Quando foi criado, em 1995, o Guaiamum Treloso tinha como proposta trazer expoentes da música pop ao pré-Carnaval do Recife. Mas sua edição de 2017, realizada no último sábado (5), mostrou que o evento caminha em direção à formação de mais um grande festival na cidade, do mesmo porte do Rec-Beat, Abril Pro Rock e Coquetel Molotov.
No total foram 30 atrações, entre bandas, DJs e prévias de blocos carnavalescos divididos em três palcos, na Fazenda Bem-Te-Vi, em Aldeia. O duo de música eletrônica sertaneja Radiola Serra Alta, de Triunfo, abriu o palco principal. Foram sucedidos pela cantora e tecladista Sofia Freire e depois por Clayton Barros, que recebeu dois convidados especiais: Rodrigo Coelho (da Jorge Cabeleira e o Dia em Que Seremos Todos Inúteis e Grassmass) e BNegão (Planet Hemp, Seletores de Frequência).
O atraso de pouco mais de uma hora cortou o tempo dos shows da Inner Kings e Gudicarmas, no palco secundário, para minimizar o tempo perdido. Primeira grande atração da noite, Tom Zé subiu ao palco por volta das 19h30.
Aos 80 anos, a presença e a vitalidade de Tom Zé impressionam. O show mostrou a vastidão do repertório do baiano de Irará. Quando se esperam músicas de seu novo disco Canções Eróticas de Ninar, ele brinca com o concretismo de Cadê Mar (parceria com o poeta Augusto de Campos) e resgata Nave Maria (faixa-título de seu único disco dos anos 1980). E para quem imagina um senhor revivendo glórias do passado, ele ataca com Esquerda, Grana e Direita (de 2014) e Não Tenha Ódio no Verão (2012). E ainda passa pelos seus hits Augusta, Angélica e Consolação, Hein?, Tô e Vai (Menina Amanhã de Manhã) e outras que, cantadas por milhares de pessoas, mostram como Tom Zé conseguiu adicionar elementos estranhos ao corpo da música brasileira sem tirá-la de sua raiz popular.
Mais uma vez no Recife, Liniker & Os Caramelows fizeram um show muito repetitivo, sem muito impacto para além de seus próprios fãs. Protagonizaram até um bom momento ao lado de Karina Buhr tocando Eu Sou um Monstro (de Karina) e Você Fez Merda (de Liniker).
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O BaianaSystem foi escalado para fechar a noite e cumpriu a promessa de fazer o povo balançar. Com o som nas alturas e batidas graves potentes, a roda de pogo foi formada logo nos primeiros acordes do swing de Lucro (Descomprimindo). Conduzido basicamente pelos beats eletrônicos e guitarra baiana mais a presença de palco do vocalista Russo Passapusso, é um som simples mas extremamente eficaz que carrega a energia do Carnaval de Salvador. Em meio a improvisos, fizeram duas homenagens a Pernambuco: Roberto Barreto tocou a melodia de Fuá na Casa de Cabral, do Mestre Ambrósio, na guitarra baiana, e Russo cantou Rios, Pontes e Overdrives, de Chico Science & Nação Zumbi.
ORGANIZAÇÃO
Uma noite com ótimas apresentações, é inegável. Mas vale notar que muitos daqueles shows já foram apresentados diversas vezes no Recife. Boa parte das bandas vieram ao Coquetel Molotov há três meses. Outros, como Tagore e Clayton Barros, até tocaram na edição passada do mesmo Guaiamum Treloso Rural. Se a ideia é seguir como um festival, é hora de pensar melhor a curadoria.
A organização teve poucos problemas. O foodpark foi subdimensionado e para comer era preciso ficar na fila por cerca de 40 minutos. Os copos retornáveis acabaram rápido e por volta das 19h as pessoas estavam bebendo em latas, que invariavelmente eram jogadas no chão, quebrando a proposta ecológica do evento. O público estimado foi de 3 mil e o retorno sem atropelos.