Cena Política

Os monstros e os abismos que explicam a polarização danosa em que vivemos

Confira a coluna Cena Política deste sábado (09)

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Igor Maciel

Publicado em 08/03/2024 às 20:00 | Atualizado em 09/03/2024 às 8:48
Análise
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As instituições brasileiras precisam refundar seus regimentos internos se quiserem sobreviver para o futuro. Mas, antes disso, essas instituições precisam fazer “terapia” e entender o que nos trouxe a um ambiente político e social de extrema polarização, afastando amigos e familiares por questões que não deveriam interferir de forma tão aguda nessas relações. “Biografia do Abismo”, de Felipe Nunes e Thomas Traumann, mais que um livro, é um roteiro essencial para essa “análise”.

Nietzsche

O abismo em questão é uma referência dos autores a uma frase de Friedrich Nietzsche: “Aquele que luta com monstros deve acautelar-se para não tornar-se também um monstro. Quando se olha muito tempo para um abismo, o abismo olha para você”.

A frase do filósofo é como uma denúncia do tempo em que vivemos e de como chegamos até aqui.

Segunda-feira

Felipe Nunes, um dos autores, falou sobre o assunto durante uma entrevista ao programa Passando a Limpo, da Rádio Jornal, na sexta-feira (8). Ele estará no Recife na próxima segunda-feira (11) para lançar a obra, num evento com a participação de Silvio Meira e Rosário Pompéia.

Responsabilidades

Nunes, que também é sócio fundador do Instituto Quaest, e Traumann, que já foi porta-voz da presidência da República e ministro da Secretaria de Comunicação, conseguiram traduzir dados levantados em pesquisa ao longo dos últimos anos em um diagnóstico preciso que demonstra competências, incompetências e a responsabilidade ativa das principais instituições do país, incluindo a imprensa.

Todos erraram muito no que nos trouxe a essa polarização e, em grande parte, todos seguem cometendo os mesmos erros, no máximo trocando de polo.

O Monstro

A leitura de “Biografia do Abismo”, com a referência aos monstros de Nietzsche, faz lembrar um conto do escritor maranhense Humberto de Campos escrito lá pelos anos 1930.

Em “O Monstro”, Campos relata a “fabricação” do homem, no sexto dia da criação, como uma obra criada pela Dor e pela Morte. A Dor teria dado a água e a Morte contribuiu com o barro. Um dia, as duas brigaram e decidiram dividir o produto. A Dor fez verter lágrimas e levou toda a água embora. A Morte pegou o barro que sobrou e também partiu. Elas assumiram suas responsabilidades e desmembraram aquele monstro.

Simplórios

Algumas instituições brasileiras, incluindo a imprensa, criaram monstros para lidar com outros monstros ao longo dos últimos anos. Transformaram figuras absolutamente comuns, e até bem simplórias, que faziam seu trabalho comum, embora importante, em “heróis da Lava Jato”, porque era necessário combater um grupo político específico.

Fabricaram, de maneira irresponsável, forças que nem essas instituições sabiam no que ia se transformar.

Apartados

Quando tudo fugiu ao controle, as mesmas instituições correram para ressuscitar o monstro anterior, antes tão desprezado.

Não é um movimento novo. O Brasil costuma fabricar heróis, caudilhos e salvadores, todos líderes populistas, porque não sabe exatamente como vender a um público de educação limitada, representantes que se destacam pela capacidade de resolver problemas, ao invés da habilidade para empolgar paixões.

Por causa disso, a terra está povoada de abismos, de monstros, disformes e apartados das necessidades da República.

Paixões

A questão é que, diferente do conto de Humberto de Campos, ao invés de assumir nossas criações e desabilitá-las, fingimos que não temos nada a ver com aquilo, enquanto nos empenhamos em novas fabricações que consertem as anteriores.

Vendemos novas paixões todos os dias e não sabemos como oferecer razão aos brasileiros. A Dor e a Morte foram muito mais responsáveis do que têm sido as instituições brasileiras.

O livro de Felipe Nunes e Thomas Traumann será lançado na Livraria Jaqueira do Paço Alfândega, segunda-feira (11), às 17h.

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