A década de 2010 tem sido a que mais jogou produtores musicais brasileiros para dentro dos maiores festivais e paradas de sucesso do mundo, com ênfase para os jovens DJs Vintage Culture (Lukas Ruiz, 23 anos), Ftampa (Felipe Ramos, 29 anos) e Alok (Alok Petrillo, 25 anos) – o último está com a agenda lotada de shows unicamente internacionais até o final de agosto deste ano. O fato de contabilizarem centenas de milhões de players nas plataformas de streaming vem fazendo com que gravadoras internacionais no topo do mercado virem-se para os artistas brasileiros, como é o caso da holandesa Spinnin’ Records, a mesma que já lançou sucessos de Martin Garrix, Hardwell, Dimitri Vegas & Like Mike, Cavin Harris, Tiësto, entre tantos outros.
Mas surgem logo algumas perguntas: de onde vem esse boom? Por quê ele só acontece agora e com uma geração tão nova? Segundo números mundiais do Google Adsense Analytics, desde 2010, os criadores de conteúdo para internet começaram a segmentar os seus meios – canais de YouTube, blogs, sites –, se aprofundando em assuntos exclusivamente direcionados, como games, cinema, esportes, gastronomia e, no caso, produção fonográfica. A partir daí, os mais diversos cursos onlines e fóruns começaram a crescer tão rápido quanto o interesse por eles, educando jovens curiosos do universo musical e resultando no nascimento de incontáveis artistas nacionais entre 16 e 28 anos, dentro dos 19 subgêneros da música eletrônica, alcançando números de público próximos aos de artistas internacionais experientes.
Um dos mais bem sucedidos cursos onlines da área tem sido o Make Music Now (MkMN), idealizado em 2014 pelo produtor, DJ e empresário carioca Felippe Senne, de 35 anos. Mais de 60 horas de vídeo-aulas sobre produção musical no software Ableton Live e um fórum privado para debates internos formaram alguns artistas como Cat Dealers, JØRD, Evokings e Blazy, quatro nomes que andam se destacando nacionalmente e internacionalmente em seus respectivos subgêneros.
Com o sucesso da escola, Senne investiu na carreira de empresário, sem abrir mão de sua paixão pela música. “Comecei a cuidar da carreira de alguns músicos pela empresa de gerenciamento artístico Boost Mgmt, que hoje conta com Felguk, Cat Dealers e JØRD. Além disso, mantenho um selo de música eletrônica chamado HUB Records, que tem como proposta lançar novos talentos do cenário nacional”, completou.
Para Senne, que pretende dar continuidade e crescer no mercado investindo em quem acredita, a internet e o futuro da música eletrônica andam lado a lado. “Eu acho que a situação da música eletrônica no Brasil está cada vez melhor, principalmente no aspecto do desenvolvimento da carreira dos artistas. Nunca antes tivemos tantos artistas eletrônicos nacionais chegando a cobrar cachês de 6 dígitos, mobilizando multidões e lotando clubes e festivais dentro e fora do país. A tendência é só melhorar, mas, ao mesmo tempo, será mais concorrido o mercado, já que a internet é para todo mundo e tem muita gente sem competência lançando qualquer coisa, o que acaba por gerar muito ruído e mais concorrência pela atenção do público”, afirmou Senne.
Cat Dealers
Em meados de fevereiro de 2016, na Gávea, Rio de Janeiro, uma desconhecida e novíssima dupla de Deep house e nu-disco publicava em uma conta recém-criada do SoundCloud a sua primeira música: um remix da canção Oração, da Banda Mais Bonita da Cidade. Antes que a música pudesse ser chamada de sucesso, por conta das altas execuções em poucos dias, o grupo lançou a track Your Body, uma faixa que viralizou tão rápido (hoje com 24 milhões de visualizações) que foi responsável por jogar os cariocas, já no mês seguinte, direto para sua estreia nos palcos, com uma agenda preenchida.
Nascendo quase em paralelo com os próprios sucessos, Cat Dealers, dupla formada pelos irmãos Lugui (Luiz Guilherme) e Pedrão (Pedro Henrique), de 19 e 25 anos, é a grande aposta da música eletrônica nacional, não apenas pelos fãs do gênero, mas pelos sistemas de streaming, como o Google Play Music, que, segundo análises dos seus sistemas, colocou o duo na lista das ?principais apostas musicais para 2017?.
A identidade visual dos artistas da música eletrônica é quase tão importante quanto seus sons, e nisso o Dealers sempre soube muito bem para onde ir. ?A gente criou esse nome em homenagem aos nossos gatos. Temos 10 gatos em casa e os oferecemos de brincadeira para todo mundo que vai lá, por isso Cat Dealers, que, em tradução literal, seria algo como distribuidores de gatos. A ideia de usar preto e branco veio primeiro porque a maioria dos nossos gatos são pretos, e também porque queríamos algo mais obscuro, que representasse a personalidade que esses animais passam?, revelou a dupla.
Com show no Recife ainda em agendamento para o primeiro semestre deste ano, o duo já arrasta centenas de milhares de seguidores nas redes sociais e já ultrapassa a marca milhões de players em sua música principal no Spotify. Cat Dealers, que já carrega no currículo parcerias com grandes nomes nacionais do gênero, como Alok, Vintage Culture, Gabriel Boni, e até internacionais, como ZHU, garante que a rotina produtiva só vai aumentar. ?Pretendemos continuar dando o nosso melhor e fazendo muita música. No momento, o mercado está excelente, as pessoas estão bem abertas para o som que estamos fazendo e esperamos agradar cada vez mais?, completa os Cat Dealers.
JØRD
JØRD, de 20 anos, nascido em Belém do Pará, começou a produzir música eletrônica aos 16 anos, utilizando o software FL Studios no início e, depois, partiu para o Ableton Live, que usa até hoje. “Eu conheci primeiramente o ramo de DJ e depois o de produção musical, porém foquei tanto em produção que depois tive que procurar me readaptar a tocar. Os meus primeiros passos nesse ramo aconteceram de forma gradativa e hoje tenho uma boa frequência de shows no Sul, Sudeste e Norte do país”, contou, antes de dar uma dica para quem tiver querendo iniciar carreira na área: “Não desista. O início é sempre muito difícil para a maioria das pessoas, mas a perseverança e comprometimento com a produção musical podem levar você para caminhos que nem mesmo você acreditaria que pudesse alcançar, como vem sendo comigo.”
Blazy
Blazy, de 20 anos, é um gaúcho que produz música desde 2012 usando o Ableton, e atualmente é um dos destaques do trance nacional. "Acredito que produzo um estilo bem acessível dentro do Psytrance, sou bem aberto e a música que eu faço tem influência de vários outros estilos musicais, facilitando a boa recepção do público atual da cena eletrônica", disse. Recentemente, o DJ alcançou o topo mundial na lista das músicas mais vendidas de Psytrance no BeatPort – o site de vendas de música eletrônica mais utilizado do mundo. “Eu acho que a música eletrônica brasileira está em uma ascensão gigante, tanto pela facilidade da troca de informação que temos hoje em dia quanto pela aceitação do público”, completou.
(Esta reportagem tem uma vinculada sobre a música eletrônica pernambucana, confira em: Música eletrônica pernambucana: o caminho está sendo feito).