Cannes prestigia nesta quarta-feira pela segunda vez em três dias a dupla Nicole Kidman-Colin Farrell na mostra competitiva, desta vez sob a direção de Sofia Coppola para um remake de "O estranho que nós amamos", sobre um soldado ferido abrigado em um internato feminino.
Distante do choque estético e narrativo de "As virgens suicidas" (1999) e "Encontros e Desencontros" (2003), a cineasta americana apresenta com este drama histórico, em 1h34, um filme elegante, mas que que permanece sóbrio, nas paisagens do sul dos Estados Unidos.
Algo raro para um filme em competição no Festival de Cannes, "O estranho que nós amamos" é um remake do filme dirigido por Don Siegel em 1971 e segue fielmente o mesmo roteiro, adaptado de um livro de Thomas Cullinan que se passa durante a guerra da Secessão. O papel do cabo John McBurney, interpretado por Colin Farrell no filme Coppola, foi interpretado antes por Clint Eastwood.
Ferido em território inimigo, este soldado nortista é recolhido pelas jovens que permaneceram no internato apesar da guerra. O que fazer? Se livrar do "visitante indesejado", tratá-lo, escondê-lo? A chegada de um homem neste universo feminino perturba os corações e mentes até que a situação finalmente derrapa e alcança a violência.
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No início, "não queria fazer um remake", afirmou Sofia Coppola em coletiva de imprensa, explicando que havia tentado "esquecer" a versão de Don Siegel. "Finalmente, refleti": no filme de 1971, este "internato de meninas durante a Guerra Civil nos Estados Unidos, o mundo das mulheres, é visto pelo soldado. Então disse a mim mesmo, vou fazer uma releitura do filme e contar a história a partir da perspectiva das mulheres".
TENSÕES
Diante a Colin Farrell, o filme alinha sete "cadelas vingativas", como eventualmente acaba por chamá-las em uma cena impressionante de raiva. Sete atrizes, incluindo muitas estrelas: Kirsten Dunst, já presente em "As virgens suicidas" e "Maria Antonieta", Elle Fanning e, especialmente, Nicole Kidman, que interpreta com convicção Miss Martha, diretora do internato.
Dupla chique e glamourosa, Kidman e Farrell já haviam participado na mostra competitiva esta semana e impressionaram por sua atuação em um filme muito mais perturbador, "The Killing Of A Sacred Deer", do grego Yorgos Lanthimos.
Em "O estranho que nós amamos", a personagem de Miss Martha "é ao mesmo tempo protetora e muito religiosa. Ela quer incutir princípios. É uma guia, professora, e ao mesmo tempo bastante maternal", resume Nicole Kidman.
Abalada pela chegada deste homem, inimigo, no pequeno mundo que acredita controlar, Miss Martha vai sucumbir, como as outras, a seus encantos e, finalmente, ciumenta, castigá-lo.
Jovens mulheres, perturbadas pela chegada de um homem em um fundo de tensão sexual, o filme é uma espécie de regresso à fonte de "As virgens suicidas", em que Sofia Coppola explorou esses temas.
"Basicamente, é a questão da luta de poder entre homens e mulheres que conta", ressalta.
O filme, no entanto, deixa de explorar a psicologia dos personagens e suas perversões, desenhadas em traços largos. Aos 46 anos, Sofia Coppola está na disputa para ser a segunda mulher, em 70 edições do Festival de Cinema de Cannes, a receber a Palma de Ouro depois de Jane Campion.