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Após caso Tamarineira, mais um motorista é condenado por homicídio doloso por matar ao volante em Pernambuco

Condutor foi condenado a 20 anos pelo Tribunal do Júri de Caruaru, no interior do Estado. Uma das vítimas foi arrastada por 500 metros pelo motorista que estaria embriagado

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Roberta Soares

Publicado em 29/03/2022 às 17:59 | Atualizado em 30/03/2022 às 20:01
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Atualizada às 20h13

Mais um caso de crime de trânsito tem condenação por homicídio doloso (com intenção) num Tribunal do Júri em Pernambuco - algo que há alguns anos era impensável. Dessa vez, ocaso aconteceu em Caruaru, no Agreste do Estado, e o condutor foi condenado a 20 anos, sete meses e dez dias de reclusão em regime fechado.

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A condenação foi determinada pelo conselho de jurados da Vara do Tribunal do Júri de Caruaru, onze dias depois do julgamento da chamada Tragédia da Tamarineira, que virou exemplo para o País de que a sociedade não está mais tolerante com motoristas que bebem, correm e matam ao volante.

Nele, o réu João Victor Ribeiro foi condenado a 29 anos e quatro meses de prisão por matar três pessoas (uma delas uma criança e uma mulher grávida) e deixar duas feridas no bairro da Tamarineira, na Zona Norte do Recife, em 2017.

Em Caruaru, a condenação foi para o motorista José Aurélio dos Santos Meira pela prática de dois homicídios dolosos simples (Artigo 121, caput combinado com Artigo 18, inciso I, parte final, do Código Penal) contra o casal Rogério José Santos da Silva, 31,e Adelma Alaíde da Silva, 30.

ACERVO PESSOAL
Adelma caiu da moto e ainda chegou a ser socorrida com vida, falecendo a caminho do hospital. Mas Rogério, segundo a investigação da Polícia Civil, ainda foi arrastado por aproximadamente 500 metros pelo condutor - ACERVO PESSOAL

O casal voltava do trabalho para casa quando foi surpreendido pelo condutor, alcoolizado e em alta velocidade. Eram 18h30 do dia 19 de março de 2018.

José Aurélio Santos de Meira teria invadido a contramão da Avenida José Rodrigues de Jesus, no bairro Indianópolis, em Caruaru, e colidido contra a motocicleta das vítimas.

Adelma caiu da moto e ainda chegou a ser socorrida com vida, falecendo a caminho do hospital. Mas Rogério, segundo a investigação da Polícia Civil, ainda foi arrastado por aproximadamente 500 metros pelo condutor.

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O corpo da vítima ficou preso sob o veículo e, ao perceber o fato, José Aurélio de Meira ainda teria feito manobras para desprender o corpo. Quando conseguiu, fugiu do local sem prestar qualquer socorro às vítimas.

Toda a violência foi flagrada por câmeras e as imagens foram as principais provas do crime.

A condenação seguiu a lógica da acusação, feita pelo Ministério Público de Pernambuco (MPPE).

O promotor de Justiça Fabiano de Melo Pessoa defendeu que José Aurélio assumiu o risco de matar ao “dirigir um veículo em estado de embriaguez, desenvolver velocidade incompatível com as leis de trânsito e realizar manobra proibida que levou a chocar-se com a moto das vítimas”.

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Assim, o réu ultrapassou o que se poderia indicar como uma ação culposa, alcançando o campo do dolo eventual, ao assumir o risco de produzir o resultado morte das vítimas.

A defesa do motorista ainda tentou desclassificar o caso para crime culposo (sem intenção), previsto no Código de Trânsito Brasileiro (CTB), mas não conseguiu.

Como fugiu sem prestar socorro, o réu não foi submetido ao teste de alcoolemia, mas confessou ter bebido rum antes do sinistro de trânsito (não é mais acidente de trânsito que se diz. Entenda a razão). E as imagens mostram ele cambaleante.

JC IMAGEM
Ainda são muitos, muitos os casos em que a figura do Estado não fez o papel de cuidador como determina a legislação brasileira - JC IMAGEM

MENOS PUNIÇÃO

Para a família das vítimas, a expectativa era de que o réu pegasse uma pena ainda mais alta - pelo menos 30 anos. Mas o entendimento do MPPE e dos jurados foi de que foram dois homicídios dolosos simples, sem qualificadoras, o que poderia ampliar a pena.

“Queríamos que ela fosse maior. Ele arrastou meu sobrinho por 500 metros e, quando parou, sequer tentou salvá-lo. Parou o veículo três vezes e deu ré três vezes. No depoimento, afirmou que só depois é que viu a mão dele. Mentira. Foi algo desumano, flagrado por câmeras”, lamentou a tia do motociclista, Valdete Maria Santos.

E seguiu lamentando a desumanidade do condutor: “Nós acreditamos que se ele tivesse prestado socorro logo após a colisão, Rogério estaria vivo. Ele morreu enquanto era arrastado”, afirmou.

SEM QUALIFICADORAS, MAS CNH CASSADA

Mesmo assim, o crime não foi considerado qualificado. O entendimento do MPPE - seguido à risca pelos jurados e pela juíza Mirella Neiva - foi de que a violência empregada pelo condutor - como o fato de ele ter arrastado o motociclista por 500 metros, preso sob o veículo - não foi circunstância da morte.

“A qualificadora tem que ser circunstância da morte”, explicou a instituição.

O réu teve a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) cassada, como aconteceu com o condutor da Tragédia da Tamarineira.

"Conforme a sentença proferida no processo, o réu fica inabilitado, perdendo o direito de dirigir até dois anos após o efetivo cumprimento da pena". Isso significa que a carteira de habilitação do réu foi cassada e ele não poderá exercer o direito de dirigir pelos próximos 20 anos, 7 meses e 10 dias, sendo facultado a ele a possibilidade de requisitar nova habilitação somente com dois anos após o cumprimento integral da sentença e mediante o cumprimento das exigências legais", informou o MPPE. 

Segundo o art. 92, III, do Código Penal Brasileiro, a inabilitação para dirigir veículo vale pelo tempo equivalente ao da condenação.

E, segundo o Artigo 263 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), depois desse período o réu pode voltar a ser habilitando, passando por todo o processo no Detran-PE como se fosse a primeira habilitação.

A expectativa é de que, depois de cumprir um sexto da pena, o réu possa progredir para o regime semiaberto. José Aurélio está preso desde 2019.

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