Cerca de 200.000 pessoas se manifestaram em Barcelona nesta terça-feira (17) à noite contra a prisão de dois influentes líderes separatistas acusados de sedição pela Justiça, em meio a uma crise inflamada entre o governo regional e o central.
Aos gritos de "independência" e segurando velas, a multidão marchou pelo centro da cidade para reivindicar a libertação de Jordi Cuixart e Jordi Sánchez, das organizações Òmnium Cultural e Assembleia Nacional Catalã (ANC) e presos sob acusações de sedição.
Na frente judicial, o Tribunal Constitucional anulou definitivamente a lei catalã com a qual convocaram o referendo de independência de 1º de outubro, momento em que se descontrolaram os acontecimentos que afundaram a Espanha em sua pior crise política dos últimos 40 anos.
A manifestação desta noite foi o ponto alto de um dia de mobilizações. Ao meio-dia, milhares de funcionários abandonaram seus postos de trabalho em Barcelona e outras localidades catalãs para exigir em silêncio "a libertação dos presos políticos".
"Querem nos colocar medo, mas não tenho. Não acredito que vão aparecer agora por aqui com cassetetes, mas temos o pressentimento de que vão nos causar mais dano", disse à AFP a idosa Conchita Riera, que participou do protesto.
Também ao meio-dia, na praça de Sant Jaume, o presidente catalão, Carles Puigdemont, e parte de seu governo se uniram aos manifestantes, que gritavam "liberdade", "independência" e "repressão não é a solução".
A Prefeitura de Barcelona suspendeu as atividades até quinta-feira "em solidariedade" aos detidos, anunciou a prefeita Ada Colau.
As próximas 48 horas são cruciais para o futuro do conflito entre os Executivos de Madri e Barcelona, que foi o primeiro a ter rebaixadas as previsões de crescimento econômico para 2018, de 2,6% para 2,3%.
Òmnium e ANC convocaram uma grande manifestação para sábado, às 17h00 (13h00 de Brasília), na cidade.
Entramos em "uma nova escala de mobilizações que, como sempre, serão pacíficas, democráticas, porque não sabemos fazer de outra maneira. Serão ações que irão supor um passo à frente, ações diretas, com a força da cidadania", disse à imprensa Marcel Mauri, porta-voz da Òmnium.
No plano econômico, nesta terça-feira foi revelado que 691 retiraram suas sedes sociais da Catalunha em outubro, mais do que nos nove meses anteriores de 2017, de acordo com o Colégio de Registradores.
Os últimos acontecimentos chegam em um momento de bloqueio na questão administrativa criada pelas ânsias de independência do governo da Catalunha, região de 7,5 milhões de habitantes que representa 19% do PIB espanhol.
A incerteza se estendeu ao futebol, onde a possível perda do FC Barcelona seria um duro golpe para o campeonato espanhol.
Assim, a liga espanhola (La Liga) atrasou em duas semanas a disputa pelos direitos de televisão da competição a nível nacional por conta da inquietação provocada por uma possível exclusão do Barcelona em meio à crise catalã, informou seu presidente Javier Tebas.
"Tivemos que atrasar a licitação que costumamos fazer por estes dias, para saber o que vai acontecer com a Espanha. Estamos no meio de um problema que pode afetar muito o valor da nossa competição. Foi atrasado por aproximadamente duas semanas", declarou Tebas em congresso de futebol em Madri.
O chefe do Executivo espanhol, Mariano Rajoy, deu até quinta-feira para o presidente catalão esclarecer se declarou ou não a independência na semana passada, pergunta que respondeu de forma ambígua na segunda-feira se limitando a oferecer diálogos durante dois meses.
Em uma ligação com o presidente do governo espanhol, Mariano Rajoy, a primeira-ministra Theresa May assegurou que o Reino Unido não vai reconhecer uma declaração de independência da Catalunha.
"A primeira-ministra reiterou que o Reino Unido considera que o referendo não tem base legal e que qualquer declaração unilateral de independência seria incompatível com o Estado de direito", informou um porta-voz de May depois que ela manteve a ligação.
A dirigente britânica acrescentou que "o Reino Unido não reconhecerá semelhante declaração de independência da Catalunha", acrescentou o porta-voz.
Com tudo isto, Cuixart e Sánchez foram presos à espera de um possível julgamento pela juíza Carmen Lamela, da Audiência Nacional, suspeitos de convocar, dirigir e incitar um protesto contra operações da Guarda Civil em 20 de setembro em Barcelona.
O crime de sedição pode acarretar em até 15 anos de prisão. No mesmo caso estão imputados o chefe da Polícia catalã, Josep Lluís Trapero, e uma subalterna sua, Teresa Laplana, que seguirão em liberdade, mas não podem deixar o país.
Diante das múltiplas vozes que apelidaram os dois líderes separatistas de "presos políticos", o delegado do governo na Catalunha, Enric Millo, disse nesta terça-feira em declarações a Catalunya Radio: "iremos nos equivocar se julgarmos a juíza, aqui há a separação de poderes".
O que aconteceu ante a assessoria catalã de Economia "não se pode qualificar de atuação pacífica e cívica", afirmou.