Famílias contratam professor particular para reforçar ensino remoto

Com suspensão das aulas presenciais devido à covid-19, pais optam por contratar professor para dar aula em suas casas como uma das medidas para melhorar o aprendizado dos filhos
Margarida Azevedo
Publicado em 06/09/2020 às 10:06
A professora Natália dá aula de reforço a quatro alunos. Uma criança é atendida individualmente e os outros três em grupo Foto: YACY RIBEIRO/ JC IMAGEM


Em meio à incerteza de quando haverá o retorno das aulas presenciais nas escolas de educação básica por causa da pandemia de covid-19, famílias estão contratando professores particulares para reforçarem o ensino de seus filhos, sobretudo para alunos que estão na alfabetização ou nas séries iniciais do ensino fundamental. Uma das justificativas é a dificuldade dos estudantes em aprenderem o conteúdo no formato remoto. Outros motivos são a falta de tempo dos pais para acompanhar as atividades escolares, já que muitos acabaram o home office e voltaram a atuar em seus locais de trabalho; ou o despreparo, no sentido pedagógico, para ensinar à prole.

Em Pernambuco, as aulas nas unidades de ensino estão suspensas há quase seis meses, desde 18 de março, e permanecerão assim até pelo menos a próxima semana, quando expira, dia 15, decreto estadual que proíbe atividades presenciais nesses estabelecimentos. Na última quinta-feira (03), donos de escolas privadas realizaram um ato cobrando do governo estadual um cronograma para reabertura dos colégios.

A fisioterapeuta Daniele Vanusca, 42 anos, colocou a filha caçula, Giovana, 6 anos, do 1º ano do ensino fundamental do Colégio Marista São Luís, para ter aula particular há um mês. Duas vezes por semana, a menina vai até a casa da professora Natália Nascimento, no bairro do Arruda, Zona Norte do Recife.

“Não parei de trabalhar na pandemia. O que me preocupa é por ser o ano de alfabetização de Giovana. Notei colegas dela lendo e ela não. A professora da escola conversou comigo e sugeriu que ela tivesse o acompanhamento de um profissional”, conta Daniele. “Minha filha está cansada da rotina de aulas online. Depois do reforço, percebo que melhorou o aprendizado. Mas às vezes reclama porque tem aula de manhã com a professora particular e à tarde pelo colégio”, diz Daniele.

Natália leciona no Colégio Triunfo, no Arruda, nos dois turnos. É no intervalo entre as atividades remotas que dá aula presencial para quatro alunos. Giovana tem reforço individual. À tarde, na sala de casa, a professora recebe mais três crianças, alunos da mesma escola dela.

“Comecei por sugestão da diretora, que me indicou para uma mãe. Outros pais me procuraram e aceitei. Uso máscara, os alunos também. Mantenho álcool em gel na mesa, tenho o cuidado de limpar a casa antes de eles chegarem e ao saírem. É muito desafiador, por mais dedicação nossa, fazer com que os alunos se concentrem na aula pelo computador”, comenta Natália.

“No início da pandemia pensei em contratar um professor particular para minha filha Júlia, porém tive medo de contaminação. Como estava em home office, conseguia dar assistência a ela. Mas em junho voltei ao trabalho presencial. Só quando chegava à noite é que ela fazia as tarefas comigo. Muitas vezes estávamos cansadas, era bem desgastante”, lembra a auxiliar de faturamento Josenir Pereira, 36.

Natália já tinha sido professora de Júlia na escola. Atualmente a garota está no 2º ano. “Fui na casa da professora, vi o cuidado dela e achei seguro mandar minha filha. Estou bem satisfeita com o rendimento dela.”

LISTA DE ESPERA

A professora Luciana Balzana, 44, está com lista de espera de alunos. Hoje ela acompanha dez crianças de seis colégios. Em seis, ela vai até a residência dos alunos. Quatro chegam a sua casa, em Boa Viagem, Zona Sul do Recife. Luciana atuava como apoio pedagógico em uma escola. Tinha dois contratos. Com a pandemia, foi desligada de um e o outro está suspenso.

“Aproveitei o dinheiro que recebi de indenização e transformei um dos quartos da minha casa em sala de aula. Comprei jogos, material pedagógico. Não atendo mais alunos porque não tenho tempo. Estou com a carga horária toda preenchida, de segunda a sexta-feira, começando às 8h e acabando às 17h”, diz Luciana. O rendimento financeiro, afirma, está maior agora.

Os irmãos Gabriel, 11, do 5º ano, e Henrique Pontual, 9, do 4º ano, da Escola Encontro, são alunos de Luciana. “Gabriel já tinha aula particular antes da pandemia, pois precisa de atividades diferenciadas. A escola supria um pouco essa necessidade. Mas com o ensino remoto não está funcionando, ele não consegue acompanhar pelo computador”, explica a médica Maritza Pontual, 43, mãe dos garotos.  “Luciana é professora, sabe como ensinar, o melhor jeito de fazê-los aprender. Além de eu não ter tanto tempo para apoiá-los nas tarefas da escola, por causa do meu trabalho”, afirma.

CONSULTA ÀS ESCOLAS

Antes de decidir pela contratação de um professor particular, é importante que a família converse com a equipe pedagógica da escola onde a criança ou o adolescente estuda. Porque o acréscimo de atividades, em vez de contribuir para o desempenho, pode repercutir negativamente no aprendizado. Também porque nem sempre a percepção dos pais em relação à absorção do conteúdo pelo estudante é a mesma do colégio.

“É uma questão muito delicada e depende de cada caso. Há aluno que realmente necessita de companhamento. Nesse momento atípico que estamos vivendo da pandemia, é preciso ter um olhar ainda mais sensível da escola e das famílias. Haver o cuidado para não sobrecarregar, para que mais aulas não criem um bloqueio. Em vez de contribuir para o aprendizado, podem esgotar o estudante”, diz a psicopedagoga Judith Menezes. “É a hora da parceria entre família e escola ser mais forte, mais verdadeira”, enfatiza.

Para a neuropsicóloga Noemi Gonçalves, o apoio pedagógico deve acontecer se o estudante está com dificuldade e não pode contar com o suporte da família. “Para que haja uma evolução positiva, é fundamental entender o que está acontecendo com esse aluno. Cada pessoa aprende de um jeito, algumas mais rapidamente que outras ou usando mecanismos diferentes. No ensino presencial é mais fácil o professor perceber que no ensino pelas telas”, observa Noemi, que também é psicopedagoga. “Uma avaliação psicopedagógica pode ajudar nesse processo”, afirma.

“Com minha filha o ensino remoto tem sido surpreendentemente maravilhoso. No começo fiquei apreensiva, mas vejo que está dando certo. É um conjunto. A escola oferece uma boa plataforma e bons professores, ela se dedica e nós da família estamos dando suporte, em constante supervisão e apoio”, diz a servidora pública Emanuelle Monteiro, 39 anos, mãe de Manuella Monteiro, 11, aluna do 6º ano do Colégio GGE. Alunos com dificuldade contam com docentes de todas as disciplinas, no contraturno, para tirar dúvidas remotamente.

 

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