Construída para ligar o Recife a Petrolina, no Sertão, a Estrada de Ferro Central de Pernambuco parou em Salgueiro, com 607,42 quilômetros de extensão. A mais longa ferrovia do Estado, iniciada no fim do século 19, cruza 25 municípios. Das 51 estações que faziam parte da Linha Centro, 35 ainda existem, mas 15 delas estão descaracterizadas.
Em 2009, quando o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) concluiu o Inventário do Patrimônio Ferroviário em Pernambuco, havia cinco estações em ruínas, seis demolidas e uma inexistente na linha, executada com recursos públicos pela Great Western, por solicitação de donos de engenhos de cana-de-açúcar. Dois dos imóveis desapareceram sem deixar vestígios.
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A Estação de Arcoverde, inaugurada em 1912, na entrada do Sertão, está de pé. Porém, sofreu um incêndio, perdeu parte do telhado e encontra-se depredada. Tanques de combustível e caixas d’água, para abastecimento das locomotivas, estão se enferrujando na esplanada, desativada na década de 1980. Sem passar por melhorias, o prédio do armazém é usado como oficina para confecção de fantasias pela Associação Cultural Boi Maracatu.
“Na época dos trens, a estação era movimentada demais, com muita gente circulando e carga chegando e partindo. Vinha de carvão a gado. Acabou-se tudo, até trilhos arrancaram e aterraram”, lamenta Fausto Maciel Coelho, 76 anos, operário aposentado. Ele costumava viajar na Maria Fumaça de Arcoverde a Sertânia, para visitar parentes.
Trilhos da ferrovia criada para facilitar a comunicação entre a capital e as cidades mais remotas do Estado viraram boca de galeria na cidade, diz ele. Bem perto da estação, um pátio para embarque e desembarque de vans foi instalado em cima da linha. “Ninguém liga”, afirma.
Há oito anos, moradores de Arcoverde acompanham a implantação da nova via férrea, a Transnordestina, projetada para transportar carga em Pernambuco, Ceará e Piauí. “A linha passa por fora da cidade, sem aproveitar a antiga estrada. Estão fazendo um túnel aqui, mas a obra parou. Seria bom se o trem levasse passageiros também”, diz Fausto.
A prefeitura pretende recuperar a esplanada e instalar, no local, o Parque Cultural da Rede Ferroviária, com receptivo, café, salas para exposições e oficinas de arte e teatro. O projeto está em andamento e vem sendo negociado com o Iphan.
Em Sertânia, a segunda cidade do Sertão incluída na Linha Centro, também há uma movimentação de resgate da memória ferroviária. A prefeitura quer reativar a ferrovia no município, criando a rota turístico-ambiental Caminho da Caatinga. O trem sairia da sede com destino às Estações Henrique Dias, Pinto Ribeiro e Albuquerque Né, que teriam de ser restauradas.
Numa situação mais confortável, se comparada com Arcoverde, a Estação de Sertânia, de 1933, abriga uma escola de música e a Secretaria de Juventude, Esportes, Cultura e Turismo. O mesmo não se aplica aos trilhos, encobertos na estrada de terra. A prefeitura descaracterizou o pátio ferroviário, ao construir uma escola municipal entre a estação e o prédio do armazém. E permite barracas de lanches praticamente coladas em uma das fachadas do armazém.
Desativada no começo da década de 1980, a esplanada também contava com oficina de manutenção das máquinas (em ruínas), garagem (descaracterizada) e uma casa chamada castelo, para o descanso dos maquinistas e condutores (reformada).
Parte do armazém, junto da estação, é ocupado pela Associação dos Artesãos da cidade. “A gente se esforça para manter o prédio, produzindo, expondo e vendendo artesanato”, diz Josenilda Romão da Silva, 30, sócia da entidade e moradora do Sítio Apito, na zona rural. “Esse nome é por causa do trem. A linha passa atrás do sítio. Os trilhos ainda existem, cheios de casa em volta”, diz.
Na época dos trens, a estação era movimentada demais, com muita gente circulando e carga chegando e partindo. Acabou-se tudo
diz Fausto Maciel Coelho, morador de Arcoverde
Nenhuma estação de trem de Pernambuco tem proteção federal, diz o superintendente do Iphan, Frederico Almeida. Mas, a Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe) tem proposta para o tombamento temático do patrimônio ferroviário do Estado.
“É um processo extenso, porque inclui os bens móveis, imóveis e material rodante. Estamos analisando caso a caso”, informa a arquiteta Neide Fernandes, coordenadora de Patrimônio da Diretoria de Preservação Cultural da Fundarpe.
Para fazer o inventário, o Iphan visitou 60 municípios por onde o trem passou, na sede e na zona rural, de 2007 a 2009. A preservação das edificações, na opinião de Frederico Almeida e Neide Fernandes, depende do interesse das prefeituras. “Muitas cidades têm vontade de recuperar e dar novos usos aos prédios, só faltam os recursos”, comenta.