Você faz o roteiro para a sua vida, planeja cada aspecto de uma rotina futura e traça alguns objetivos. Mas, cada dia é um novo capítulo de uma história sob a qual não se tem muito controle. Bolsonaro (PL) , por exemplo, planejou ser presidente por mais quatro anos. Fez de tudo para que isso acontecesse.
Há bolsistas de mestrado e doutorado, além de universidades inteiras, que podem atestar esse empenho do ainda atual presidente. É que, para viabilizar dinheiro no período eleitoral que garantisse auxílio emergencial, o governo saiu cortando verbas da Educação e da Saúde, sem falar na PEC Kamikaze, às vésperas da campanha, que tinha o propósito de distribuir benefícios estourando o teto de gastos.
Agora, está faltando dinheiro para fechar as contas de dezembro. E a reeleição não veio.
E não veio porque uma deputada chamada Carla Zambelli (PL) a maior apoiadora do presidente, fez bobagens com uma arma em plena rua pouco antes da votação. Não veio porque outro grande apoiador, Roberto Jefferson (PTB), atirou contra policiais federais dias antes da votação. Entre outras coisas. Acontece. E por muito pouco, Bolsonaro foi derrotado. A realidade se impôs aos planos.
Foi a mesma coisa que aconteceu com Lula (PT). Sim, o petista venceu, mas também foi vítima da imposição realista. Ele esperava vencer a disputa com boa margem de votos para que seu início em um terceiro mandato fosse incontestável. Faz lembrar Ciro Gomes (PDT), no primeiro turno da campanha, justificando as propostas sem pé e sem cabeça que fazia com o argumento de que “nos primeiros seis meses o eleito está em lua de mel e faz o que quer”.
Pode ser, quando você ganha com 30 milhões de votos. Com 2 milhões a conversa é outra.
Não se contesta de verdade uma eleição dentro de um processo democrático livre, mas vitórias apertadas têm dificuldade para serem legitimadas.
Além disso, Lula venceu nos dois turnos, mas sofreu uma derrota que vai repercutir por quatro anos. É que seus candidatos a deputado e senador não conseguiram fazer grande maioria no Congresso. Presidente que não tem maioria, vira refém num presidencialismo de coalizão e, parece contraditório, mas não é, para ter alguma liberdade, o presidente precisa abrir mão da própria liberdade na indicação de cargos. Lula começará o governo refém do centrão.
Resta esperar pelo futuro. A prova disso foi ele ter sido obrigado a aceitar o inchaço da PEC da Transição com o Orçamento Secreto que o próprio Lula chegou a classificar como o “maior esquema de corrupção da História”.
Só quem realmente se deu bem nessa eleição foi o centrão. Foi o único a não ter os planos traídos pela realidade. O grupo majoritário e interesseiro do Congresso tem uma vantagem sobre qualquer outro vivente do mundo político: ninguém ali se preocupa em fingir ética ou até decência, em alguns casos.
Se todos esperam que você dance, qualquer passo fora do ritmo lhe coloca em situação vexatória. É o caso de Lula e Bolsonaro. Mas, se ninguém espera que você dance, basta balançar os braços ali por perto e ninguém presta muita atenção. Talvez nem precise dançar. No fim da música, enquanto todo mundo comenta a performance atrapalhada dos dançarinos pomposos, o centrão está tomando seu uísque e contando vantagem em alguma mesa da festa.
Agora, enquanto Bolsonaro chora e Lula funde o cérebro tentando formar um governo, o centrão está comemorando o dinheiro do Orçamento Secreto, já garantido para o presente e para o futuro. Não é um proceder bonito, é covarde, é mesquinho, antiético e eivado de corrupção. Mas, no Brasil, ainda funciona.
A governadora eleita, Raquel Lyra (PSDB), está ampliando aos poucos o seu público nas discussões sobre o futuro. Nesta quarta-feira (7) acontece a terceira reunião com instituições e grupos políticos dessa fase de transição.
A primeira foi com os 25 deputados federais da bancada pernambucana, a segunda foi com os 49 deputados estaduais da Alepe e a terceira será com os 184 prefeitos do estado. Não se sabe ainda o que vai ser discutido, porque não dá pra fazer reunião com 184 pessoas.
O evento tende a virar palestra, mas todos esses encontros são importantes para a governabilidade que ela vai precisar.
O problema é que, depois de hoje, será preciso voltar a questionar se a transição realmente vai ficar restrita a menos de uma dezena de técnicos, fazendo um levantamento importante, mas sem conseguir apontar nada para o futuro ainda. Até o fim do ano, a transição será ampliada?