Faz alguns dias que uma charge sobre a eleição americana chamou a atenção pelo inusitado entre os candidatos. No desenho, perfilados num palanque, estavam Joe Biden sentando em uma cadeira de rodas com uma enfermeira segurando um tubo de soro, e Donald Trump, vestido com um uniforme laranja de presidiário e arrastando uma bola de ferro.
Acima deles, uma faixa com os dizeres: “debate para escolher o ocupante do cargo mais importante do planeta”.
Capacidade
A charge é uma caricatura da realidade americana. Biden, por exemplo, não é retratado como alguém fragilizado apenas por causa da idade que tem (81 anos), mas por não conseguir transmitir aos eleitores a energia necessária para enfrentar a dureza de comandar o país mais poderoso do planeta, numa época de conflitos bélicos que desafiam a liderança americana.
A maneira como um governante é visto pelo seu povo depende da capacidade que ele demonstra para enfrentar os problemas daquele tempo histórico.
Discurso…
Lula (PT), por exemplo, é mais novo do que Biden, está agora com 78 anos, e os eleitores não conseguem enxergá-lo como alguém que consegue conduzir o país para os desafios do futuro. Ele e a equipe entendem pouco de tecnologia, vivem com a cabeça em lutas sindicais que, em sua maioria, perderam sentido prático, discursam dentro de um maniqueísmo “pobres x ricos” que não se encaixa mais no ambiente mental brasileiro.
…antigo
A luta de classes enfraqueceu quando as classes entenderam que são interdependentes. Só há emprego com empregador, só há produção com empregados. E o PT não consegue entender isso, entre outros motivos, porque não renovou seus quadros.
Um exemplo é a bancada federal petista, hoje com 68 deputados. O partido é o que tem a maior média de idade entre todas as siglas com parlamentares eleitos: 55.7 anos.
Velho e novos
A média de idade dos parlamentares do União Brasil, por exemplo, é de 47.6 anos. No Podemos, a média é de 45.2 anos, quase 10 a menos que no PT.
Entre as bancadas com a maior média de idade, os petistas são seguidos pelo PDT (54.5 anos), pelo PSDB (53.3 anos) e pelo PSB (51.1 anos).
Encolhendo
Esses três últimos partidos têm em comum um enfraquecimento de sua representatividade, todos encolheram expressivamente na última eleição. O PSDB perdeu 16 cadeiras em 2022, o PSB perdeu 18 cadeiras e o PDT perdeu 11 representantes.
O PT foi o único que cresceu, embalado na polarização com Bolsonaro, conseguiu 12 cadeiras a mais.
Mas em comparação com o partido do principal adversário, o PL, que tem uma média de idade mais baixa (49.5), a diferença é imensa. A sigla bolsonarista aproveitou muito mais a polarização e aumentou em 66 cadeiras sua participação na Câmara.
Crise nova…
O problema é a idade? Não mesmo. O problema é envelhecer mal. Se ter mais jovens no partido fosse sinônimo de sucesso, o Podemos e o PSOL (47.2 anos) seriam os maiores e mais representativos partidos do país. E não são.
O problema é não ter capacidade e humildade para se atualizar e encarar novos desafios com novas ideias, ao invés de recauchutar as antigas. É o caso do PT, do PDT, do PSB e do PSDB, com raras exceções.
…solução antiga
Um exemplo prático: quando os petistas olham para a crise e defendem que precisam gastar mais dinheiro público para aquecer a economia, estão usando uma receita dos anos 1980 e 1990, para um problema de 2024. Isso piora a situação e já vivemos o resultado nefasto disso em crises anteriores. Mas é como se este governo não soubesse como fazer diferente.
Mesclando
Qual a receita, então? Quando os mais velhos convivem com os mais novos em harmonia, no mesmo ambiente, é onde se encontra mais sucesso.
A experiência ensina e a juventude atualiza. Renovar aos poucos é uma solução. Mas nunca se permitiu que isso acontecesse no PT. Renovar era correr o risco de perder poder interno.
O medo de dividir os palanques criou grupos políticos cheios de limitações e eles, hoje, limitados, estão comandando o país.
No meio
O levantamento feito com os partidos brasileiros e a idade dos parlamentares dá uma dica dessa estratégia de ter os mais velhos convivendo com novas lideranças no PSD. O partido tem média de idade de 50 anos. É o meio do caminho entre os mais velhos do PT, com média de quase 56 anos, e os mais novos do Podemos, com média de 45 anos.
Quem mais tem acertado nessa mescla entre tradição e inovação é o partido de Gilberto Kassab.
Ampliou
O PSD ganhou oito cadeiras na Câmara em 2022 e este ano ultrapassou o MDB se tornando o partido com o maior número de prefeituras do país.
É um partido bem ramificado, diverso, com pautas que passam pela preocupação social sem abrir mão da estabilidade econômica.
O PSD tem gente que se encaixaria facilmente no PT com suas pautas históricas e tem gente que estaria facilmente no PSDB com suas bandeiras históricas de estabilidade econômica.
Se essa gente não está lá é porque essas siglas envelheceram mal e não aceitam novidades.
Quem manda
O problema, é bom entender, não é a idade física, mas a ausência na renovação das ideias. E a troca prevista na presidência do PT serve como reflexão. Gleisi Hoffmann (PT) deve sair no fim do ano e o preferido de Lula para o posto é Edinho Silva (PT), atual prefeito de Araraquara.
Ambos são novos, têm 58 anos, a mesma idade. Mas Gleisi é vista como um dinossauro ideológico e Edinho é adorado por empresários e agentes do mercado financeiro por causa da capacidade de articulação e das posições de equilíbrio fiscal mais próximas, inclusive, às do ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT).
Para o governo
Você pode pensar que com Gleisi saindo da presidência o governo Lula poderá finalmente se renovar. Entretanto, a dificuldade é muito mais profunda.
O governo não consegue se livrar fácil dos petistas de pensamento mal envelhecido. Já é certo que Gleisi, por exemplo, deixando a presidência do PT, vira ministra. E o Brasil que aguente.