O papa Francisco optou nesta sexta-feira (24) pela franqueza ao invés da prudência ao denunciar "o genocídio" dos armênios em 1915/16 sob o Império Otomano, pronunciando pela segunda vez esta palavra considerada inaceitável pela Turquia.
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"Esta tragédia, este genocídio marcou, infelizmente, o início da triste série de catástrofes imensas do século passado", exclamou o papa no palácio presidencial armênio em Yerevan, na presença do chefe de Estado Serge Sarkissian, de representantes da classe política e do corpo diplomático.
A palavra 'genocídio' não figurava no texto distribuído por antecedência. Francisco já havia qualificado o massacre armênio de genocídio em abril de 2015 no Vaticano, o que provocou a ira de Ancara.
"É tão triste que nesse caso e nos outros dois [o papa não os especificou], as grandes potências olham para o outro", denunciou.
"Estas lamentáveis catástrofes do século passado aconteceram por razões raciais, ideológicas ou religiosas aberrantes, que obscureceram o espírito dos carrascos até o ponto de assumirem o propósito de aniquilar povoados inteiros", queixou-se.
O líder da Igreja apostólica armênia, Catholikos Karekine II, ao receber o papa em sua catedral de Etchmiadzin perto de Yrevan, e depois o presidente, evocaram o "Grande Mal" de 1916/17 como um "genocídio".
O Vaticano havia evitado pronunciar a palavra "genocídio", depois que o papa pronunciou este termo na Basílica de São Pedro, em abril de 2015.
A Turquia rejeita o termo genocídio para descrever os massacres de armênios durante o Império Otomano, dizendo que se tratou de uma guerra civil em que turcos e armênios morreram.
O papa prestou "homenagem ao povo armênio que, mesmo nos momentos mais trágicos de sua história, sempre encontrou na Cruz e na Ressurreição de Cristo a força para se levantar e retomar sua jornada com dignidade".
Francisco salientou que esses perigos ainda estão presentes. "Eu realmente desejo que a humanidade aprenda com essas experiências trágicas a lição de agir com responsabilidade e sabedoria para evitar os perigos de cair nestes horrores", acrescentou.
"Mártires de ontem e de hoje"
"Os cristãos em particular (...) são discriminados em alguns lugares e perseguidos pelo simples fato de professarem a sua fé", denunciou mais uma vez, em referência ao Oriente Médio.
Quinze anos depois da visita de João Paulo II, em 2001, à Armênia, Francisco retorna a um país da periferia da Europa, onde os católicos são uma minoria.
A Armênia, onde o papa permanecerá de 24 a 26 junho, foi o primeiro país a adotar o cristianismo como religião de Estado no ano 301. Hoje, a maioria da população é cristã ortodoxa e 10% muçulmana.
Desde o papa Bento XV, que escreveu três vezes à autoridade otomana durante a Primeira Guerra Mundial para parar os massacres, a Santa Sé sempre esteve atenta à tragédia armênia. João Paulo II tinha assinado com Karekin II, em 2001, uma declaração condenando o "genocídio".
No sábado, Francisco visitará o memorial Tsitsernakaberd dedicado a esta tragédia. De acordo com o Instituto Nacional Armênio, 27 Estados já reconheceram o genocídio, incluindo a Alemanha, França, Rússia, Estados Unidos e o Vaticano.
O papa quer aproveitar a sua visita a esta terra de mártires para destacar perseguição aos refugiados de hoje.
Ainda a bordo do avião que o levou em sua 14ª viagem ao exterior, Francisco apelou para a "responsabilidade" da Europa para "garantir o bem viver conjunto", após o voto histórico britânico a favor de uma saída do Reino Unido da União Europeia (UE).