Casamento, adoção e registro de filhos entre casais homoafetivos são questões que devem ser julgadas sem preconceito, disse Frederico dos Santos Messias, professor e juiz de Direito da 4ª Vara Civil de Santos. Ele participou nesta quinta-feira (1º) do II Congresso Internacional de Direito Homoafetivo, promovido pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em São Paulo.
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Segundo o juiz, atuante na defesa da causa LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros), o reconhecimento da união estável entre pessoas do mesmo sexo não gera mais controvérsias do ponto de vista jurídico, após decisão favorável do Superior Tribunal Federal (STF). O magistrado defende mais facilidade para o casamento direto em cartórios, sem necessidade de comprovação da união estável.
O juiz conta que editou uma portaria autorizando os cartórios de registro civil de Santos a celebrar o casamento direto. “Era preciso que essas questões fossem regulamentadas. O casal não pode ser surpreendido, pois alguns conseguiam [o casamento direto], outros não”, disse. A portaria foi confirmada pela Corregedoria Geral de Justiça de São Paulo, que tornou a regra válida para todo o estado a partir de março de 2013. A norma paulista passou a ser nacional em maio de 2013.
“Eu celebrei, em Santos, um casamento coletivo com três casais. A magistratura me deu muitos momentos de alegria. Este, com certeza, foi um deles. A certeza de que a união é reconhecida pelo estado, de que filhos e companheiros ficarão resguardados em caso de falecimento, é uma felicidade muito grande”, disse Frederico.
Casamento
Ricardo Luís Dias, advogado da Comissão da Diversidade da OAB-SP, vive uma relação homoafetiva há 6 anos. Ele e o companheiro pretendem oficializar o casamento em breve, já que se preocupam com a divisão dos bens que adquiriram, como apartamento e carro.
“Estamos com a documentação para efetivar o casamento. A gente já discutiu bastante sobre a possibilidade de adotar [filhos]. Da mesma forma que a gente sente falta, a gente tem um pouco de receio de que isso possa atrapalhar as nossas conquistas na área profissional. Estamos procurando estabilizar isso antes”, disse.
Adoção e reprodução assistida
A adoção de crianças por casais homoafetivos já enfrentou resistência do Poder Judiciário, “com base em argumentos preconceituosos”, explica o magistrado. Atualmente, após decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a adoção passou a ser aceita com certa tranquilidade.
O assunto problemático a ser enfrentado, segundo ele, é o registro de filhos nascidos a partir de técnicas de reprodução assistida. Para Frederico, na declaração de nascido vivo, ou seja, o documento formal emitido pela maternidade, devem constar os nomes das duas mães ou dois pais. Um possível doador, independente dos vínculos biológicos, não deve figurar.
O juiz lembra que editou uma portaria que permitia os oficias do cartório de Santos realizar esse registro, sem necessidade de submeter a juízo. “Infelizmente, a portaria foi cassada pela Corregedoria Geral de Justiça (CNJ) de São Paulo”, conta.
A resolução do CNJ sobre o registro de crianças por técnica de reprodução assistida diz que é preciso uma declaração da clínica responsável com a identificação do doador. “Não vejo necessidade prática dessa informação, pois, muitas vezes, o doador não quer ser identificado e o recebedor não quer saber quem é o doador”, disse o magistrado.
Para orgulho da advogada Maria Auxiliadora Perez, no registro de seu filho Artur, que tem 45 dias de vida, constam o seu nome e o da esposa. As duas estão juntas desde 2009. Quatro anos depois, elas se casaram no civil e começaram a desejar um filho. O sobrinho de Maria foi quem se ofereceu para doar o sêmen.
Elas encontraram uma alternativa para driblar os altos custos da inseminação assistida utilizando uma técnica caseira. “Foi uma coisa bem simples, a minha esposa se autoinseminou. Calculamos o período fértil e ela fez a inseminação, foi muito bonito. Minha mãe, de 76 anos, foi a mentora de tudo isso, ela até assistiu o parto, foi uma cesariana. Assistiu o neto nascer”, conta.
Transgênero
A alteração de nome e gênero nos documentos de identidades de pessoas que fizeram a cirurgia de mudança de sexo tem sido aceita no meio jurídico, segundo o magistrado.
Porém, os transgêneros que optam por não realizar a cirurgia têm encontrado dificuldade, o que não faz sentido para o juiz. “O fundamento é o mesmo para aquele que não operou, a inconformidade com o sexo. Para mim, a técnica da cirurgia é uma mera complementação”.