Nos anos 50, um “estrangeiro” desembarcou em Pernambuco com a missão de fazer um diagnóstico econômico e propor ideias para o desenvolvimento do Estado. Na época, muitos dos que ouviram os prognósticos acharam o pensamento daquele economista e religioso católico muito avançado para o cenário local. Sessenta anos depois, parte do Pernambuco vislumbrado pelo dominicano francês Louis-Joseph Lebret (conhecido por aqui como o Padre Lebret) faz parte do nosso cenário econômico. Foi ele quem disse que o futuro do Estado passava pela implantação de um grande porto no Litoral Sul. E lá está o Complexo de Suape, prestes a completar quadro décadas em 2018.
Era o governo do general Oswaldo Cordeiro de Farias, em 1954, quando a Comissão de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco (antiga Codepe e hoje Condepe/Fidem) convidou o Padre Lebret a apresentar alternativas para o desenvolvimento industrial do Estado. Em 1955 foi publicado o “Estudo sobre o Desenvolvimento e Implantação de Indústrias, interessando a Pernambuco e ao Nordeste”. O escrito acabou ganhando três edições e em 2015 comemorou 60 anos.
A comemoração das seis décadas do Estudo motivaram a Companhia Editora de Pernambuco (Cepe) e a Ceplan - Consultoria Econômica e Planejamento a reeditar o material, dessa vez comentado por especialistas à luz da realidade atual de Pernambuco e do Nordeste. Intitulado “Diálogos com Lebret 60 anos depois”, o livro foi lançado na última quinta-feira, na Condepe-Fidem (casa onde as ideias do dominicano foram colocadas no papel). Organizado pelo sociólogo Francisco Jatobá e pelo economista Tarcisio Patricio, o livro inclui o texto original e os mapas da publicação de Lebret.
A orelha do livro é escrita pela economista e sócia-diretora da Ceplan, Tania Bacelar, que avalia a importância de reeditar a obra de Lebret num momento de “perplexidades e desafios” vividos pelo Brasil. Ela recorda que na década em que o padre escreveu o Estudo, o País se preparava para consolidar sua base industrial, comandada pelo programa de Juscelino Kubitschek. A “questão nordestina” também ganhou força na época com a criação da Sudene e participação ativa de Celso Furtado.
“O material sobre a história econômica de Pernambuco é muito pulverizado. Percebi isso quando fui pesquisar para minha tese de doutorado em economia. Diante da dificuldade recebi a sugestão de meu primo e economista Jorge Jatobá de ler o livro do Padre Lebret. Fiquei impressionado com a capacidade visionária dele e com a linguagem acessível e convidei Tarcisio Patricio para organizar uma reedição que dialogasse com a situação atual do Estado”, diz Francisco Jatobá.
A primeira parte do livro traz o texto original do Estudo de Lebret, em que ele sugere como o desenvolvimento e o futuro pernambucano passaria pela criação de um grande porto no Litoral Sul, pela construção de uma refinaria de petróleo, pela implantação de uma indústria de borracha (que começou como Coperbo, depois virou Petroflex e agora é Lanxess), pelo avanço da energia elétrica, pela interiorização do desenvolvimento, por recursos humanos qualificados. Uma atualidade no discurso que parece que estamos falando no Pernambuco de hoje.
Na segunda parte, o livro traz os diálogos com Lebret, por meio de textos de especialistas em várias áreas de desenvolvimento citadas pelo dominicano. O capítulo sobre “Desenvolvimento e recursos humanos em Lebret” é assinado por Tarcisio Patricio e Roberto Alves de Lima e analisa a ênfase dada por Lebret à “ascensão humana” ao invés de o desenvolvimento servir apenas ao enriquecimento de poucos. O que diria hoje o Padre Lebret sobre o futuro do Brasil e de Pernambuco?