascate e caminhoneiro no começo da vida. Não sabia ler, mas depois aprendeu com sua esposa. Foi um vitorioso. Acabou sendo prefeito de Caruaru por duas vezes, falava bem, era super bem-informado e lia os jornais do começo ao fim. Raquel herdou essa obstinação do avô", diz.
A postura séria da candidata ao governo de Pernambuco, durante as aparições na campanha eleitoral, é a personalidade que ela adota profissionalmente. A irmã do meio, Paula Lyra, revela que no convívio familiar e entre amigos ela é diferente.
"Raquel sempre foi bem molecona. Tem riso frouxo e é bastante brincalhona. Quando era jovem gostava de praticar esportes. Jogou basquete (apesar da pouca altura) e também fez natação. Gostava de animais e tomou para si os cuidados com a cachorra pastor alemão que eu tinha, que foi batizada de Elis, em homenagem à cantora Elis Regina", relembra.
Dona Mércia conta que, como sempre foi reivindicadora, defendeu o direito de a cachorra ter filhotes.
"Raquel defendia que se as pessoas tinham filhos, porque impedir a cachorra de ter filhotes? Por causa disso, tivemos que conseguir um pastor alemão para cruzar com Elis. Quando os cachorrinhos nasceram a mãe só deixava Raquel pegar nos filhotinhos", relata a mãe da candidata.
A irmã de Raquel, Paula Lyra nos recebeu em seu apartamento, no 19º andar da Avenida Boa Viagem, na semana passada, para contribuir com este perfil de Raquel Lyra. Médica pediatra, ela cedeu seu quarto e do marido para acomodar Raquel e os dois filhos João e Fernando.
"Muitas vezes sinto vontade de colocar ela no colo, não só pelo o que sofreu com a morte recente do marido, mas também pela rotina exaustiva da campanha", revela.
As irmãs não disfarçam o amor e a admiração que sentem pela caçula Raquel Lyra. Contam que ela sempre foi determinada e que, quando decidia fazer alguma coisa, assumia um compromisso e queria entregar o seu melhor. A irmã mais velha, Nara Lyra, explica que isso servia tanto para as disputas esportivas quanto para as pretensões profissionais.
"Se ela jogava basquete, queria ser a melhor ou uma das melhores do time. Quando prestou vestibular para Direito na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), ficou em segundo lugar. E também tirou nota dez na prova da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). Raquel foi delegada da Polícia Federal no Rio e no Recife, foi Procuradoria Geral do Estado, chefe da Procuradoria de Apoio Jurídico e Legislativo do governo de Eduardo Campos, Secretaria Estadual da Criança e da Juventude, deputada estadual e prefeita de Caruaru por dois mandatos. Licenciou-se do município para concorrer ao governo de Pernambuco", explica.
Raquel Lyra é elegante na fala, no comportamento e na forma de se vestir. Durante a campanha para o governo do Estado adotou uma paleta de cores com tons de roxo e rosa, que usa principalmente em calças e blusas. Mantém os cabelos arrumados para trás e presos em um rabo de cavalo.
A maquiagem é discreta, em tons nude. Usa brincos pequenos e delicados e carrega no pescoço um colar com dois bonecos, que representam os filhos João e Fernando.
Para este perfil, ela fez imagens no estúdio fotográfico do JC e concedeu entrevista após o debate da TV Jornal, na terça-feira (25). Pediu para retocar a maquiagem, não gostou da cor do batom e mudou. Rearrumou o cabelo. É educada com todas as pessoas e costuma cumprimentar com abraço.
Veja o debate entre Marília Arraes e Raquel Lyra na TV Jornal
Raquel Lyra diz que quer ser governadora para realizar uma mudança verdadeira no Estado.
"Pernambuco precisa mudar e essa mudança não pode se fazer de qualquer jeito, não pode ser uma mudança de faz de conta. Tem que unir os pernambucanos, não pode ter compromisso com erro nem com o passado. Tem que ter capacidade de montar time, de tirar projetos do papel e de sonhar junto com o povo. Mas não pode ficar só no sonho e precisa se transformar em realidade", afirma.
Raquel Lyra acredita que o governo de uma mulher pode fazer a diferença pela capacidade de liderar de um jeito diferente, com mais diálogo. Pela capacidade de enxergar o todo e o detalhe.
"Foi preciso chegar uma mulher à Prefeitura de Caruaru para construir o maior programa de creches e educação infantil do município. Foi preciso chegar uma mulher para construir uma maternidade nova. Foi preciso chegar uma mulher para fazer cursos de qualificação profissional voltados para mulher com acolhimento das suas crianças. Foi preciso chegar uma mulher para comprar uma maca elétrica para quem tem deficiência fazer exame de prevenção de colo de útero. Foi preciso chegar uma mulher para ser campeã de Transparência, segundo o Tribunal de Contas do Estado (TCE)", diz a candidata.
Admiradora do tio Fernando Lyra, Raquel Lyra se emociona ao falar dele. Fernando tem um lugar de destaque na história do Brasil como construtor da democracia. Foi deputado estadual e federal, Ministro da Justiça e coordenador da campanha de Tancredo Neves à Presidência da República.
Embora tenha decidido manter a neutralidade política nestas eleições para a Presidência e não apoiar nem Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nem Jair Bolsonaro (PL), a formação de Raquel Lyra permite imaginar sua inclinação política.
A família sempre se reuniu em torno de Fernando Lyra. Raquel recorda que os encontros e reuniões políticas aconteciam na casa dele e que o tio era o conselheiro de todos.
"Ele é inspiração sempre. Hoje não posso mais ouvir seus conselhos, mas fico imaginando o que ele diria para me ajudar. De alguma forma eu imagino que ele está por aqui e olha por mim", diz.
Dona Mércia destaca que Raquel Lyra é determinada e que conseguiu promover uma reviravolta nas eleições para a Prefeitura de Caruaru, em 2016. Ela imaginava que seria a candidata pelo PSB, quando o governador Paulo Câmara (PSB) convocou a 'candidata' para uma conversa no Palácio do Campo das Princesas, no Recife, quase à meia-noite.
O encontro era para dizer que o candidato seria o médico Jorge Gomes. Rejeitando a decisão, Raquel saiu do PSB e concorreu pelo PSDB contra Jorge Gomes e Tony Gel.
A mãe de Raquel Lyra recorda que no início ela tinha pouca intenção de voto, mas conseguiu promover uma virada e vencer as eleições contra os dois candidatos.
"Na primeira caminhada de Raquel na campanha eu sofri um acidente e ela foi sozinha. Quando chegou no local ligou pra mim e disse que não tinha ninguém, apenas o carro de som e o pessoal com as bandeiras. Eu disse a ela que fosse até o carro de som e orientasse o locutor a anunciar que não se tratava de uma caminhada, mas de uma visita ao bairro. Assim, ela saiu andando e se apresentando de casa em casa. Assim foi se tornando conhecida e acabou vencendo as eleições, com muito trabalho e determinação, como costuma fazer", recorda.
No dia do primeiro turno das eleições para governadora, em 2 de outubro, Raquel Lyra viveu a maior tragédia da sua vida.
Fernando Lucena (44), seu marido há 18 anos e namorado desde os 14 anos, sofreu um infarto fulminante. No final da tarde daquele dia, quando as urnas começaram a ser apuradas, a candidata estava sepultando seu companheiro da vida toda.
Como era possível estar ali, sepultando o marido, se no dia anterior ele participava da última carreata da campanha com ela? Apesar da vitória nas urnas, o dia 2 de outubro de 2022 jamais trará uma lembrança feliz. Uma tragédia inesperada, devastadora, em uma data que não poderia ser.
Desde que o marido de Raquel Lyra faleceu, a candidata teve apenas uma semana para viver seu luto. Depois teve que seguir com a campanha, que era um sonho dela, de Fernando e dos filhos. Paula diz que é possível perceber a tristeza em seu semblante e que tenta consolá-la.
"Tem dias que ela acorda e me pergunta se a maquiagem vai conseguir disfarçar os olhos inchados de chorar. Respondo que vamos fazer o possível, mas que ela não precisa se preocupar porque todos sabem que esta é a Raquel desse momento", diz a irmã.
Quando passar as eleições, Raquel Lyra vai pegar os filhos, juntar a família e se recolher por poucos dias. Caso vença as eleições neste domingo (30), contra a adversária Marília Arraes (SD), quer colocar Pernambuco em um novo rumo e transformar a vida da população.
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