O juiz federal Sergio Moro defendeu a manutenção da prisão preventiva do presidente da Odebrecht, Marcelo Odebrecht, sob alegação de risco à ordem pública e possível reiteração delitiva (continuidade na prática de crimes).
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Marcelo Odebrecht está preso desde o dia 19 de junho quando foi deflagrada a fase Erga Omnes, da Operação Lava jato.
As afirmações de Moro constam em ofício enviado a Nivaldo Brunoni, relator, no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, do julgamento dos pedidos de libertação de executivos presos na operação.
As justificativas invocadas pelo juiz fundamentaram as prisões preventivas do presidente da empreiteira e de outros dirigentes do conglomerado no mês passado. O julgamento dos pedidos de habeas corpus impetrados pelas defesas deverá ocorrer na próxima semana.
No documento desta quarta (8), Moro afirma que, pelos indícios de envolvimento da Odebrecht no cartel de empreiteiras que agia na Petrobras, seria improvável que o executivo se mantivesse "olimpicamente afastado" da atuação de seus subordinados no setor de óleo e gás.
"Parece improvável que esquema criminoso gigantesco, com provas em cognição sumária, de participação pela Odebrecht em cartel para obter contratos de bilhões de reais e de pagamento de milhões de dólares pela empresa a dirigentes da Petrobras, fosse iniciativa somente de subordinados da empresa", escreveu o magistrado.
O juiz também faz referência a um e-mail em que um executivo da companhia menciona o termo "sobrepreço" em um contrato de sondas. A mensagem tinha como destinatários outros dirigentes do grupo, incluindo Marcelo Odebrecht.
"A referência à mensagem eletrônica do sobrepreço nas sondas, além de indicar possível envolvimento direto de Marcelo no ilícito, o que será avaliado no curso do feito, no mínimo revela, ao contrário do que afirma a Impetração, que ele não se mantinha olimpicamente afastado dos negócios relacionados à exploração de óleo e gás", disse o juiz.
Moro também afirma que pesa contra o empreiteiro suspeitas de que não apenas a Odebrecht, mas também a Braskem -braço petroquímico do grupo- teria pago propinas. Na interpretação do juiz, isso só seria possível com o aval de alguém com poder de gestão das duas companhias.
A ligação da Braskem com a Lava Jato veio de um comprovante de transferência bancária, com o nome da companhia no cabeçalho, entregue por Rafael Angulo López -funcionário do doleiro Alberto Youssef que fazia depósitos e entregava dinheiro em espécie para políticos e dirigentes da Petrobras.
BELO MONTE E ANGRA 3
Um dos principais delatores da Lava Jato, o ex-presidente da Camargo Correa Dalton Avancini afirmou que a Odebrecht liderava o cartel que atuava na Petrobras. Segundo ele, o esquema de fraude em licitações e o suborno a dirigentes de estatais também se repetiu no setor elétrico.
Em dois depoimentos prestados em março deste ano, Avancini disse que Odebrecht, Andrade Gutierrez e Camargo Correa integraram o consórcio para a construção da hidrelétrica de Belo Monte (PA), no qual 1% do valor do contrato seria destinado a propinas ao PMDB e a dirigentes da Eletronorte, entre eles Adhemar Pallocci, irmão do ex-ministro-chefe da Casa Civil Antonio Palocci.
Segundo Avancini, as empreiteiras do consórcio responsável pela construção da usina nuclear de Angra 3 (Odebrecht, Camargo, Andrade Gutierrez, UTC e Techint) operaram um esquema similar de pagamento de propina para o PMDB e para diretores da Eletronuclear.
"É certo que essas declarações quanto a Belo Monte e Angra 3 ainda precisam ser melhor apuradas, mas elas têm plausibilidade considerando os fatos já provados nos contratos da Petrobras", escreveu o juiz.
OUTRO LADO
A Odebrecht foi procurada, mas ainda não comentou.
Em ocasiões anteriores, a empresa e os advogados de Marcelo Odebrecht já haviam criticado a prisão preventiva do presidente do grupo por considerá-la injusta. A defesa afirma que a intepretação pelo Ministério Público Federal dada ao e-mail onde há citação de sobrepreço foi equivocada e que não existem os requisitos para manter a prisão já que os executivos do grupo sempre colaboraram com as investigações.
A empresa sempre negou ter participado de cartel ou ter pago propina a políticos ou dirigentes de estatais.
Em nota à imprensa quando os detalhes do depoimento de Dalton Avancini vieram a público, em abril, a Eletronuclear rechaçou "veementemente" as alegações.
"É uma ameaça aos direitos de cidadania em nosso país o fato de que supostas declarações de criminosos confessos, feitas sob segredo de Justiça e sem qualquer verificação de sua veracidade, sejam 'vazadas' ao público, num processo de denúncia, julgamento e linchamento moral dos seus alvos, sem qualquer possibilidade de defesa", pronunciou-se a estatal sobre o caso.
A Eletronorte e o diretor Adhemar Palloci foram procurados pela reportagem através da assessoria de imprensa da empresa estatal, mas não se manifestaram sobre as citações do delator Dalton Avancini à existência de propina na obra de Belo Monte.