As ruínas de um dos primeiros engenhos coloniais construídos em Pernambuco, no século 16, ficam em Abreu e Lima, no Grande Recife. Não há gravuras mostrando como era a casa-grande, a capela, a senzala e a fábrica, local onde se produzia o açúcar de cana. Mas sobraram restos de alicerces, pisos e paredes. Com esses vestígios arqueólogos da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) pretendem resgatar a arquitetura do Engenho Jaguaribe.
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Na falta de registros iconográficos, eles vão recorrer a tijolos, telhas e reboco das edificações para esclarecer as técnicas construtivas. O material está espalhado num terreno de 100x200 metros que já começou a ser escavado. Pedras com argamassa de cal e de arenito, comuns no período colonial, foram encontradas no local.
“Essa região, no século 17, era conhecida como uma das melhores produtoras de cal”, afirma a professora da UFPE e coordenadora do projeto, Cláudia Oliveira. Com as estruturas recuperadas é possível ter uma ideia de como era o engenho, declara o arquiteto Álvaro Moreira, que acompanha a pesquisa. “Podemos projetar a altura da casa-grande e da capela pelas paredes que desabaram”, explica ele.
A pesquisa de campo foi feita em setembro de 2015 e a proposta do grupo é retornar ao local em janeiro de 2016 para dar continuidade ao estudo. Em 30 dias os arqueólogos descobriram restos de piso e de parede da Capela de Santo Antônio, que desabou completamente. O templo, até agora, ocupa uma área de 8x20 metros, com três ambientes.
“Esperávamos um igreja menor. Precisamos avaliar mais para saber se o prédio foi construído assim ou se sofreu acréscimos posteriores”, informa a arqueóloga. As ruínas da casa-grande serão analisadas na segunda fase. No terreno restam pedaço de parede do século 16, comprometida por uma árvore que cresceu entre os tijolos; uma capela interna de outro período e uma parede de tijolos de seis furos, erguida no século 20 por antigos moradores.
Ainda falta demarcar a senzala e o cemitério. “A moita (fábrica) aparece na estrada que dividiu o engenho ao meio (Rua Sítio Jaguaribe) e no quintal de casas da região”, revela Cláudia. Os arqueólogos também recuperaram cacos de louça, faiança, aliança, botão de roupa militar, garrafas de vidro (uma delas cheia de contas de terço) e uma moeda portuguesa de cobre, de 1719. Materiais do século 16 ao 20.
A pesquisa faz parte do Programa de Preservação Ecológica e Cultural da Sesmaria Jaguaribe, lançado por Cláudia Oliveira em 2005. Em dez anos, ela fez escavações nas ruínas da Igreja de São Bento (Abreu e Lima) e dos Engenhos Maranguape (Paulista) e Inhamã (Igarassu), localizando indícios de aldeias indígenas entre Inhamã e Jaguaribe.
O trabalho atual teve a participação do arqueólogo Pedro Jiménez Lara, da Universidad Veracruzana, no México. “Embora seja um dos acontecimentos mais importantes da área, o sítio arqueológico foi pouco trabalhado. É preciso conhecer a estrutura de cada engenho e a influência europeia nesse processo. A história do açúcar é muito forte para a economia brasileira”, destaca Pedro Jiménez.
A Sesmaria Jaguaribe foi fundada em 1540 pelo português Vasco Fernandes, que recebeu as terras de Duarte Coelho, o primeiro donatário da Capitania de Pernambuco, diz Cláudia. Ele dividiu a área e construiu quatro engenhos: Paratibe, Paulista, Inhamã e Jaguaribe.
“É um trabalho importante não só pelo valor histórico e arqueológico, mas por representar a possibilidade de recuperar a configuração arquitetônica dos primeiros engenhos implantados na Capitania de Pernambuco”, diz ela. O Jaguaribe integra a lista dos cinco primeiros engenhos de Pernambuco.
“Sabemos que ele estava ativo até o século 19, quando foi arrendado pelo viajante inglês Henry Koster, em 1812. No século seguinte, a área foi comprada pela Companhia de Tecidos Paulista.” A pesquisa tem apoio da Prefeitura de Abreu e Lima. A proposta da arqueóloga é transformar as terras da antiga sesmaria num atrativo turístico, com exposição dos achados, como um museu a céu aberto.