Depois de uma década de virtual abandono, a agenda econômica do Mercosul começa a dar sinais de vida e caminha para alcançar, no fim deste ano, seu objetivo mais ambicioso: um acordo de livre-comércio com a União Europeia (UE). As engrenagens começam a girar também para concretizar acordos mais antigos assinados na região, que permitem formar, na prática, uma zona de livre-comércio na América do Sul a partir de 2019. Porém, ainda há um estoque de problemas acumulados nas transações na região e dentro do próprio bloco.
Negociadores do acordo entre Mercosul e UE acham possível chegar até o fim do ano a um "acordo político", ou seja, às linhas principais do entendimento. Se tudo correr como o planejado, o anúncio ocorrerá em dezembro, paralelamente à reunião ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC), em Buenos Aires.
"Será o primeiro acordo do Mercosul com países desenvolvidos", disse ao Estado o diretor do Departamento de Negociações Internacionais do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (Mdic), Alexandre Lobo. "Isso, sem dúvida nenhuma, significa uma mudança para nossa indústria e todo o conjunto produtivo brasileiro."
"Essa é uma negociação longa, mas aparentemente a última rodada foi bastante positiva", comentou o ex-secretário de Comércio Exterior Welber Barral, sócio da Barral M. Jorge Consultores. Do lado europeu, disse ele, avalia-se que haverá um período favorável a avançar após as eleições na França.
Ambos escolheram as exportações como alavanca para retomar a atividade econômica. Essa coincidência facilita o diálogo. "Antes, nas negociações, a gente nunca sabia como a Argentina ia se posicionar e isso gerava insegurança", disse o diretor de Desenvolvimento Industrial da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Carlos Eduardo Abijaodi.
Não é só com a UE que o Mercosul retomou a rota do entendimento. Há algumas semanas, paralelamente a uma reunião do Fórum Econômico Mundial, em Buenos Aires, chanceleres e ministros da Indústria do bloco se reuniram com seus contrapartes na Aliança do Pacífico (Chile, Colômbia, México e Peru) e desenharam uma rota de negociações em busca de maior integração.
Na mesma ocasião, os países do Mercosul fecharam acordo de facilitação de investimentos, que protege empreendimentos de um país instalados em outro. Esse é o tipo de acordo chamado de segunda geração, ou seja, trata de outras relações econômicas e não só do comércio de bens. O Brasil tem acordos desse tipo com Colômbia, Chile, Peru e México, assinados em 2015.
Também às margens do Fórum, o governo brasileiro manteve uma série de reuniões com a Colômbia, parceiro estratégico. Nelas, foi destravado um acordo que cria cotas de exportação de automóveis com tarifa zero para ambos os lados. No caso do Brasil, permitirá triplicar a venda em três anos, chegando a 50 mil unidades por ano. Esse entendimento, fechado em 2015, estava parado por resistência dos colombianos.
As montadoras consideraram o acordo positivo, mas, nos bastidores, dizem que o ideal seria chegar ao livre-comércio. Esse acordo está em renegociação e as conversas ficaram paradas por causa da Venezuela.
Na avaliação de Barral, essa nova dinâmica é movida por dois fenômenos. Um é a decisão do presidente dos EUA, Donald Trump, de não entrar na Aliança Transpacífica. Essa era a principal aposta de países como Colômbia, Peru, Chile e México, que agora buscam novas alternativas. O segundo é a mudança de governo na Argentina, com postura mais aberta ao mercado mundial. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.