Por que criança de 11 anos, vítima de violência sexual, teve o direito ao aborto negado? Entenda o caso
Lei brasileira prevê aborto sem ônus legal para médico e gestante em casos de gravidez resultante de violência sexual
O tema do aborto legal voltou a ser destaque no Brasil após uma menina de 11 anos, que foi vítima de estupro, ter o direito negado pela Justiça de Santa Catarina.
O caso da jovem, que descobriu estar grávida de 22 semanas após ser atendida no Hospital Universitário de Florianópolis, foi revelado pelo The Intercept Brasil e o Portal Catarinas nesta segunda-feira (20).
A menina de 11 anos foi vítima de violência sexual no início do ano e engravidou. Ao ser atendida na unidade hospitalar, que é credenciada para a realização de abortos, teve o pedido negado pelo próprio hospital no dia 4 de maio.
Assim, o caso foi parar na Justiça. A 2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Catarina (MPSC) entrou com uma "ação pleiteando autorização judicial para interrupção de gravidez assistida, segundo critérios definidos pela equipe médica responsável".
Entretanto, a criança teve mais uma resposta negativa no judiciário, o que viola seus direitos garantidos por lei. Segundo a reportagem, a juíza Joana Ribeiro preferiu encaminhar a criança a um abrigo, negando a possibilidade de um aborto após 22 semanas de gestação.
Ainda de acordo com os detalhes revelados pela denúncia, a juíza induziu a criança a manter a gravidez. A fala foi gravada em um vídeo da audiência, ocorrida no dia 9 de maio. "Você suportaria ficar mais um pouquinho?", perguntou a juíza à criança.
Na decisão proferida pela juíza, ela escreve: "A jovem foi encaminhada ao abrigo por conta de um pedido da Vara da Infância com o objetivo de proteger a criança do agressor que a estuprou mas que, agora, o objetivo é evitar o aborto. A suspeita é a de que a violência sexual contra menina ocorreu na casa dela".
Tribunal de Justiça de Santa Catarina vai investigar decisão
Após a exposição do caso, nesta segunda-feira (20), o Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) emitiu uma nota informando que irá apurar o caso da vítima de estupro que teve o direito ao aborto negado.
Na publicação, o TJSC explica que "o processo referido está gravado por segredo de justiça, pois envolve menor de idade, circunstância que impede sua discussão em público. E tratando-se de questão jurisdicional, não cabe manifestação deste Tribunal, a não ser por seus órgãos julgadores, nos próprios autos em sede de recurso".
O TJSC afirma que a Corregedoria-Geral da Justiça já instaurou pedido de providências na esfera administrativa para a devida apuração dos fatos.
Quando o aborto é considerado legal no Brasil?
Apesar do aborto ser criminalizado no Brasil, não há punição para médico ou paciente em três situações previstas na legislação: quando não há outra forma de salvar a vida da gestante, quando a gravidez for comprovadamente fruto de violência sexual e quando o feto é anencéfalo - ou seja, quando tem cérebro ou crânio subdesenvolvido.
Portanto, o caso da menina de 11 anos estaria qualificado para a realização do procedimento abortivo sem ônus legal. Entretanto, não foi o que aconteceu, e a criança teve seus direitos negados.
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As exceções para a realização do aborto estão previstas no artigo 128 do Código Penal brasileiro, para as duas primeira condições. Já os casos de anencefalia passou a ser incluído em 2012, após entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF).
OAB se pronuncia sobre caso
A Ordem dos Advogados do Brasil de Santa Catarina (OAB-SC) veio à público para reforçar o cumprimento da legislação.
A nota, assinada pelo presidente da Comissão de Direito da Criança e do Adolescente da OAB/SC, Edelvan Jesus da Conceição, cita a garantia de proteção à vida e acolhimento integral da vítima.
“A legislação brasileira autoriza a interrupção da gravidez estão a violência sexual e o risco de vida para a gestante […] Diante disso, estamos buscando junto aos órgãos e instituições com atuação no caso todas as informações necessárias para, de forma incondicional, resguardarmos e garantirmos proteção integral à vida da menina gestante, com embasamento em laudos médicos e nas garantias legais previstas para a vítima em tais situações”, afirmou o órgão.