Guerra das Malvinas - 30 anos

"O Brasil apenas manteve relações corretas com o Reino Unido"

Confira a entrevista do historiador e cientista político Luiz Alberto Moniz Bandeira sobre o papel do Brasil na guerra

Wagner Sarmento
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Wagner Sarmento
Publicado em 31/03/2012 às 14:28
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FOTO: Martin Bernetti/AFP
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JC – O Brasil adotou uma posição de neutralidade na Guerra das Malvinas, mas há quem fale sobre um tênue favorecimento à Argentina. Como o senhor avalia posição brasileira?

LUIZ ALBERTO MONIZ BANDEIRA – O Brasil, por discordar de uma ação armada como forma de resolver o litígio, manteve uma posição de neutralidade, mas uma neutralidade imperfeita, isto é, favorável, na prática, à Argentina. Em virtude dos entendimentos entre os generais João Figueiredo e Rafael Videla, em meio de 1980, não podia deixar de favorecer praticamente a Argentina. Os dois países já se encaminhavam para uma aliança estratégica, após resolver o dissídio sobre Itaipu, com o tratado tripartite, de 1979.

JC – Era possível que o Brasil adotasse uma posição mais veemente, de apoio à Argentina, ou a posição adotada foi a mais inteligente?

BANDEIRA – O presidente João Figueiredo, a princípio, até pensou em alinhar-se militarmente com a Argentina, mas o Itamaraty ponderou que o ataque partira da Argentina e não do Reino Unido, razão pela qual não se podia invocar o Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (Tiar), também conhecido como Tratado do Rio.

JC – Na época do conflito, o Reino Unido acusou Brasil de vender mísseis à Argentina. Há quem diga que o Brasil chegou a vender caças e aviões. A que nível foi tal interferência?

BANDEIRA – O que o Brasil cedeu à Argentina, sob a forma de leasing, foram dois aviões EMB-111, já em uso pela Força Aérea Brasileira, estacionados na base aérea de Santa Catarina, a fim de que patrulhassem o litoral e acompanhassem a movimentação da esquadra britânica. Foram pintados com as cores Argentina e pilotados por oficiais brasileiros em seus voos de rastreamento sobre o Atlântico Sul, acompanhados por oficiais argentinos, uma vez que não havia tempo suficiente, cerca de um a dois anos, para treiná-los. O Brasil vendeu obuseiros e peças para fuzis e metralhadoras. De acordo com informação do general Octávio Aguiar de Medeiros, chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI), Figueiredo determinou ao ministro da Aeronáutica, Délio Jardim de Matos, que fornecesse à Argentina uns 12 a 14 Xavante, caças a jato, os primeiros fabricados pelo Brasil, mas eles nem chegaram a entrar em operação. O Brasil só não forneceu foguetes do Sistema Balístico Ar-Terra (SBAT-70) de 2,75 polegadas, tanques e outros petrechos bélicos, porque o conflito logo terminou com a vitória do Reino Unido.

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Panorama das Malvinas atualmente - Martin Bernetti/AFP
Panta Astiazaran/AFP
Agentinosa vão às ruas em apoioàs tropas do país, em abril de 1982 - Panta Astiazaran/AFP
Arquivo pessoal
Mais recente reencontro de ex-combatentes da Guerra das Malvinas, em 2010 - Arquivo pessoal
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Aviões argentinos Air Macchi em manobras durante a guerra - AFP
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Navio britânico Broadsword sib ataque de aviões argentinos - Daniel Garcia/AFP
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Soldados argentinos escoltados por forças britânicas após sua rendição, em 2 de junho de 1982 - AFP
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Charge publicada em jornal espanhol - Rodrigo Lobo/Jc Imagem
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O então ditador Leopoldo Galtieri - AFP
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JC – Houve algum tipo de favorecimento também ao Reino Unido, já que o Brasil não queria desgastar suas relações com os britânicos?

BANDEIRA – O Brasil apenas manteve relações corretas com o Reino Unido.

JC – O episódio do bombardeiro britânico Vulcan, que pousou em solo brasileiro com problemas técnicos e foi retido por autoridades brasileiras, exemplificou o risco da postura ambivalente do Brasil?

BANDEIRA – Não se pode considerar a posição do Brasil como ambivalente. E o governo não podia deixar de permitir que o bombardeiro Vulcan XM597, vindo de Port Stanley, nas Malvinas, com graves problemas, pousasse de emergência, no aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro. O comandante Neil McDougall e demais tripulantes não foram presos e, após entendimentos diplomáticos, o governo britânico mandou ao Brasil o apoio logístico e os técnicos para fazer os devidos reparos e reabastecer o bombardeiro. A atitude do governo brasileiro não foi de favorecimento ao Reino Unido. Tratou-se de emergência e o Brasil era formalmente neutro.

JC – O Brasil ficou responsável por defender os interesses dos dois países nas respectivas embaixadas britânica e argentina em Buenos Aires e Londres. Por que o Brasil?

BANDEIRA – Simplesmente porque a posição oficial do Brasil foi de neutralidade (embora imperfeita) e o governo brasileiro mantinha boas relações com os dois países em conflito.

 

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