Campanha de Haddad vive isolamento ideológico, com fortes reveses

O PT esbarra na negativa de apoios de forças de diversos campos políticos, inclusive ex-aliados
Luisa Farias e Renata Monteiro
Publicado em 17/10/2018 às 9:06
O PT esbarra na negativa de apoios de forças de diversos campos políticos, inclusive ex-aliados Foto: Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil


Depois de ter passado 13 anos à frente do Brasil, o PT tenta retomar a Presidência da República em um segundo turno contra um adversário que tem entre as suas principais bandeiras o antipetismo. Dentro do projeto para reconquistar o protagonismo no País, o partido esbarra na negativa de apoios de forças de diversos campos políticos – inclusive ex-aliados –, que o ameaçam de isolamento. A 12 dias para a votação, as críticas do senador eleito Cid Gomes (PDT) – irmão de Ciro Gomes – expuseram o mal-estar entre as siglas de esquerda e fizeram a campanha de Fernando Haddad se resignar com a possibilidade cada vez mais remota de atrair o apoio de outros partidos na disputa contra Jair Bolsonaro (PSL).

A campanha de Haddad vive um isolamento no campo ideológico e conquistou adesões protocolares entre siglas de esquerda (PCB, PSB, PSOL) que não estavam coligadas com o PT no primeiro turno a nível nacional. No caso do PSB, o apoio só foi formalizado em Pernambuco, Paraíba e Minas Gerais. O PDT, principal cobiça, anunciou apenas um “apoio crítico”.

Em menos de uma semana, o candidato petista sofreu reveses do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), do ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa (PSB) e até do ex-governador do Ceará Ciro Gomes (PDT). O PT esperava uma presença massiva do pedetista na campanha, mas Ciro – que ficou em terceiro lugar nas eleições, com 13,3 milhões de votos – embarcou para a Europa na última quinta-feira (11) e frustrou os planos do PT. A ampla frente democrática suprapartidária buscada pela sigla não ganhou contornos claros e terminou sendo formada só por partidos de esquerda. 

Professor de ciência política da PUC-RIO, Ricardo Ismael ressalta o fato de que Ciro Gomes e o PDT acreditam que o PT atuou para isolá-lo, impedindo que ele conseguisse apoios, como o do PSB e do PCdoB. “Até mesmo deixaram de lado a possibilidade de o Haddad poder virar vice de Ciro. Assim poderia haver uma chapa mais competitiva”, relembra.

Nessa terça-feira (16), Cid Gomes reiterou suas críticas. “Se tem uma possibilidade de reversão desse quadro (liderança de Bolsonaro), extremamente avesso ao Haddad, que eu considero o melhor candidato, é a gente ir no nó da questão, que é essa ânsia, essa raiva, essa vingança, que boa parte dos brasileiros tem em relação ao PT”, disse. “Penso que a única forma de se contrapor a esse sentimento é desvincular. É um pedido de desculpas, é o reconhecimento de erros (por parte do PT)”, ratificou.

Cobrança pela autocrítica

O presidente do PDT, Carlos Lupi, respaldou nessa terça o desabafo feito pelo irmão de Ciro. “Representam majoritariamente o sentimento da sigla”.

“Não tem autocrítica no PT. O que o Cid Gomes está falando é verdade. Que autocrítica eles fizeram?”, questionou. 

Segundo ele, apesar dos pedidos da campanha petista, Ciro não fará aceno mais incisivo de apoio a Haddad e cumprirá decisão do partido de um anúncio crítico de voto. “Esse projeto do PT, que é hegemônico, nunca na história teve um momento de apoiar quem quer que seja. Eles só querem apoio”, criticou.

Lupi reconhece que o PDT tem parcela de responsabilidade por uma eventual vitória de Bolsonaro (PSL), mas avalia que o PT é o principal responsável.

“No PDT, temos nossos erros também. Nós contribuirmos com essas falhas. Mas quem cometeu mais falhas foi o PT”, afirmou.

Não foi do dia para a noite, no entanto, que o Partido dos Trabalhadores chegou a este cenário. Foi por decisões tomadas antes do início do período eleitoral e até mesmo em pleitos anteriores que aliados tornaram-se adversários e agora relutam em reatar laços com a agremiação. Um dos fatores que ocasionaram a reeleição da ex-presidente Dilma Rousseff nas eleições de 2014 foram os ataques à candidata Marina Silva, então no PSB, em um momento em que ela apareceu como a sua principal adversária nas pesquisas. Nesse segundo turno, a Rede Sustentabilidade de Marina declarou neutralidade.

De acordo com o cientista político Ernani Carvalho, professor da UFPE, as decisões tomadas pelo PT no passado geram, hoje, o que ele classifica como a “falta de credibilidade” que atores como Ciro ou Marina sentem em relação à legenda. “Com a ascensão do PT, iniciada com a chegada de Lula ao poder, vários elementos criaram encontros e desencontros da frente de esquerda do País. Quando falo isso me refiro a Ciro, à Marina, ao próprio Eduardo Campos, que foram promessas feitas durante os processos sucessórios do partido que não se concretizaram. É um histórico de muitos anos do partido no poder, que terminou por criar uma falta de credibilidade de seus parceiros mais próximos”, avaliou o docente.

Para a cientista política Priscila Lapa, porém, nenhum partido brasileiro que tivesse o desempenho do PT no início do período eleitoral, quando o ex-presidente Lula (PT) ainda era candidato, abriria mão de encabeçar os movimentos da esquerda do País. “O PT criou essa postura hegemônica por ser, hoje, o partido mais consistente do ponto de vista eleitoral. Observe que mesmo com um telhado de vidro gigantesco, a sigla conseguiu eleger o maior número de deputados da Câmara. Ao optar por rumar com candidatura própria e não se unir com outros partidos de esquerda, a legenda decidiu usar esse capital eleitoral que ainda tem”, explica. 

Bruno Ribeiro, presidente do PT-PE, crê que, neste momento, não há uma discussão sobre quem apoia ou não Fernando Haddad, mas “o modo de vida que se quer ter”. Afirmando achar “normais” posicionamentos críticos, o petista nega, ainda, que a legenda tenha o objetivo de manter-se hegemônica no poder. “Os governos de Lula e Dilma agregaram todas as forças de esquerda, salvo quem preferiu não participar, como o PSOL e o PSTU. Mas a Marina Silva foi ministra de Meio Ambiente de Lula. Ciro também foi ministro, teve desempenho importante nessa eleição, mas não é alguém que o PT tenha excluído do ato de governar ou nas relações. Acho que se tenta criar uma narrativa que gera uma certa indiferença que favorece Bolsonaro”, pontuou.

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