Avenida Conde da Boa Vista e a demagogia dos candidatos
Publicado em 01/10/2016 às 18:00
A acomodação dos BRTs é um dos principais problemas atuais da Avenida Conde da Boa Vista. Fotos: JC Imagem
Vamos direto ao assunto: é pura demagogia o que os candidatos a prefeito têm feito com a Avenida Conde da Boa Vista nas últimas semanas na disputa pelas eleições. Estão sendo demagogos ao pé da letra. Fazem promessas de mudar o corredor, transformando-o completamente. Ora num boulevard, onde os pedestres estarão em primeiro plano, ora num excelente corredor de transporte com todo tipo de acessibilidade e harmonia entre as centenas de linhas de ônibus que passam pela via. Mas o fazem sem qualquer embasamento técnico. Apenas achismos ou pesquisas inconclusivas. Ou seja, prometem, prometem e prometem, sem apresentar uma solução real para a avenida.
A tentativa de transformação da Conde da Boa Vista num organizado corredor de transporte por ônibus – desorganizado ela sempre foi –, ainda em 2008, pelo PT, teve inúmeros erros, evidenciados com o tempo de operação. Além de estações estreitas, o sistema estreou sem racionalização e durante meses linhas tiveram que ser cortadas pela então EMTU. Era ela quem representava o chamado Corredor Leste-Oeste. Custou R$ 14,7 milhões para ser adaptada.
Avenida comercial em Denver, no Colorado (EUA), é um exemplo de solução defendida por urbanistas. Mas para isso seria necessário transferir para vias paralelas a pesada operação de ônibus que a avenida recebe todos os dias
Mas o grande problema do corredor foi e é a manutenção. A Avenida Conde da Boa Vista foi abandonada pelas gestões públicas. Essa é a verdade. Quem anda por ela dia após dia entenderá. Não é apenas o comércio informal sobre as calçadas e travessias, e a sujeira visual e física que essa informalidade produz. É o abandono de gestão mesmo. A falta de cuidado, o desprezo pela via. É ver os abrigos de ônibus ficarem pretos de tantos resíduos acumulado dos ônibus e não fazer nada. É ignorar as pichações e a quebra dos letreiros onde deveriam constar a relação das linhas que passam nas paradas seletivas.
Os gestores pernambucanos precisam aprender a cultura da manutenção. Não é só construir e abandonar, de qualquer jeito. E é isso que fazemos aqui. A Conde da Boa Vista é um exemplo”,
Nair Beder, passageira e técnica em edificações
E, para isso, não é necessário projeto e milhões em caixa. É cuidado. Sem manutenção, a via ficou feia e os defeitos se destacaram. O feio, o sujo e o degradado não agregam. Não provocam pertencimento. Ao contrário, afastam e fazem o cidadão desprezar. E uma cidade para ser de todos precisa de pertencimento.
E, nesse caso, todos tem culpa, independente de partido. O PT, porque criou (com erros) e não manteve nos quatro anos seguintes, quando a gestão continuou sob a batuta do partido. E o PSB, porque, sob sua gestão (desde o fim de 2012 a responsabilidade por cuidar do corredor é do Estado), uma única “relevante” manutenção foi feita na avenida e, mesmo assim, ao custo de R$ 17 mil. De resto, apenas varrição. A prefeitura promoveu outras ações na via, mas de controle urbano e, não, na estrutura física do corredor.
SEM DADOS
Muito se tem prometido no período eleitoral, mas pouco se tem apresentado com embasamento sólido. Até 2012, a Conde da Boa Vista sequer fazia parte do Corredor Leste-Oeste projetado pelo então governador Eduardo Campos. Quando a imprensa questionava o que seria feito a partir do Derby, os gestores desconversavam, afirmando que esse ajuste seria visto no futuro. Somente em 2013, com o PSB assumindo a prefeitura, é que o problema começou a ser pensado. Enquanto isso, o corredor se degradava. Decidiram, naquela época, que iriam “improvisar” seis estações de BRT na via. Começaram a construi-las, mas as obras pararam e os monstrengos viraram moradia e banheiro de mendigos e reduto de viciados.
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Uma solução perfeita para a Avenida Conde da Boa Vista é tarefa difícil e ingrata. A via é uma espécie de pulmão viário do transporte por ônibus metropolitano. É destino preferido de muitos que se dirigem ao Centro. Recebe 4 mil viagens diárias de coletivos, 257 mil passageiros e 14% de todas as linhas de ônibus do sistema metropolitano. Como acomodar isso tudo e harmonizar com a necessidade de uma via para pedestres, estilo boulevard?
O modelo de Denver mais uma vez, agora em outro trecho da avenida comercial. Prioridade ao pedestre é a premissa
A única pesquisa que está sendo feita sobre o corredor – realizada pela Secretaria das Cidades – indica que será um desafio enorme retirar o transporte coletivo da via ou reduzi-lo em grande escala. Para onde transferi-lo? Uma solução seria relocar para as vias paralelas, como as Ruas Manoel de Brito e Visconde de Suassuna, mas e os recursos para as adequações necessárias que iriam viabilizá-las como corredor viário de transporte? De onde seriam retirados, se a prefeitura e o Estado não conseguem sequer fazer a manutenção da avenida?
Em reportagem do Blog De Olho no Trânsito, em julho passado, Nair Beder, técnica em edificações, resumiu bem o sentimento da população: “Os gestores pernambucanos precisam aprender a cultura da manutenção. Não é só construir e abandonar, de qualquer jeito. E é isso que fazemos aqui. A Conde da Boa Vista é um exemplo”, ensinou como moradora do bairro da Boa Vista e usuária do corredor. É isto. Aprendam!