Empresas não conseguem acessar crédito, e pessoa física só refinanciamento

A pouca atividade de crédito das empresas com os bancos está sendo determinante agora na hora da crise. Na prática, a empresa brasileira não toma crédito e na crise do coronavírus isso está impedindo ajuda efetiva
Fernando Castilho
Publicado em 27/03/2020 às 10:20
A preocupação do governo é que quem tenha muitos recursos no FGTS faça o saque para migrar o dinheiro para uma aplicação mais rentável Foto: Foto: ABr


Por Fernando Castilho do JC Negócios

No final da tarde desta quinta-feira, um empresário pernambucano ligou para seu gerente perguntando se a promessa de ajuda de crédito estava aprovada. Do outro lado da linha, o gerente disse que estava com a proposta na mesa, mas faltavam as certidões de regularidade na Fazenda Nacional e Estadual. O cliente interrompeu de forma dura: "amigo, se eu tivesse as certidões eu não precisava ligar para você! O banco já teria pré-aprovado o empréstimo no internet banking. Eu só liguei para você porque não tenho, e a sua publicidade diz que quer me ajudar.

O exemplo mostra bem a dura realidade entre a grande empresa listada na bolsa, que tem em média R$ 2,50 no caixa para cada R$ 1,00 de despesas fixas nos próximos seis meses e aplicadora no mercado financeiro, e a pequena e média empresa.

Na prática, os bancos estão aplicando a mesma estratégia que usaram quando o Banco Central proibiu o segundo pagamento mínimo do cartão de crédito e estouro de 15% no cheque especial. Um financiamento com taxas iguais as que já praticava e que, na prática, corta o crédito do cliente, pois com o financiamento os limites do cliente estouram. Dito de outra forma: o banco se garante com um contrato novo e não raro com juros maiores e o cliente ganha apenas uma prestação fixa.

A falsa publicidade dos bancos as vezes cria situação curiosas onde o empresário tem o crédito negado no internet banking na mesma página em que o banco exibe uma publicidade que promete ajuda.

O Brasil, que tem saldos nos bancos de R$ 3,4 trilhões, só consegue emprestar R$ 18,3 bilhões por mês como se viu em fevereiro.

Essa indefinição é o que está levando a milhares de empresas a resolver sozinhas sua situação, optando pela demissão pura e simples. Na prática, é melhor pagar a indenização, liderar o FGTS e garantir o acesso ao seguro desemprego colocando dinheiro na mão do trabalhador.

Mesmo a proposta de férias tem resistência dos empresários, pois com a falta de perspectivas nos próximos seis meses, o empregador sabe que mais tarde terá que lhe demitir. Na prática, essa solução tem sido adotada apenas para os empregados que a empresa investiu na qualificação e deseja contar com eles na retomada das atividades.

Mas a grande dificuldade é com as empresas de serviços cuja única garantia é seu faturamento. E isso os bancos pressionados pela alta demanda não estão atendendo.

Um caso bem ilustrativo são as empresas de tecnologia da informação cuja entidade, a Assespro Nacional, presidida pelo pernambucano Itálo Nogueira, pediu apoio às medidas de crédito com a simplificação das exigências para contratação de crédito e dispensa de documentação (CND) para renegociação de crédito; e a suspensão de atos de cobrança e facilitação da renegociação de dívidas em decorrência da pandemia.

A Assempro Nacional pede ajuda para uma ação para manutenção dos empregos, onde o governo federal usaria a RAIS para pagar até R$ 2500,00 por empregado por mês, por três meses, com o compromisso das empresas de manter os empregos nesse período. Até agora não houve qualquer resposta.

O problema é que, no Brasil, o volume de operações de crédito da pessoa física é maior que as feitas à pessoa jurídica. Em fevereiro, passado as empresas brasileiras tomaram R$ 140 bilhões quando a pessoa física R$ 167 bilhões.

Os bancos ganham mais com o cliente pessoa física, que quase já não tem qualquer contato com os funcionários das agências. Hoje o saldo de empréstimos dos bancos a pessoa física soma R$ 529 bilhões quando o saldo das empresas (recursos livres) é de R$ 891 bilhões. Ou seja, as empresas vêm tomando muito pouco dinheiro aos bancos.

Essa pouca atividade de crédito é o que está sendo determinante agora na hora da crise. Na prática, a empresa brasileira não toma crédito e na crise do coronavírus esse relacionamento baixo está mostrando a dificuldade.

E isso acaba beneficiando as grandes empresas. Um levantamento feito pelo jornal Valor reunindo dados de 97 empresas não financeiras que fazem parte do Ibovespa e do índice Small Caps e que já divulgaram seus balanços de 2019. Todas elas estão com caixa para aguentar a crise independo de bancos.

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