O Museu do Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano acaba de ampliar o acervo disponível ao público com uma coleção de móveis do século 19 confeccionados no estilo renascimento Luís 13. Pesados, carregados nos enfeites e cheios de entalhes, o guarda-louça, a cristaleira e o trinchante são severos demais. Mas essa é uma leitura dos tempos atuais. Móveis, assim como roupas, adaptam-se aos costumes e contam a história através dos anos.
As peças doadas ao Instituto Arqueológico são feitas de carvalho, fabricadas na Europa, possivelmente na Áustria, e chegaram ao Recife desmontadas, numa viagem de navio. Foram compradas numa época em que as famílias abastadas encomendavam os móveis pelo telégrafo, depois de escolher a mercadoria em um catálogo. “Cada móvel tinha um número correspondente, a pessoa selecionava e fazia o pedido”, explica o primeiro secretário do instituto, Reinaldo Carneiro Leão.
Mesa doada por parentes de Marina Bandeira na Sala Gilberto Freyre. Foto: Leo Motta/JC Imagem
Provavelmente, foi assim que Manoel Florentino Carneiro da Cunha, ex-presidente do Instituto Arqueológico, adquiriu a mobília agora em exposição no museu, localizado na Rua do Hospício, 130, bairro da Boa Vista, no Centro do Recife. Os móveis ambientavam a casa de Manoel Florentino, na Rua da Aurora, às margens do Rio Capibaribe, e lá permaneceram até 1899, quando ele faleceu. Novamente empacotados, seguiram para o Rio de Janeiro com herdeiros.
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Depois de 120 anos no Rio de Janeiro, guarda-louça, cristaleira, trinchante, mesas e cadeiras de palhinha retornam ao Recife numa doação feita por parentes de Marina Bandeira, sobrinha-bisneta de Manoel Florentino e prima em segundo grau do poeta Manuel Bandeira. Secretária de dom Helder Camara (1909-1999) quando ele era bispo no Rio e uma das fundadoras do Movimento de Educação de Base, Marina morreu em maio último aos 94 anos.
Ela também ajudou a fundar a Comissão Brasileira de Justiça e Paz e a Comissão de Estudos de História da Igreja e do Cristianismo na América Latina (Cehila), além de ter sido assistente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). “Sua história de vida está intrinsecamente ligada à luta pela democracia brasileira, ela participou dos embates entre Igreja e governo militar durante a ditadura”, escreveu o presidente da Cehila, Mauro Passos, em nota divulgada após o falecimento de Marina Bandeira.
Detalhes
O trinchante, aparador onde se trinchava as carnes servidas nas refeições e equipado com gavetas para talheres e apoio para as compotas da sobremesa; a cristaleira decorada com viola, corneta, violino, folhagens e a cara de animais (uma delas funciona como puxador de gaveta); o guarda-louça enfeitado com flores, ramos, folhagens e figuras de bichos; e as mesas com pés floreados eram do apartamento de Marina no Rio. “Em vida, ela sempre dizia que queria doar as peças ao instituto”, afirma Reinaldo Carneiro Leão.
Completa a ambientação da sala um quadro com a imagem de Maria Cândida de Souza Bandeira, bisavó de Marina e avó de Manuel Bandeira. Móveis semelhantes às novas peças do acervo do Instituto Arqueológico são encontrados na Academia Pernambucana de Letras, que funciona num casarão do século 19 na Avenida Rui Barbosa (esquina com a Avenida Doutor Malaquias), nas Graças, bairro da Zona Norte do Recife. “São característicos de um período”, observa Reinaldo.
Inaugurado em 1866, o Museu do Instituto Arqueológico é um dos mais antigos em atividade no Brasil e em Pernambuco. Recebe visitantes de segunda a sexta-feira, das 8h às 12h e das 14h às 16h, e aos sábados está aberto apenas no primeiro expediente, das 8h às 12h. A taxa de ingresso custa R$ 2.