Lula e o problema da contaminação das verdades na ONU
Querendo uma cadeira no Conselho de Segurança, o Brasil perde 60% dos votos por culpa de Lula e outros 40% porque ele não será presidente para sempre.
O presidente Lula (PT) está certo. Esta é uma frase cada vez mais rara e que não tem sido muito repetida. Mas Lula está certo dessa vez quando diz que a Organização das Nações Unidas precisa de modificações severas. Quando diz que falta ousadia à ONU e que ela não tem voz porque lhe falta representatividade.
Ao participar da Cúpula do Futuro, nos EUA, o assunto do dia seguinte foi o microfone do presidente do Brasil ter sido cortado porque ele excedeu o tempo de fala. A polarização política provoca reducionismos injustos e limita o debate do que importa. O microfone ter sido cortado com a imposição de um limite de 5 minutos para cada discurso diz mais sobre a indisponibilidade da ONU que não parece querer discutir o seu próprio futuro do que sobre o presidente brasileiro.
É verdade que ele foi mal assessorado, deveria ter tido o discurso adaptado para o tempo, mas se a paciência das Nações Unidas com seu próprio horizonte de percurso anda tão curta, melhor não esperar que o destino seja grande coisa.
Contaminadas
Lula tem os motivos dele quando diz que a ONU precisa ter maior representação em seu Conselho de Segurança. Está correto nisso.
Como também está correto ao dizer que existe pouco dinheiro disponível para cuidar do meio ambiente e quando reclama da falta de influência do grupo. O discurso é irrepreensível
O problema, na Cúpula do Futuro da ONU e na Assembleia Geral, não é o que Lula fala, mas o que ele passou a representar para os países desenvolvidos. Todas as verdades de Lula estão contaminadas pelos posicionamentos equivocados do presidente nos últimos 21 meses em relação às guerras que ocorrem no mundo e às ditaduras “amigas” como a da Nicarágua e a da Venezuela.
Nicarágua
Somente nos últimos meses Lula se afastou de Daniel Ortega, ditador nicaraguense. E isso só aconteceu porque o ex-amigo resolveu brigar com a igreja Católica. Entre o Papa e a fraternidade de esquerda, Lula preferiu o homem do Vaticano.
Tudo bem, mas isso só aconteceu após anos fingindo surpresa para toda atrocidade ocorrida na Nicarágua e o discurso de que não podia opinar sobre outro país para “não ferir a autodeterminação dos povos”.
A autodeterminação dos povos foi, nos últimos anos, a expressão que aprendeu com o amigo Celso Amorim quando precisava relativizar os crimes dos amigos.
Venezuela
No caso da Venezuela, o presidente brasileiro parece um ex-namorado traído, maltratado, abandonado que, de tão apaixonado, recusa-se a acreditar na realidade.
Nicolás Maduro o fez de bobo internacionalmente, deixou que Lula empenhasse sua palavra para sustentar que o ditador estava disposto a fazer uma eleição limpa.
No fim, o venezuelano matou manifestantes, prendeu opositores, o adversário vencedor da eleição está exilado. Mas Lula ainda não reconheceu que o vizinho é uma ditadura.
Ucrânia e Israel
Com toda a comunidade internacional do ocidente apoiando a Ucrânia, invadida em seu território pela Rússia, Lula chegou a dizer que “quando um não quer, dois não brigam”, ignorando o fato de que Putin invadiu à força e tomou territórios de um país reconhecido e livre. Nessas horas, ele nem se lembra da história de “autodeterminação dos povos”, note-se.
Para completar, Lula fez declarações sobre Israel nos últimos tempos que se aproximam muito mais do entendimento de países como Síria e Iran do que de EUA, Reino Unido e França, por exemplo.
Risco
Agora, quando o presidente brasileiro diz que está tudo errado na ONU (verdade) e que falta um país do “Sul Global” no Conselho de Segurança (verdade), imagine como essa mensagem chega para os países mais influentes na ONU (EUA, Reino Unido e França).
Eles vão dar ao Brasil de Lula, aquele que está sempre na contramão do ocidente, uma cadeira com a mesma influência que a deles?
Rússia e China
Alguns podem lembrar que no Conselho de Segurança, Rússia e China também têm assentos permanentes. Lula agradou a Rússia no contexto da Ucrânia e sempre fez de tudo para agradar a China. Mesmo assim eles não moveram uma palha para fazer campanha pelo Brasil no grupo. O motivo?
Um assento permanente significa que não importa quem seja o presidente no futuro, o Brasil sempre terá poder de veto. Tanto a Rússia quanto a China acreditam que o Brasil tende a ser mais influenciado pelo ocidente do que por eles no futuro. Basta mudar o presidente para um mais alinhado com os EUA e a desvantagem deles em relação às outras potências ficará ainda pior.
Porque arriscar dando essa força ao Brasil?
Zero votos
Nessa briga por uma cadeira no Conselho de Segurança da ONU, 60% dos países rejeitam a iniciativa porque o Brasil está sendo governado por Lula. Já os outros 40% rejeitam porque o Brasil, no futuro, não será mais governado por Lula e eles não tem certeza se será alguém alinhado com eles.
Dos cinco países membros permanentes, EUA, França, Reino Unido, Rússia e China, a contagem de votos para o Brasil, por muito tempo ainda, será zero.