América do Sul

Marchas pró e contra Maduro deixam dois mortos na Venezuela

Durante um comício no centro de Caracas, o presidente Maduro assegurou que deseja disputar eleições em breve para vencer o que chamou de "batalha" contra seu governo

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Publicado em 19/04/2017 às 18:45
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Durante um comício no centro de Caracas, o presidente Maduro assegurou que deseja disputar eleições em breve para vencer o que chamou de "batalha" contra seu governo - FOTO: Foto: RONALDO SCHEMIDT / AFP
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À força de bombas de gás lacrimogêneo, tropas de choque bloquearam nesta quarta-feira (19) uma gigantesca marcha contra o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, em Caracas, onde estouraram focos de violência que causaram a morte de uma jovem de 23 anos e de um adolescente de 17.

Com estas duas vítimas, sobe para sete o número de mortos em três semanas de protestos, com os quais a oposição exige eleições gerais para tirar Maduro do poder. O presidente é acusado de mergulhar o país rico em petróleo em uma severa crise econômica e política.

O adolescente faleceu no hospital, para onde havia sido levado de urgência logo após ser atingido por disparos. Os tiros teriam sido dados por homens em uma moto, os quais também teriam atacaram com bombas de gás lacrimogêneo uma manifestação opositora em San Bernardino, no noroeste de Caracas, relataram testemunhas e uma autoridade médica à AFP.

A jovem morreu com um tiro na cabeça durante protestos na cidade fronteiriça de San Cristóbal (oeste), informou a Procuradoria e a ONG de direitos humanos Provea, com base em informações preliminares.

Na capital do país, os enfrentamentos entre as forças de segurança e os manifestantes que respondiam com pedras e coquetéis molotov explodiram em uma autoestrada estratégica e em vários setores do oeste da cidade.

Quando se aproximava, com as mãos para cima, da barreira com que militares bloqueavam a passagem na autoestrada Francisco Fajardo, o líder opositor Henrique Capriles recebeu uma chuva de bombas de gás lacrimogêneo. Vários manifestantes fugiram, jogando-se nas águas poluídas do rio Guaire.

"É preciso sair desta ditadura. Queremos eleições para que Maduro saia do governo, porque deixou o país destruído. Não tenho medo!", disse à AFP Ingrid Chacón, de 54 anos, que participava da marcha, agitando uma grande bandeira venezuelana.

Durante um comício no centro de Caracas, o presidente Maduro assegurou que deseja disputar eleições em breve para vencer o que chamou de "batalha" contra seu governo.

"Temos que buscar (...) fórmulas para ganhar definitivamente essa batalha em paz, eu quero ganhar essa batalha já. Eu quero que nos preparemos para ter uma batalha eleitoral pronta e total", disse o presidente.

Maduro também anunciou a captura de 30 pessoas com supostos planos para deflagrar atos de violência durante a marcha da oposição em Caracas, onde também se manifestam milhares de seus partidários. Mais de 200 pessoas foram detidas em marchas anteriores.

"Foram capturados mais de 30 encapuzados, violentos, terroristas, identificados plenamente", disse Maduro, em meio a aplausos, em discurso a seus seguidores na Avenida Bolívar, no centro da capital.

Enquanto isso, helicópteros da Polícia sobrevoam Caracas, onde alguns focos de protestos persistem. Em cidades dos estados de Zulia, Carabobo, Táchira, Mérida e Anzoátegui, também foram reportados distúrbios com vários feridos.

No que chamaram de "marcha de todas as marchas", a sexta realizada este mês, opositores saíram de cerca de 20 pontos de concentração. Assim como aconteceu nas manifestações anteriores, não conseguiram, porém, chegar ao centro histórico de Caracas, reduto chavista, onde milhares de seguidores de Maduro se manifestavam.

"Estamos firmes com Maduro por lealdade ao nosso comandante eterno", disse à AFP na manifestação governista a professora Nancy Guzmán, de 50 anos, referindo-se ao presidente falecido Hugo Chávez, morto em 2013.

Inquietação internacional

Maduro ativou uma operação militar e policial para "derrotar o golpe de Estado", pelo qual responsabiliza "a direita apátrida venezuelana" e os Estados Unidos. A medida foi considerada pela oposição como uma medida intimidadora e de repressão.

Em Washington, o secretário de Estado americano, Rex Tillerson, afirmou que a Casa Branca acompanha "de perto" e com "preocupação" o desenrolar dos acontecimentos na Venezuela.

Os Estados Unidos também fizeram uma dura advertência aos funcionários públicos venezuelanos para desistir da repressão.

Mais cedo, o representante interino dos Estados Unidos na Organização dos Estados Americanos (OEA), Kevin Sullivan, considerou como "infundadas e irracionais" as acusações de "apoio americano a um golpe na Venezuela, assim como o apoio a manifestações violentas".

Feitas durante sessão do Conselho Permanente da OEA, as declarações de Sullivan foram uma reação às acusações feitas pelo vice-chanceler venezuelano, Samuel Moncada, sobre a suposta participação dos Estados Unidos em um golpe na Venezuela.

Moncada disse ainda que a OEA serviria de "sala de comando" para incitar a violência em Caracas e acusou o secretário-geral da organização, Luis Almagro, de convocar a "guerra civil".

Onze países latino-americanos pediram a Maduro garantias para o direito de protestar pacificamente, um pedido que foi reforçado na segunda-feira (17) pela procuradora venezuelana Luisa Ortega.

Centenas de pessoas protestaram contra o governo chavista nos últimos dias em várias cidades da Europa e da América, como ocorreu nesta quarta-feira em Madri.

Em uma demonstração de força, o chefe de Estado liderou na segunda-feira um ato militar. Nele, recebeu da Força Armada, seu aliado com enorme poder político e econômico, a promessa de "lealdade", enquanto anunciou a ampliação das milícias para 500 mil civis, cada um com um fuzil.

Nesse contexto, o presidente do Parlamento venezuelano, Julio Borges, chegou a pedir aos militares para serem leais apenas à Constituição. Foi, então, acusado por Maduro de liderar o "chamado golpista".

O secretário-geral da OEA, Luis Almagro, afirmou que o governo da Venezuela prepara uma "ação repressiva homicida" ao armar civis, e a Colômbia pediu à ONU para atentar para "a preocupante militarização" da Venezuela.

"A Venezuela enfrentará este grupo minoritário de governos que pretendem promover uma vergonhosa intervenção com a OEA", reagiu a chanceler Delcy Rodríguez.

A força das ruas

Os opositores voltaram às ruas em 1º de abril, depois que o Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) assumiu as competências do Parlamento, o único poder público controlado pela oposição. A medida deflagrou um protesto diplomático internacional que levou o órgão a recuar, dois dias depois.

A própria procuradora Ortega, ligada ao chavismo, o considerou uma "ruptura da norma constitucional".

A oposição denunciou essas sentenças como um "golpe de Estado", mas o episódio a reanimou, recuperando a coesão e o apoio popular perdidos após o fracasso de seu plano para revogar o mandato de Maduro por meio de um referendo.

"Esta marcha ressaltará a força que a oposição é capaz de convocar e os custos que potencialmente pode gerar ao governo, se este persistir em evitar eleições a curto prazo", disse à AFP o cientista político John Magdaleno.

Analistas avaliam que Maduro, cujo mandato termina em janeiro de 2019, evita a todo custo disputar eleições. Sete em cada dez venezuelanos reprovam seu governo, cansados da escassez e da brutal inflação que deve chegar a 720,5% este ano, de acordo com estimativa do Fundo Monetário Internacional (FMI).

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