TRAGÉDIA

Moradores de Caetés 1 apontam negligência em caso de deslizamento

Documentos reunidos por moradores apontam que o poder público sabia das vulnerabilidades do local e que obras ficaram paradas

Editoria de Cidades
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Publicado em 06/08/2019 às 8:35
Foto: Filipe Jordão/ JC Imagem
Documentos reunidos por moradores apontam que o poder público sabia das vulnerabilidades do local e que obras ficaram paradas - FOTO: Foto: Filipe Jordão/ JC Imagem
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Uma tragédia anunciada. Vidas ceifadas pelo descaso do poder público. Assim moradores do bairro de Caetés 1, em Abreu e Lima, Grande Recife, avaliam o deslizamento de barreira que terminou com a morte de cinco pessoas no último dia 24 de julho, na Rua Córrego da Areia. Documentos reunidos por lideranças comunitárias mostram que, desde 2007, o poder público tinha conhecimento sobre a vulnerabilidade do local e os riscos a que a comunidade estava exposta. No entanto, pouco foi feito para garantir a segurança das cerca de 600 famílias que vivem no córrego.

Quem primeiro notou o aumento das voçorocas (nome técnico para as barreiras) foi a bióloga e assistente social Gerina Holanda, que também é moradora de Caetés 1. Entre as causas do problema estavam a perda de cobertura vegetal, a disposição de resíduos sólidos nas áreas, além da extração ilegal de areia. Como parte do cenário era consequência de ações da própria população, exposta a condições de vulnerabilidade social, o primeiro passo foi realizar atividades educativas com os moradores, através de palestras. A família que perdeu a vida na tragédia estava entre os que participaram da ação.

“Em seguida, geramos um documento, um diagnóstico socioambiental, concluído em 2008, e encaminhamos aos órgãos competentes.” O documento, reconhece Gerina, carece de maiores análises, de especialistas de áreas diversas, como engenheiros, geólogos e limnólogos (especialistas em água doce), mas já apontava um cenário preocupante. “Apresentamos o documento à Secretaria de Obras e não tivemos retorno. Também procuramos o Ministério Público, sem resultado. Através de uma liderança política, conseguimos chegar ao irmão do prefeito, que visitou o Córrego da Areia. Ele entrou pela porta da frente da casa da família que foi vitimada”, lembra a bióloga. O contato com os órgãos está registrado, via e-mail, em 2012 e 2013.

Em 2012, com o apoio do então deputado federal Severino Ninho (PSB), Caetés 1 recebeu do Ministério das Cidades, através do Programa de Aceleração do Crescimento 2 (PAC 2), recursos da casa dos R$ 5,5 milhões, para a construção de muros de arrimo nas Ruas 94 (onde o deslizamento aconteceu), 128 e 129. Em janeiro de 2013, as obras da Rua 94, iniciaram. Foram as únicas que saíram do papel. “E ainda assim, está incompleta. Deveriam existir duas canaletas, uma de cada lado do muro. Uma foi construída. A outra,onde houve o deslizamento, não foi feita”, aponta a bióloga.

Para ela e os 1,8 mil moradores do Córrego da Areia, o sentimento é de que a tragédia poderia ter sido evitada e de que novos deslizamentos podem ocorrer. “Estamos completamente abandonados, não se vê prefeitura nem ninguém por aqui, só depois que a tragédia acontece”, lamentou a comerciante Sueli Rodrigues, 49 anos.

O deslizamento de barreira tirou a vida de Adalmir Ferreira, 53, Silvano Silva, 49 e de três de seus filhos: Mariana Silva, 18, Luiz Eduardo da Silva, 15 e Maria Eduarda da Silva, 21. A única sobrevivente foi a mãe, Hariana Xavier, de 38 anos. Sivonaldo Silva, 23, não estava na casa dos pais na noite do deslizamento, causado pelas chuvas, e também sobreviveu. Agora, ele deve ir atrás de indenização. “Nada vai trazer minha família de volta, mas eu e minha mãe precisamos recomeçar.”

RESPOSTA

Em nota, a Prefeitura de Abreu e Lima informou que existem várias voçorocas no município, com elevado custo para contenção. “Em convênio com o Governo Federal, o município eliminou as voçorocas da Rua 94, Rua 128 e 129 em Caetés I e, atualmente, espera aprovação de um convênio com a União no valor R$ 16 milhões para a contenção da voçoroca da Rua 137, em Caetés I, e Rua 26, em Caetés II, além da construção de diversas encostas da Rua Transamazônica, no Fosfato”, diz um trecho. O comunicado diz ainda que o município enviou para a Defesa Civil Nacional um plano de detalhamento de encostas para minimizar danos e riscos causados pelos deslizamentos e que está indo a Brasília monitorar a liberação dos recursos, em caráter emergencial. O MPPE foi procurado para responder sobre o caso, mas, até o fechamento desta edição, não deu retorno.

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