A nova direção do Metrô do Recife, anunciada no fim de semana pela Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), foi bem recebida no setor metroferroviário. O sistema pernambucano, que perdeu metade da sua demanda de passageiros desde a pandemia de covid-19 e acumula um déficit anual apenas de custeio na ordem de R$ 300 milhões, vai ser comandado por um funcionário de carreira, o eletrotécnico Dorival Martins.
Embora tenha uma formação apenas em nível técnico - incluindo uma pós-graduação em gestão pública, sem a bagagem de um engenheiro elétrico, por exemplo, que ampliaria os conhecimentos do transporte sobre trilhos (difícil de entender e ainda mais de operar), o novo superintendente é da casa, o que por si só lhe dá credibilidade.
O entendimento de metroviários e técnicos do setor ouvidos pela Coluna Mobilidade é de que, ao menos desta vez, o Metrô do Recife não foi, novamente, usado politicamente para acomodar acordos do primeiro escalão. Dorival Martins é da manutenção da CBTU e estava atuando como gerente do setor.
A expectativa de que tenha força para conseguir recursos para o sistema, entretanto, é pouca. “A expectativa é boa no sentido de ser um funcionário da casa e conhecer os problemas. Mas precisa de uma boa equipe de retaguarda. E precisamos saber também o que o governo quer com a CBTU. Sem dinheiro, pode vir o superintendente da NASA que não resolve”, afirma em reserva um servidor.
O novo superintendente, entretanto, é visto como uma pessoa de diálogo. “Além de ser da casa, precisa ser uma pessoa aberta ao diálogo, coisa que ele é. Não adianta ser engenheiro eletricista, como tivemos no passado, e se achar dono da verdade. Já passamos por isso também”, acrescenta.
A indicação do novo superintendente foi escolha pessoal do atual diretor-geral da CBTU nacional, José Marques, que segue no comando da companhia desde a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Marques é ligado ao presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PL-AL), que mais uma vez mostrou que segue forte no governo federal.
Arthur Lira conseguiu vencer a força do senador Humberto Costa (PT), que defendia o nome do seu assessor parlamentar Dilson Peixoto, ex-vereador do Recife e petista de carteirinha.
Dorival Martins vai substituir Carlos Fernando Ferreira da Silva Filho, que comandava o sistema metropolitano desde abril de 2020. Na época, Ferreira foi o segundo superintendente em menos de dois meses e o terceiro desde outubro de 2019.
Carlos Ferreira é primo de Anderson Ferreira, ex-prefeito de Jaboatão dos Guararapes e candidato derrotado ao governo de Pernambuco. Agora, num acordo político com a governadora Raquel Lyra, vai comandar o Detran-PE - a terceira maior máquina de arrecadação do Estado.
O Metrô do Recife é, atualmente, um sistema abandonado, sem recursos sequer para garantir uma boa operação diária. Sem falar em investimentos, que inexistem há pelo menos cinco anos.
O déficit de custeio anual é de R$ 300 milhões.
E são muitas as consequências do abandono. Mas a principal delas é a quebra e a consequente paralisação do sistema, prejudicando os passageiros que dependem do serviço. Já foram 400 mil pessoas transportadas por dia, nas duas linhas principais do sistema: Linhas Centro e Sul. Agora, são menos de 200 mil passageiros diários (algo próximo a 160 mil).
Cemitério de trens do Metrô do Recife
A crise econômica aliada ao aumento de mais de 180% no valor da passagem - que subiu de R$ 1,60 para R$ 4,25 num período inferior a dois anos - e as quebras provocadas pelo sucateamento espantaram o usuário.
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Também de acordo com os dados encaminhados pela CBTU, foram nove quebras somente entre janeiro e abril de 2022. Em 2021, outras 22 paralisações. Algumas superiores a 24 horas de interrupção do sistema, o que comprova o grau de desmonte do metrô. A maioria com mais de 10h.
Sem recursos para nada, o Metrô do Recife também segue sem perspectivas, o que é o mais angustiante. Não recebe recursos do governo federal, via Administração Central da CBTU e Ministério das Cidades (antigo do MDR), e ainda viu o estudo de uma possível estadualização e futura gestão privada ser engavetado pessoalmente pelo ex-governador de Pernambuco Paulo Câmara (PSB).
Passageiros invadem cabine do METRÔ DO RECIFE
Em maio, o governador se comprometeu com os metroviários de que não iria avançar com o processo de estadualização e, posteriormente, concessão do Metrô do Recife à operação privada.
O processo de estadualização e concessão pública do Metrô do Recife seria iniciado ainda em maio de 2022. A modelagem e os valores foram apresentados ao Ministério da Economia no fim de 2021 e já tinham sido validados pela equipe técnica que está à frente dos estudos.
O governo de Pernambuco seria o gestor do futuro contrato de concessão pública do Metrô do Recife, um pacote que representaria o montante de R$ 8,4 bilhões em 30 anos. Desse total, R$ 3,8 bilhões seriam aportes públicos para reerguer o sistema e cobrir a diferença entre receita tarifária e despesa de operação.
Sendo, R$ 3,1 bilhões mobilizados pelo governo federal e R$ 700 milhões pelo governo de Pernambuco. E, dos R$ 3,1 bilhões bancados pela União (Ministério da Economia), R$ 1,4 bilhão seriam recursos que ficariam guardados para serem utilizados pelo Estado ao longo do contrato de concessão pública.
O R$ 1,4 bilhão seria a reserva para garantir o equilíbrio econômico financeiro do contrato, já que os estudos realizados em dois anos já apontaram que a receita gerada pela demanda de passageiros do Metrô do Recife não seria suficiente para cobrir o custo de operação.
O modelo a ser adotado pelo governo do Estado seria de concessão pública simples, sem contrapartida financeira ao longo do contrato.