Rio Capibaribe

No Dia do Rio, conheça barqueiros que dão vida ao Capibaribe

Nesta quinta-feira (24) é celebrado o Dia do Rio e também o Dia do Rio Capibaribe, que nasce no Agreste pernambucano e corre até o Centro do Recife

Cleide Alves
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Cleide Alves
Publicado em 24/11/2016 às 6:06
 Foto: Alexandre Gondim/JC Imagem
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Seu João, seu Mita e Pai do bote passam o dia num eterno vai e vem nas águas do Capibaribe. De domingo a domingo. Faça chuva ou faça sol. Na maré alta ou na maré baixa. Barqueiros no rio mais famoso de Pernambuco eles encurtam as distâncias para as pessoas que precisam atravessar de uma margem a outra a caminho do trabalho, da escola, do parque, do médico, das compras.

As viagens são curtas. Coisa de dois minutos. Os barcos, movidos a remo ou puxados pelos barqueiros com o auxílio de cabo de aço ou de corda, levam e trazem os passageiros desde o alvorecer até o cair da noite. Às vezes até mais tarde. Eles fazem isso há décadas e repetirão o ritual hoje, 24 de novembro, Dia do Rio Capibaribe, definido na Lei Estadual n° 14.011/2010.

Curiosamente, os três barqueiros nem sabiam da data comemorativa. “Dia do rio para mim é todo dia, eu vivo do Capibaribe e adoro o meu trabalho”, declara Antônio José da Cunha, 43, o popular Pai do bote, que faz a travessia da Iputinga, bairro da Zona Oeste do Recife, para o Poço da Panela, na Zona Norte. O serviço funciona das 5h às 19h e cada viagem custa R$ 1.

De pé no barco, no meio do Capibaribe, apoiado na corda que usa para empurrar a embarcação, Pai do bote diz sentir o cheiro do rio quando o vento sopra. “Se não tiver porco, vaca e cavalo morto boiando, o cheiro é gostoso”, diz ele. “Juntando esgoto e bicho, é um fedor insuportável.” A travessia é feita pela família de Antônio há quase 70 anos. “Começou com meu avô. Meu pai era garoto e ele agora tem 74.”

 Foto: Alexandre Gondim/JC Imagem
Travessia no Rio Capibaribe, do bairro da Torre para a Jaqueira, no Recife, é feita há quase 80 anos - Foto: Alexandre Gondim/JC Imagem
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Bote que faz a travessia Torre-Jaqueira, no Rio Capibaribe, funciona todos os dias da semana - Foto: Alexandre Gondim/JC Imagem
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Barqueiro cobra R$ 1,25 para atravessar passageiros de uma margem a outra do rio, no bairro da Torre - Foto: Alexandre Gondim/JC Imagem
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Margens do Capibaribe, na Jaqueira, cobertas por mangue. No passado havia só areia, dizem barqueiros - Foto: Alexandre Gondim/JC Imagem
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Barco faz a travessia no Capibaribe, da Torre para a Jaqueira, no Recife, das 5h às 20h, diariamente - Foto: Alexandre Gondim/JC Imagem
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Travessia no Capibaribe, em São Lourenço da Mata, liga o Centro ao bairro Parque Capibaribe - Foto: Ashlley Melo/JC Imagem
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Com ajuda de corda de aço, barqueiros levam passageiros de uma margem a outra do rio em São Lourenço - Foto: Ashlley Melo/JC Imagem
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Há 36 anos os irmãos Ferreira dos Santos fazem a travessia de bote no Capibaribe em São Lourenço - Foto: Ashlley Melo/JC Imagem
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Em São Lourenço, a travessia de bote no Capibaribe leva menos de dois minutos e custa 50 centavos - Foto: Ashlley Melo/JC Imagem
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Da Iputinga para o Poço da Panela, o barqueiro leva pouco mais de dois minutos na travessia do rio - Foto: Ashlley Melo/JC Imagem
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Antônio José da Cunha, Pai do bote, cobra R$ 1 para levar passageiros da Iputinga ao Poço da Panela - Foto: Ashlley Melo/JC Imagem
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Nesta quinta-feira, 24 de novembro, é comemorado o Dia do Rio Capibaribe e também o Dia do Rio - Foto: Ashlley Melo/JC Imagem
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Na Iputinga, a travessia de barco no rio está nas mãos da família de Pai do bote há quase 70 anos - Foto: Ashlley Melo/JC Imagem
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Pai do bote trabalha todos os dias, das 5h até as 19h, levando passageiros no Rio Capibaribe - Foto: Ashlley Melo/JC Imagem
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A travessia de barco no Capibaribe diminui as distâncias entre os bairros, afirmam passageiros - Foto: Ashlley Melo/JC Imagem
Foto: Acervo do Museu da Cidade do Recife
O Rio Capibaribe desemboca no Recife depois de percorrer 270 quilômetros. A nascente fica no Agreste - Foto: Acervo do Museu da Cidade do Recife
Foto: Acervo do Museu da Cidade do Recife
O Capibaribe nasce de um filete d'água no município de Poção, no Agreste pernambucano - Foto: Acervo do Museu da Cidade do Recife
Foto: Acervo do Museu da Cidade do Recife
A atividade de pesca era intensa no passado, quando o Rio Capibaribe era cheio de curimã e camarão - Foto: Acervo do Museu da Cidade do Recife
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Botos e capivaras eram vistos com frequência no Capibaribe, antes de o rio virar esgoto - Foto: Acervo do Museu da Cidade do Recife
Foto: Acervo do Museu da Cidade do Recife
O Capibaribe tem cerca de 74 afluentes e banha 42 municípios pernambucanos no caminho até o Recife - Foto: Acervo do Museu da Cidade do Recife
Foto: Acervo do Museu da Cidade do Recife
De acordo com barqueiros, no no Grande Recife, hoje, o Rio Capibaribe só é navegável até Camaragibe - Foto: Acervo do Museu da Cidade do Recife

 

Antônio tem vontade de conhecer o Capibaribe da nascente, em Poção, município do Agreste, até a foz, no Centro do Recife, num percurso de 270 quilômetros. “Eu soube que a água onde ele nasce é limpa, eu queria ir lá me embolar no rio, beber água e tirar fotos para mostrar a todo mundo”, revela. Trinta anos atrás o Capibaribe não era sujo como hoje, destaca. “Limpo, limpo não era, mas dava para a gente tomar banho sem medo”, comenta.

Cliente do barqueiro, Marli Alexandre, 36, mora na Iputinga e trabalha na Bomba do Hemetério, na Zona Norte. Ela pega o bote, anda 15 minutos até Casa Amarela e lá embarca num coletivo. “São 50 minutos e R$ 3,80. Se fosse só de ônibus, pegaria um transporte da Iputinga até o Derby e outro de lá para a Bomba. Gastaria duas horas e meia e R$ 5,60”, compara. “O rio poderia ser mais limpo, mas a travessia é muito bacana. Na quinta-feira vou fazer uma homenagem ao Capibaribe, ele me serve todos os dias.”

BANHO DE RIO

Descendo mais o rio, em direção ao mar, Zomilton Tomé Parangaba – seu Mita – faz o trajeto da Torre (Zona Oeste) para a Jaqueira (Zona Norte), numa atividade que passa de pai para filho há uns 80 anos. “Eu era criança e meu avô já remava, comecei a fazer a travessia aos 15 anos, estou com 67 e agora quem está mais à frente é meu filho”, relata. São várias gerações vivendo do Rio Capibaribe.

Foi no Capibaribe que seu Mita aprendeu a nadar e a mergulhar. “Antigamente, a água era limpa, eu mergulhava e trazia areia. Se fizer isso hoje, só vem lama”, destaca. “Conheci o rio sem o manguezal nas margens, havia só areia. Quando faltava água na Torre a meninada vinha tomar banho no rio, era muito animado, os pais é que não gostavam da algazarra”, recorda.

O barco está sempre a postos, das 6h às 20h, e o preço é R$ 1,25. “A escadaria do cais está avariada, fizemos uns reparos, mas não temos condições sozinhos de consertar tudo, seria ótimo se nos ajudassem”, diz seu Mita.

CORTANDO CAMINHO

Em São Lourenço da Mata, município do Grande Recife, a família de João Batista Ferreira da Silva e Severino Ferreira preserva a travessia no Capibaribe há 36 anos, transportando passageiros do Centro ao bairro Parque Capibaribe e vice-versa. “Não somos os primeiros, antes da gente outras pessoas faziam esse trabalho”, declara Severino. A viagem dura pouco mais de um minuto e custa 50 centavos.

Se o passageiro não tiver o dinheiro, atravessa do mesmo jeito, afirma o barqueiro. A informação é logo confirmada pelo auxiliar administrativo José Henrique Machado de Lima, 34. Mal entra no barco, Henrique entrega duas moedas de 50 centavos e fala: “Aqui, seu Biu, eu estava devendo uma passagem.” Assim que o rapaz sai do bote, entra uma moça e entrega R$ 1. “Seu Biu, fiquei devendo de sábado.”

Henrique mora em Parque Capibaribe e usava o bote todos os dias na época da escola. “Agora dependo menos do barco, mas toda semana atravesso”, diz. Sem a embarcação, resta aos moradores seguir a pé ou embarcar numa Kombi do transporte complementar e pagar R$ 1,75. “O bote é bom e barato. Poderia ter mais travessias dessa onde o rio é navegável”, pondera.

Olhando a paisagem, com o rio cheio de baronesas, ele lamenta a sujeira no Capibaribe. “Falta saneamento, o rio desce sujo desde perto da nascente e isso é preocupante. Se nada for feito para corrigir a poluição, será que os nosso filhos vão apreciar o Capibaribe?”, indaga Henrique. Moradora de Muribara, bairro vizinho de Parque Capibaribe, Andreza Maria de Souza Nascimento, 28, cruza o rio de barco desde criança, com o mesmo barqueiro.

“Eu vinha com minha mãe, ela pegava o bote para resolver tudo, ainda hoje é a melhor opção de trajeto”, ressalta Andreza, que fazia a travessia terça-feira passada para pegar o filho na escola. “Poderia ir a pé ou de Kombi, mas o percurso é grande.” A construção de uma ponte sobre o Capibaribe e o transporte complementar por Kombi diminuíram a clientela, mas o movimento continua firme e forte, observa João Batista, irmão de seu Biu.

Alheio à data festiva – Dia do Rio e Dia do Capibaribe – João Batista puxa a corda de aço e enquanto o barco desliza ele comenta: só falta limpeza e esse é um problema de todos, quem sacode sofá e fogão no Capibaribe são as pessoas, o povo não tem compreensão”, avalia o barqueiro.

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