CRISE POLÍTICA

Oposição disputará eleições em uma Venezuela que diz viver 'ditadura'

A oposição venezuelana decidiu participar das eleições de governadores, em meio a acusações de fraude na Constituinte do presidente Maduro

AFP
Cadastrado por
AFP
Publicado em 10/08/2017 às 7:52
Foto: FEDERICO PARRA / AFP
A oposição venezuelana decidiu participar das eleições de governadores, em meio a acusações de fraude na Constituinte do presidente Maduro - FOTO: Foto: FEDERICO PARRA / AFP
Leitura:

A oposição venezuelana decidiu participar das eleições de governadores, em meio a acusações de fraude na Constituinte do presidente Nicolás Maduro, que motivaram novas sanções dos Estados Unidos.

"Acordamos por consenso pré-inscrever candidatos para as eleições regionais", assinalou nesta quarta-feira em um comunicado a coalizão Mesa da Unidade Democrática (MUD), que viu vários de seus dirigentes inabilitados a se candidatar.

A aliança explicou que sua intenção de pressionar Maduro e o poder eleitoral para que cumpram com a palavra de realizar as eleições em 10 de dezembro. Se não o fizerem, "que paguem o preço", assinalou o dirigente Andrés Velásquez, em coletiva.

O prazo para a inscrição na disputa por 23 executivos estaduais e assembleias regionais vence nesta quarta-feira.

Mas na noite desta quarta, o poderoso líder chavista Diosdado Cabello anunciou que os candidatos da oposição precisarão de um "certificado de boa conduta" emitido pela Assembleia Constituinte para concorrer aos governos.

"Quem quiser concorrer deverá ter um certificado de boa conduta da Assembleia Nacional Constituinte (...), um certificado que diga que você nunca propôs queimar a Venezuela", declarou Cabello em seu programa semanal de televisão.

A decisão da MUD coincidiu com as sanções do Departamento do Tesouro americano, nesta quarta-feira, a Adán Chávez, irmão mais velho do falecido presidente Hugo Chávez e a outros sete políticos por sua relação com a polêmica Assembleia Constituinte, em vigor desde a sexta-feira com poderes absolutos e que enfrenta um amplo repúdio internacional.

A medida implica no congelamento dos bens que tenham nos Estados Unidos, e na proibição a cidadãos americanos de fazer negócios com eles.

Washington já sancionou Maduro, 13 funcionários e ex-colaboradores do presidente, acusados de quebrar a democracia, corrupção e violação dos direitos humanos.

A lista aumentou depois que 12 governos da América condenaram Maduro, na terça-feira em Lima, por uma "ruptura" da democracia e desconheceram a Constituinte, também rechaçada pela União Europeia (UE).

EUA passam "vergonha"

"Não respeitam qualquer critério, nenhum princípio elementar do direito internacional. Passam vergonha diante do mundo. A Venezuela não pode ser sancionada por nada nem por ninguém", disse o chanceler Jorge Arreaza à rede de televisão estatal VTV, ao rejeitar "enfaticamente" as medidas.

Arreaza teve reuniões privadas com diplomatas de onze dos países que assinaram a declaração de Lima, à qual expressou "o mais absoluto repúdio".

Ele recebeu os embaixadores de Chile, Guatemala, México e Panamá, e aos encarregados de negócios de Argentina, Brasil, Canadá, Colômbia, Costa Rica, Paraguai e Peru.

Diante da crescente pressão internacional, Maduro propôs uma cúpula da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) para "restituir o diálogo" regional e o "respeito à Venezuela".

"Forma de luta"

Não foi uma decisão fácil para a MUD, que reúne cerca de 30 partidos com diferentes tendências políticas, e que se juntaram em 2008 para enfrentar eleitoralmente o chavismo, no poder desde 1999.

Vários de seus dirigentes foram inabilitados a concorrer a cargos públicos, incluindo Henrique Capriles, atual governador do estado de Miranda, ao qual parte de Caracas pertence.

Além disso, dois prefeitos foram condenados pela Suprema Corte a 15 meses de prisão por não impedir o bloqueio de ruas nos quatro meses de manifestações opositoras, que deixam 125 mortos.

"A eleição é uma forma de luta e não assumi-la é a melhor maneira de convalidar e fortalecer a ditadura", justificou-se a MUD, advertindo que os protestos para exigir eleições gerais continuarão.

As regionais deveriam ter acontecido no fim de 2016, mas o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) as adiou sem motivos.

Acusado de servir ao governo, o CNE também suspendeu em 2016 o trâmite para um referendo revogatório do mandato de Maduro, por ordem dos tribunais regionais.

Igualmente, anunciou há dois dias que a MUD não poderá inscrever candidatos com a sua identificação em sete estados, incluindo Zulia - maior centro eleitoral do país -, Aragua e Carabobo.

Velásquez assegurou que nesses estados os partidos da MUD apoiarão um único candidato.

Dilemas

Analistas como Benigno Alarcón consideram que o governo não está em condições de vencer uma eleição por sua responsabilidade na grave crise econômica, refletida na escassez de alimentos e remédios e uma inflação que, segundo o FMI, ultrapassaria os 720% este ano.

Maduro enfrenta o repúdio de 80% dos venezuelanos, de acordo com as pesquisas, que indicam que a MUD pode ganhar até 18 governações. Seria um nove golpe ao chavismo, que encarou em 2015 a sua maior derrota, ocorrida nas legislativas.

Devido a isso, segundo Alarcón, Maduro apostou pela Constituinte como uma "salva-vidas", não para reescrever a Carta Magna, mas evitar eleições e governar sem contrapesos como o Parlamento, que já estava com as mãos atadas pela Suprema Corte.

Dirigentes opositores não descartam que ao final a Constituinte, como um "suprapoder", cancele as regionais, embora Maduro negue.

A oposição também encara o risco de perder o apoio popular ao "se conformar" com as regionais, quando os protestes exigiam a antecipação das presidenciais, previstas para o fim de 2018.

Já assumiu um custo em 2016: quando as manifestações contra Maduro alcançaram um novo pico, entrando em um frustrado diálogo que enfraqueceu a sua popularidade.

No entanto, hoje assegura que Maduro está encurralado pelos protestos e pela pressão internacional, e que cada vez está mais perto de seu objetivo de "acabar com esta ditadura".

Últimas notícias