A torneira fechada para Gilson e a falta que faz mandar no partido
Verbas para a campanha do candidato bolsonarista no Recife foram cortadas e presidente nacional do partido reclamou que ele "não tem postura"
“No meio do caminho tinha um partido. Tinha um partido no meio do caminho”. É o que diria o candidato a prefeito do Recife Gilson Machado (PL) caso levasse jeito para ser um Carlos Drummond de Andrade.
Muitos dos problemas bolsonaristas estariam resolvidos se o grupo tivesse conseguido criar um partido político. O sonho de uma noite de verão bolsonarista teve fim em 2021, quando o ainda presidente Jair Bolsonaro mandou desmobilizar a busca por assinaturas e interrompeu a criação do “Aliança pelo Brasil”.
Anunciado com pompa ainda no primeiro ano de governo, o quase partido teve fim melancólico.
Atropelando
Bolsonaro sempre teve problemas com os partidos em que esteve ou os partidos tiveram problemas com ele. Foram nove no total.
Nos últimos anos, seus apoiadores mais próximos acabaram arrastados por essa dificuldade de se enquadrar nas ordens, nas regras internas e até na necessidade de bom convívio entre correligionários.
Uma fonte da coluna, em reserva, diz que os bolsonaristas “costumam se dar uma importância maior do que realmente têm e querem atropelar processos e vinculações partidárias históricas por simples desejo de poder”.
Gilson
Ao menos pelas declarações fortes do presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, sobre Gilson Machado, entendeu-se que algo assim está acontecendo por aqui.
Tudo o que foi exposto por Valdemar, detalhado em reportagem de Rodrigo Fernandes neste mesmo JC, já era comentado nos bastidores e é base de uma crise entre os Ferreira, do ex-prefeito de Jaboatão Anderson Ferreira (PL), do irmão, o deputado federal André Ferreira (PL), e do vereador Fred Ferreira (PL).
Traição
Depois que Gilson foi escolhido como postulante à prefeitura, o partido atraiu vereadores com mandato e buscou nomes que reforçassem o grupo na Câmara.
Alguns desses nomes se sentiram enganados no fim do processo, porque não foram avisados de que Gilson colocaria o próprio filho como candidato à Casa de José Mariano. Esse ponto foi a principal divergência interna do PL, rachado na eleição.
Longe, longe
Diferente da campanha de 2022, quando Anderson disputou o Governo do Estado e Gilson era candidato a senador, não há mais qualquer proximidade aparente entre os dois. Anderson é o presidente estadual do PL, mas a última vez em que postou uma foto junto com Gilson foi no dia 4 de agosto, na convenção do partido no Recife. E nunca mais.
Desde então outros sinais deixam o afastamento claro. Anderson não acompanha o candidato no Recife em nenhum compromisso, Fred Ferreira pede votos para a reeleição à Câmara da Capital sem indicar qualquer candidato a prefeito e, o sinal mais contundente, as torneiras financeiras foram fechadas.
Verba
Foram repassados para a campanha de Gilson Machado R$ 6 milhões, quando era esperada a chegada de R$ 9,7 milhões (limite desta eleição). Até então acreditava-se que era apenas uma questão de fluxo financeiro. Valdemar deixou claro que não: cortou de propósito.
E o mais impressionante é não ter tido qualquer pudor em expor, bem no meio da campanha, sua decisão que fere gravemente as chances do candidato. Mostra que a paciência excedeu o limite faz tempo.
Revolta
"Há um sentimento de revolta por estar beneficiando o próprio filho. Eu faço papel de bombeiro para tentar acalmar os ânimos, mas a postura de Gilson não tem sido a de um candidato para a prefeitura", disparou Valdemar.
Ele foi além do verbo e atuou na distribuição das verbas. O filho de Gilson não recebeu nem um centavo do partido para a campanha. Na reportagem, Rodrigo Fernandes detalhou que Gilson Filho acumula R$ 68 mil em receitas para o pleito, sendo R$ 43 mil de recursos próprios e R$ 25 doados pelo pai.
Confiança
A dificuldade decorre, óbvio, de os bolsonaristas não terem um partido e não serem donos do dinheiro. Quem não assina o cheque não determina seu destino.
Mas vem também da relação de proximidade que existe entre Anderson Ferreira e Valdemar. O presidente estadual e o nacional confiam muito um no outro. Em disputas anteriores pelo partido no estado, Valdemar sempre deu garantias para a tranquilidade dos Ferreira. Inclusive, quando Bolsonaro entrou no partido e exigiu o controle de diretórios estaduais, Valdemar resistiu e apoiou Anderson. Nada leva a crer que seria diferente agora.
O recado também importante é o de que, mesmo um pouco afastado dos holofotes estaduais depois de ter perdido a eleição para o governo em 2022, Anderson segue prestigiado nacionalmente no partido e segue sendo uma força política importante por aqui.