O ex-presidente Michel Temer foi absolvido no caso das gravações feitas pelo presidente do Grupo J&F, Joesley Batista. A Terceira Turma do TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região, formou maioria e há a possibilidade de Temer ser absolvido por unanimidade das acusações de obstrução de justiça feita pelo MPF.
É um fato importante e, se confirmado, representa um duro golpe na atuação do Ministério Publico Federal, especialmente pela atuação do Procurador Geral da República, Rodrigo Janot que fez a denúncia rejeitada na primeira instância e agora novamente rejeitada da segunda. Em outubro de 2019, o juiz federal Marcus Vinícius Reis Bastos, da 12ª Vara Federal Criminal do Distrito Federal, absolveu Temer no caso.
E porque abre um debate perturbador nas relações da Imprensa com órgãos de controle cuja credibilidade tornou-se ferramenta de trabalho dos jornalistas que passaram a atribuir ao MP uma confiabilidade não rara maior que a voz do juiz da causa.
O caso, como se sabe, se refere a divulgação pelo PGR de uma gravação feita de forma clandestina pelo então presidente do Grupo JBS, o maior produtor de proteína animal do mundo, na granja do Torto onde morava o então presidente Michel Temer.
Joesley Batista foi recebido por Temer pouco antes da meia noite e gravou uma conversa onde supostamente prestava conta de suas ligações com o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, então preso na Penitenciaria da Papuda em Brasília.
A divulgação no dia 17 de maio de 2017 da existência da gravação pelo jornalista Lauro Jardim, de O Globo, provocou um impacto colossal na imagem do governo Temer que desde aquela momento não se recuperou.
Naquele dia, o presidente catatônico repetia que não se lembrava de detalhes da conversa que tivera com Joesley Batista em março.
Mas a Procuradoria-Geral da República afirmava que, num encontro gravado, Temer havia autorizado a compra do silêncio de potenciais delatores.
Temer, depois de desgaste no Congresso, precisou negociar a suspensão da investigação na casa pagando caro a manutenção no cargo embora o seu governo tenha acabado naquele dia.
A absolvição agora, 1.095 dias depois, põe em xeque, primeiro, a atuação do PGR numa ação que agora pode revelar-se imprópria. Mas também da Imprensa que deu credibilidade total à denúncia passando a questionar a atuação do presidente e suas ligações com personagens da República.
A denúncia contra Michel Temer porém passou das questões midiáticas. Ela resvalou para a questão econômica e mudou o rumo da economia brasileira a partir daquele momento.
Não foi apenas a Bolsa de Valores que perdeu pontos naquela fatídica quarta-feira de maio de 2017, mas a própria trajetória dos juros futuro pago pelo governo e mudou a percepção do mercado sobre a viabilidade do governo Temer.
Sem credibilidade, Temer passou a cuidar da sobrevivência política do cargo para não sofrer, também, um impeachment como sua antecessora Dilma Rousseff. Salvou-se, mas eu governo acabou. E o Brasil que tinha virado centro das atenções do mundo econômico de novo virou um pato manco.
A divulgação da gravação de Batista entrou para a história comum determinante nos rumos da economia brasileira pelo potencial destrutivo das expectativas de um país que acabara de sair do trauma de um segundo processo de afastamento do presidente.
Para se ter uma ideia no que isso representou basta dizer que os contratos de juros futuros com vencimento em janeiro de 2018 disparavam 82 pontos-base, a 9,17%, e os com vencimento em janeiro de 2021 avançavam 132 pontos, no limite de alta estabelecido pela Bolsa de Valores do Brasil. Os contratos de dólar futuro com vencimento em junho deste ano subiam 5,63%.
E acabou nos levando a polarização do embate Lula (então preso) x Bolsonaro que elegeu o ex-capitão do Exército.
Mas revela o papel de Rodrigo Janot como agente de uma denúncia que se mostrou inconsistente. E como ele usou sua influência junto à mídia para atuar numa causa que desde o começo era contestada por vários personagens pelas condições que foi feita, aceita e transformada numa ação que agora se revelou insustentável.
E abre o debate sobre como a Imprensa precisa ser ainda mais cuidadosa nas suas apurações e cerca-se de mais elementos na hora de suas revelações. Isso não quer dizer que a Imprensa, tão atacada pelo presidente Jair Bolsonaro e seus assessores, tenha errado e por isso agora também condenada junto com o MPF.
Mas impõe novos procedimentos e cuidados para evitar correr o risco de colocar o promotor público no lugar do juiz na hora que faz a divulgação.
Dado as condições e a tensão que o país vivia com uma sucessão de denuncias de corrupção, certamente, essa apuração estava mais difícil e o espetacular impacto da revelação de um presidente em conluio com o empresário corrupto não tinha como na ser divulgado como foi.
Mas revela que também pode ser usada como parece apontar o curso da ação na segunda instância desconsiderando uma investigação que mudou o rumo do governo, mas a trajetória da economia brasileira e impactou nas eleições dois anos depois.