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Emendas de bancada deixaram de priorizar obras nos morros

Com a redução das mortes em série decorrentes de deslizamentos de barreira, a urgência migrou para outras áreas, como saúde e educação

Ciara Carvalho
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Ciara Carvalho
Publicado em 28/07/2019 às 8:26
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Com a redução das mortes em série decorrentes de deslizamentos de barreira, a urgência migrou para outras áreas, como saúde e educação - FOTO: Foto: JC Imagem
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Nos últimos anos, a cidade do Recife não recebeu um único centavo de recursos provenientes de emendas parlamentares destinadas a obras de contenção nos morros da capital. Olinda também não. Um cenário bem diferente de décadas passadas, quando a emenda de bancada, tanto estadual quanto federal, era uma das fontes mais importantes para garantir o investimento em ações de urbanização nos altos e encostas da Região Metropolitana do Recife. A mudança é sintomática. Reflete o deslocamento dos temas considerados prioritários não só pelos parlamentares, mas também por gestores municipais e do Estado. Com a redução das mortes em série decorrentes de deslizamentos de barreira, a urgência migrou para outras áreas, como saúde e educação.

“De fato, saiu dos holofotes durante esses anos de seca. Houve uma arrefecida nessa questão, ajudada pelas condições climáticas. Por outro lado, vimos um avanço tecnológico que permitiu algumas soluções mais baratas do que o muro de arrimo, uma obra mais cara. A chegada das geomantas, por exemplo, quando bem aplicadas, funcionam bem. Elas estão sendo colocadas à prova agora, com a ocorrência de chuvas mais intensas”, avalia a deputada estadual Priscila Krause (DEM). A parlamentar afirma que as recentes mortes na RMR mostraram o quanto o tema precisa voltar ao centro dos debates.

O secretário de Infraestrutura do Recife, Roberto Gusmão, diz que, desde 2014, houve uma mudança de prioridade política por parte do próprio governo federal, em relação aos investimentos em áreas de risco nas cidades brasileiras. “Para se ter uma ideia, nós temos R$ 105 milhões aprovados para obras de contenção de encostas, muros de arrimo e construção de escadarias. Mas ainda estamos aguardando autorização para dispor desses recursos que estão na Caixa Econômica Federal. São projetos que foram aprovados em 2010 e só uma parte do dinheiro foi liberada”, afirma o secretário. Diante da urgência, Gusmão diz que a prefeitura resolveu usar dinheiro do cofre municipal para agilizar a execução parcial dessas obras. “Em seis meses, já gastamos R$ 10 milhões em ações de urbanização, que deveriam ser financiadas com recursos federais.”

Ele garante que, em relação ao Recife, a redução do número de mortes em deslizamentos de barreiras não desviou a atenção da prefeitura das áreas de morro. “O nosso alerta está aceso. A questão é que a demanda só aumenta. São mais de 10 mil pontos de risco, com diferentes níveis de gravidade. Pelo menos 2.500 precisam de uma intervenção urgente, porque representam um perigo maior. Só o dinheiro da prefeitura não dá conta”, observa.

COBERTOR CURTO

Assessor especial da Prefeitura de Olinda, Evandro Avelar vai na mesma linha. Ele nega que tenha havido uma mudança de prioridade em relação às obras de urbanização e prevenção nos morros do município. O que falta é capacidade de investimento. “Metade do território de Olinda é formado por áreas de morro. Os dois locais que registraram as recentes mortes, em Águas Cumpridas e Caixa d’Água, estavam sendo monitorados. Há muitas obras pulverizadas em execução, mas elas não são suficientes diante da dimensão do problema.”

Avelar considera que, diante de mais uma tragédia, é importante a retomada do protagonismo do Estado, como articulador de uma atuação integrada na RMR, além do aumento da pressão sobre a bancada federal para garantir mais recursos. Pragmático, ele diz, no entanto, que não há mágica a fazer. “O cobertor é curto. Estados e municípios estão com o pires na mão. Se você decide reforçar o investimento em uma área, vai diminuir na outra.”

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