Campos Neto e o Banco Central independente são a pedra no sapato do PT
Confira a coluna Cena Política desta quarta-feira (6)
Um antigo frequentador do Palácio do Campo das Princesas, que ocupou vários postos nos governos do PSB, costumava descrever Gleisi Hoffmann, a presidente nacional do Partido dos Trabalhadores, como alguém “muito fora do tempo”.
Era uma brincadeira para dizer que ela não estava “à frente do seu tempo” e nem estava atrás. Gleisi simplesmente vive uma realidade paralela na qual as coisas só fazem sentido dentro da cabeça dela e para seus seguidores mais próximos. A cruzada dela contra a autonomia do Banco Central é um exemplo disso.
Quase pacificado
Nem Lula (PT) fala mais nesse assunto. Nem Haddad (PT) reclama mais disso. Estamos falando do presidente da República e do ministro da Fazenda. Pelo contrário, os dois estão bem alinhados com Roberto Campos Neto, presidente do BC, e Haddad até tem dialogado sobre a possibilidade de ampliar a autonomia, hoje apenas operacional, para que englobe também uma autonomia financeira.
Gleisi ainda no ataque
Campos Neto comentou isso em uma entrevista, e Gleisi correu para atacar o jornal, o presidente do BC e até os passarinhos que eventualmente cantam na janela do PT. E o que motiva esse ódio voraz da aliada de Lula que tenta encontrar uma vaga de ministra no governo (e até no STF) desde o início de 2023 e não consegue?
O presidente do BC é o inimigo porque faz o papel de chamar o governo a uma responsabilidade que atrapalha os planos eleitorais do PT: a de economizar.
Mandar o governo economizar é como dizer à presidente e ao seu grupo no partido que o brinquedo mais desejado deles de toda a vida, que está disponível na prateleira, terá que ficar para o próximo natal.
Ajustem as contas
Em todos os momentos nos quais o BC foi criticado por não baixar a taxa de juros, Campos Neto defendeu a autonomia e lembrou que o ato de baixar a taxa Selic não depende de vontade política, maldade ou implicância. Os juros podem cair quando houver alguma segurança de que as contas públicas estão ajustadas.
O problema é que o PT, presidido por Gleisi, vê na ascensão ao Planalto uma oportunidade de ouro para ampliar muito o número de prefeituras em 2024 e, consequentemente, a bancada de deputados federais em 2026.
"Você gasta, eu ganho"
Quanto mais deputados, maior é o fundo Eleitoral e o Partidário. E quanto maiores essas verbas, maior é o poder do grupo de Gleisi com o partido que preside em comparação a outros partidos no país. Hoje, o partido com mais verba não é o PT, é o PL de Bolsonaro. Como diabos é possível cumprir esse roteiro com um presidente do Banco Central que não obedece ao governo e não baixa os juros para incentivar o aquecimento da economia?
Mais ainda, como fazer isso com ele o tempo todo dizendo ao mercado que não baixa a taxa porque o governo está gastando demais?
E o futuro
Para financiar os interesses de grupos políticos e as ambições privadas de agentes públicos, o país já quebrou algumas vezes. A reclamação de Gleisi é por não conseguir fazer isso outra vez, ao menos por enquanto.
Esse “por enquanto” é, aliás, o cerne do risco futuro. A questão é que Campos Neto tem mandato que dura até o fim deste ano apenas. A cobrança dele é para ampliar a autonomia do BC, hoje apenas operacional.
O orçamento da instituição ainda é definido pelo governo. É uma independência que depende de mesada, o que pode travar a atuação e, quando o presidente for indicado por Lula (e pelo PT), em 2025, colocar a economia do país à mercê de Gleisi Hoffmann.
É bom que o Congresso esteja atento a isso, ou teremos problemas no horizonte.