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Enem e Educação

Por Mirella Araújo e equipe
EQUIDADE RACIAL

Plano Nacional de Educação traz metas para a população negra, mas formação docente ainda é insuficiente

Questões étnico-raciais é o segundo assunto menos frequente dentre os 14 temas explorados durante as capacitações com os profissionais de educação

Cadastrado por

Mirella Araújo

Publicado em 27/08/2024 às 13:57
Sonia Dias, gerente de Desenvolvimento e Soluções do Itaú Social - Agência Ophelia / Itaú Social

A escola não pode ser considerada um ambiente isolado quando se trata do reconhecimento e valorização da temática étnico-racial para a construção de uma sociedade menos desigual. Nesse contexto, vale destacar que o futuro Plano Nacional de Educação (PNE), em discussão no Congresso Nacional, inclui propostas para reduzir desigualdades raciais e de gênero em seus 18 objetivos. Além disso, o documento prevê a ampliação da oferta de educação quilombola e indígena de qualidade.

Embora haja um foco em promover a equidade étnico-racial na aprendizagem, esse tema é o segundo menos abordado nas formações de docentes, gestores, diretores e coordenadores escolares. Apenas 7,9% das secretarias de Educação discutem regularmente questões étnico-raciais em suas capacitações para professores: 2,5% a cada 15 dias e 5,4% uma vez por mês.

Esses dados foram obtidos na pesquisa “Percepções e Desafios dos Anos Finais do Ensino Fundamental nas redes municipais de ensino”, conduzida pelo Itaú Social e pela Undime (União dos Dirigentes Municipais de Educação).

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Segundo o estudo, o tema foi abordado apenas uma vez na formação para professores dos Anos Finais do Ensino Fundamental (6º ao 9º ano) em 32,8% das redes de ensino, sendo que 19,8% sequer tocaram no assunto ao longo do ano.

A pesquisa foi realizada de 18 de maio a 26 de junho, com a participação de 3.329 redes municipais de ensino, representando 60% de todas as redes do país. As regiões do Nordeste, Norte e Centro-Oeste foram as mais engajadas nas respostas.

Apesar de a Lei 10.639/03, que torna obrigatório o ensino de história afro-brasileira nas escolas, ter mais de duas décadas, ainda é notório o desafio de preencher o calendário escolar com conteúdos que tratem da cultura afro-brasileira e que não fiquem restritos a datas simbólicas.

“Esse é um dado que nos preocupa, mas ao mesmo tempo reforça uma percepção que temos e que outras pesquisas já mostraram, de que também há um baixo número de municípios que implementaram a Lei 10.639/03”, pontuou a gerente de Desenvolvimento e Soluções do Itaú Social, Sonia Dias, em entrevista à coluna Enem e Educação.

“Os professores precisam estar apropriados da temática e ter um olhar sobre ela, independentemente das suas disciplinas, seja Língua Portuguesa, Ciências, Geografia, etc. A temática étnico-racial precisa estar presente na escola assim como está presente em nossa sociedade, através de conteúdos, atividades e valorização das contribuições das populações afro-brasileira e indígena”, destacou a gerente.

Ainda de acordo com a pesquisa, os três temas mais constantes nas capacitações dos profissionais de educação são: apresentações de formas lúdicas, críticas e participativas de aprendizagem dos estudantes (30,4%, duas vezes por mês); levantamento de conteúdos específicos das áreas e componentes curriculares (28,4%); e dicas sobre o uso de metodologias que promovam a aprendizagem autônoma e participativa (23,9%).

PRINCIPAIS OBSTÁCULOS

Entre os obstáculos apresentados pelas secretarias de educação e pelas equipes das escolas estão a dificuldade de encontrar formadores capacitados para abordar a temática étnico-racial na formação dos professores e a falta de repertório para tratar do assunto. “Muitas vezes esses são os argumentos que ouvimos. Mas, embora eles possam ser encontrados no dia a dia, cabe às secretarias, aos professores e às próprias escolas tomar a iniciativa de buscar esse tipo de formação”, declarou Sonia Dias.

Para a historiadora, doutora em Sociologia e diretora de projetos da ONG TPM Todas para o Mar, Alyne Nunes, outro obstáculo pode ser atribuído a uma certa resistência em compreender as dinâmicas do racismo.

"Eu vejo que, embora a produção acadêmica tenha avançado bastante, a tradução, a adaptabilidade e a discussão do tema ainda precisam ser mais acessíveis para a formação. Ninguém tem tempo de se especializar, fazer um mestrado ou doutorado, a menos que tenha interesse específico", disse a docente em entrevista à coluna Enem e Educação.

"Então, para chegar a esses professores, a temática precisa estar já bem construída. Apesar de existir material interessante em circulação, ainda há um racismo inconsciente e coletivo que vê a temática como algo folclórico, restrito a datas específicas", completou Alyne.

IMPACTOS A PARTIR DA FORMAÇÃO

Ainda segundo a historiadora Alyne Nunes, trazer as questões étnico-raciais para a formação contínua dos professores poderia proporcionar uma nova perspectiva de vida para a juventude. Isso significa abrir espaço para que crianças e adolescentes negros compreendam sua identidade a partir das diversas possibilidades, já que o professor, por meio da sua formação, pode promover uma mudança profunda em sala de aula.

“É no ambiente escolar que eles começam a se reconhecer como pertencentes a uma sociedade em busca de direitos e dignidade. Acredito que trabalhar a temática étnico-racial traz um impacto significativo, ajudando os alunos a se reconhecerem e se empoderarem”, defendeu Alyne.

Quando se fala em formação, também é importante garantir que os conteúdos das atividades e materiais pedagógicos não fiquem restritos a datas específicas, que são importantes, mas também são fruto de uma luta coletiva.

“Restringir a abordagem desse tema em sala de aula a uma data específica é perder a oportunidade de tratar problemas sociais ao longo do ano todo. É fundamental que os professores recebam apoio e orientação na hora de planejar as atividades dos estudantes”, destacou Sonia Dias, gerente de Desenvolvimento e Soluções do Itaú Social.

 

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