João Gilberto Noll se apresenta na Fliporto

Escritor gaúcho faz leitura encenada de trechos dos seus livros neste domingo (18/11), mostrando suas narrativas que aceitam o caos da vida contemporânea
Do JC Online
Publicado em 18/11/2012 às 10:48


Poucos autores fundem voz e narrativa de modo tão dissonante quanto João Gilberto Noll. Convidado da Festa Literária Internacional de Pernambuco (Fliporto) de domingo (18/11), o autor gaúcho costuma construir suas obras a partir da problematização do ato narrar: como é possível contar uma história sem harmonizar falsamente o caos do mundo?

É esse tipo de provocação que o fez um dos autores contemporâneos brasileiros mais importantes - nome referenciado, por exemplo, por autores latino-americanos queridinhos da nossa crítica como Alan Pauls e Cesar Aira. No seu mais recente livro, Solidão continental (Record, 128 páginas, R$ 28), Noll nos traz um personagem-narrador mais uma vez anônimo, mais uma vez fraturado, em uma prosa pouco interessada em produzir encontros: o que interessa ao autor é o estranho, o inconciliável, o desconexo.

No livro, um homem passeia pelo continente americano, de Chicago até Porto Alegre, com saltos temporais quase aleatórios. "O livro é um translado mais por um território interior do que exterior. Por isso, as cidades de que falo são meio fantasmagóricas. Até porque eu não estou interessado nesse localismo: eu me considero, para o bem e para o mal, um escritor universal", explica Noll, em entrevista por telefone. "Apesar disso, esses locais me ajudam a não fazer muita abstração. Ainda que precariamente, dão alguma concretude à história".

Segundo o autor, uma descoberta recente é a de que os narradores de seus romances são sempre os mesmos. "Esse é um personagem que me persegue há muito livros. É um personagem que me habita", define o gaúcho. Mesmo que se contradizendo entre um livro e outro, a pulsão da voz - sempre ela, a última instância de teste da instabilidade da literatura - continua a mesma. "Em um livro ele pode ser um vagabundo, no seguinte um escritor, noutro um ator", conta.

Outra influência para a concepção dessa voz do personagem são os filmes. "O cinema se entranhou na minha vida, na minha cabeça. Meus personagens são um tanto cinematográficos. Em Solidão continental, por exemplo, se vê isso no momento em que o narrador se encontra com um casal vizinho, na cena da floresta, na cena do beijo, quando falo de uma boca próxima em close. Até destaco no livro o aspecto cinematográfico disso, os lábios pintados da mulher, os lábios não pintados do homem", aponta.

Solidão continental é um romance que trabalha tanto os limites da reprodução da experiência do contemporâneo que termina funcionando quase como um exercício literário. Longe de ser um romance palatável, em que B sucede A e prepara o terreno para C, trabalha com o caos: como se as lembranças do protagonista, um homem perdido que rememora seus amantes enquanto passeia pelas cidades, fossem incapazes de se reunir em uma coerência.

"O que tento é isso mesmo: explicitar esse conflito exacerbado que existe entre o eu e o mundo. Hoje está cada um na sua e ninguém realmente em harmonia. Todos estão nas telas, na internet, vendo historinhas fantasiosas, mas na verdade essas coisas não acontecem. O desejo mais humano é o da fusão com o outro, é o da fusão com a natureza. Eu mostro na minha literatura basicamente a impossibilidade da fusão", pondera. "Acho que é um pouco por aí".

Na Fliporto, Noll vai fazer, a partir das 18h30, uma performance, a partir de uma leitura encenada de pedaços das suas diversas obras. É uma forma de explicitar não apenas que há uma voz comum em todos aqueles narradores, mas também que há uma voz, que é sempre ela o ponto de partida da narrativa. "Depois vou abrir o microfone para conversar com o público. Meus livros são romances da voz. Não são romances de acontecimentos externos, há sempre uma eterna especulação da voz", trama o autor.

Leia mais no Jornal do Commercio deste domingo (18/11)

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