História

Vila dos Remédios, em Fernando de Noronha, era uma cidade fortificada

A descoberta é da arquiteta Vitória Andrade, que pesquisou farta documentação sobre a história de Fernando de Noronha

Cleide Alves
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Cleide Alves
Publicado em 22/05/2016 às 8:08
CLEIDE ALVES/ESPECIAL PARA O JC
Fernando de Noronha ainda tem problemas de infraestrutura, como ruas esburacadas, que ficam intransitáveis no inverno - FOTO: CLEIDE ALVES/ESPECIAL PARA O JC
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A arquiteta Vitória Andrade foi contratada pela administração de Fernando de Noronha, em 2015, para elaborar o projeto de revitalização da Vila dos Remédios. Pesquisa de cá, pesquisa de lá ela acabou descobrindo um capítulo adormecido da história da ilha. Com base em mapas, fotos, documentos históricos e estudos arqueológicos em campo, Vitória afirma que a Vila dos Remédios era, na verdade, uma cidade fortificada.

“A Vila dos Remédios nasceu a partir de um projeto de conjunto urbano, típico de praça-forte portuguesa, planejado por engenheiros militares e adaptado em Noronha ao uso prisional, declara a arquiteta. “É uma experiência única de planejamento urbano português implantado no nosso País, com características distintas das demais vilas coloniais brasileiras”, sustenta.

De acordo com Vitória, a vila foi uma prisão, isolada por muros, por mais de dois séculos. Trechos dessa muralha, construída para delimitar o presídio de Fernando de Noronha, continuam visíveis até hoje por trás da Igreja de Nossa Senhora dos Remédios, na lateral do templo católico, junto do Memorial Noronhense e próximo das ruínas do Reduto de Santana.

Mapas antigos assinalam esses paredões já no século 18 e fotografias mais recentes mostram que continuavam de pé ainda nos anos 1970. Vitória consultou cerca de 800 fotografias do acervo do Memorial Noronhense, mapas, cartas náuticas e o livro de Marieta Borges, a historiadora da ilha. “A documentação confirma que a vila inteira era um presídio, com controle para entrada e saída das pessoas”, afirma.

A muralha aparece inteira num mapa de 1868 e em fotografias de 1938 e 1961. “Hoje, se confunde com as casas da ilha por ter a mesma altura das edificações”, observa a arquiteta, diretora da empresa Cardus Estratégias Urbanas e Arquitetura, que desenvolve o projeto para o novo ordenamento da área. A cidade fortificada, diz ela, explica o motivo de a vila não ter crescido para os lados.

Arqueólogos contratados pela Cardus nem precisaram fazer grandes escavações na ilha. Os pedaços existentes da muralha histórica, quase todos cobertos pelo mato, são completamente visíveis, variando de 50 centímetros a 1 metro de altura. “A vegetação acabou se transformando num mecanismo de proteção”, comenta a arquiteta. Partes do muro, já sem a função de origem, caíram por falta de manutenção e foram reaproveitadas como material de construção em moradias.

O presídio de Fernando de Noronha abrigava degredados, ciganos e sentenciados. No local também circulavam os militares e funcionários do sistema carcerário. “Os presos fizeram todas as construções, inclusive a muralha”, informa. “O paraíso de hoje era um espaço controlado e vigiado até a década de 70, com autorização dos militares. Não era uma vila colonial como se pensava. É uma história de opressão, dor e sofrimento do País”, observa.

Ela vai discutir com a comunidade a melhor forma de proteger os paredões, para compor o plano de reabilitação da vila. Distrito de Pernambuco, Fernando de Noronha é um arquipélago formado por 21 ilhas e ilhotas, distante 545 quilômetros do Recife. A ilha principal, também chamada Fernando de Noronha e onde fica a Vila dos Remédios, é a maior de todas e a única habitada.

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