A procuradora do Ministério Público do Trabalho Débora Tito foi uma das primeiras a alertar que existia uma panela de pressão prestes a explodir em Suape. No ano passado criou um fórum para discutir a desmobilização dos operários na obra da Refinaria Abreu e Lima. Hoje a preocupação não é apenas com o desemprego gerado pelo fim da construção, mas com a onda de calotes contra os trabalhadores. Nesta entrevista ela responsabiliza a Petrobras pelo caos social instalado e diz que a corrupção não pode respingar do lado mais frágil: o da mão de obra, que ergueu o maior empreendimento do Estado.
Leia Também
JORNAL DO COMMERCIO – A senhora sugeriu a criação de um fórum, prevendo problemas na desmobilização. Como vê o caos instalado agora?
DÉBORA TITO - A ideia era de prevenção, que a desmobilização de 60 mil trabalhadores não provocasse o caos no Estado. Infelizmente de março para cá, a Petrobras se envolveu em tantos escândalos de corrupção, que estão respingando nos trabalhadores. O fato de ter um ninho de calotes numa empresa que deveria ser a de maior solvabilidade econômica está fazendo o lado mais fraco sentir. Para nossa surpresa a coisa está muito pior do que em nossos piores pesadelos.
JC - Quando é questionada, a Petrobras responde que a responsabilidade trabalhista é das empresas contratadas.
DÉBORA - A Petrobras usa o discurso de dois pesos e duas medias. Quando é uma empresa amiga, ela paga. Quadro não é, ela não paga. Exemplo: no caso da Jaraguá (envolvida no Petrolão), aqui em Pernambuco ela pagou R$ 30 milhões em direitos trabalhistas da empresa, sem que ela tivesse créditos a receber (da estatal). A Petrobras é boazinha com quem ela quer. Então é impossível não perceber que tem um viés político contra a Petrobras. E isso é inadmissível porque estamos lidando com questões trabalhistas alimentares. As empresas precisam resolver os problemas de seus créditos nas instâncias cíveis, mas isso não pode atingir o trabalhador.
JC - Isso seria um indicativo de que a Petrobras gerencia a obra?
DÉBORA - Sim. Essa postura de dois pesos e duas medidas deixa muito claro que ela está gerenciando. Não está apenas como dona da obra. Pagar débitos da Jaraguá sem a empresa ter dinheiro a receber é uma prova evidente. Essa postura da Petrobras é seletiva, ela está sendo cínica. Ela escolhe com quem quer andar do lado da lei e com quem ela não quer. A empresa está usando o mesmo argumento para pagar e não pagar. Tem os amigos do rei, os gerentes que estão envolvidos com a CPI, quem são as pessoas que estão envolvidas com a corrupção. Que tem um ninho de corrupção na Petrobras é muito evidente. Isso tem que ser resolvido nas instâncias cíveis e criminais e os trabalhadores sejam pagos. O que não pode é ter 4.700 pessoas sem receber salários há três meses e a Petrobras dizendo que não é com ela e a Alusa que também não é com ela. Paguem e briguem seus duelos de titãs em outras instâncias. Porque na instância trabalhista a Petrobras tem que pagar, sim.
JC – Há um desconhecimento de que o dinheiro repassado pela Petrobras aos trabalhadores seria da União. Isso configuraria que além da corrupção, que inflou o valor da obra, essa conta também acabaria indo para a conta do cidadão brasileiro.
DÉBORA – É verdade. É bom ressaltar que esse dinheiro não é da Petrobras. No caso da Alusa ela tem créditos. O dinheiro está com a Petrobras. No caso da Jaraguá ela não tinha crédito a receber e a estatal pagou as dívidas trabalhistas. Então não tem sustentabilidade o discurso da Petrobras. É um discurso vazio e que está eivado de questões como corrupção, lavagem de dinheiro...Tudo o que todo o Brasil está vendo. E que não pode sobrar para o trabalhador.
JC - Como estão os encaminhamentos para tentar reverter a decisão do juiz Hélio Galvão, que desbloqueou os recursos da Petrobras?
DÉBORA - Nós entramos com um agravo regimental quanto à liberação dos R$ 126,6 milhões que a juíza da 1ª Vara de Ipojuca (Josimar Mende) já tinha bloqueado. A gente vai lutar para que essa decisão de bloqueio fique incólume para que a gente comece a tentar pagar os trabalhadores. Queremos fazer com que a Petrobras reconheça esses créditos devidos à Alusa para repassar aos operários. Se não conseguir pagar tudo, que pelo menos libere aos poucos para amenizar o problema, como foi feito com outras empresas. Estamos vendo os trabalhadores protestando e não estou aqui legitimando nenhum ato de violência, mas se você deixa 4.700 pessoas com fome vai acontecer alguma coisa.