Uma entrevista do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, nesta quarta-feira (2/8), deu a entender que o processo de privatização do Metrô do Recife poderá, de fato, ser engavetado pelo governo federal. E isso aconteceria devido ao papel social exercido pelo sistema de transporte metroferroviário da Região Metropolitana do Recife, que corta quatro municípios e atende a aproximadamente 200 mil pessoas por dia.
Esse papel social, segundo Fernando Haddad, está sendo considerado na revisão que o programa de privatização criado pela gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) está sofrendo pelo governo do presidente Lula (PT).
Por isso, essa característica do Metrô do Recife - que de fato atende, principalmente, bairros mais pobres da capital e da região metropolitana - poderá ser decisiva.
Nesta quarta, às 9h, Fernando Haddad participou do programa Bom dia, ministro, exibido no canal do Youtube do governo federal. Confira a entrevista na íntegra aqui.
DECISÃO FINAL SOBRE RETIRADA DA CBTU DO PROGRAMA DE PRIVATIZAÇÃO
O ministro, entretanto, usou o papel social como exemplo, sem citar diretamente a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), que é gestora e operadora do Metrô do Recife e foi incluída no Plano Nacional de Desestatização (PND) pela gestão Bolsonaro. Um dos cinco sistemas geridos pela CBTU, inclusive, foi privatizado no apagar das luzes do governo do ex-presidente, em dezembro de 2022: o Metrô de Belo Horizonte (MG).
Além do Metrô do Recife, a CBTU gere e opera os sistemas de João Pessoa (PB), Natal (RN) e Maceió (AL).
“O governo federal está revendo todo o plano de privatização da antiga gestão. Não sei se já há uma decisão dos ministérios envolvidos na discussão especificamente sobre essa companhia. São eles quem vão decidir qual empresa sai ou permanece. Mas, em geral, as empresas que têm um sentido mais social têm sido revistas para não serem privatizadas”, afirmou Haddad.
O ministro também falou sobre a estadualização do sistema, processo que aconteceu em todo o País e que deverá acontecer com o Metrô do Recife. “Algumas dessas empresas, inclusive, estão sendo repassadas para os estados. Isso acontece no País inteiro. Em SP, onde o metrô que começou municipal, há décadas passou para o Estado, o mesmo em Salvador, por exemplo”, disse.
METRÔ DO RECIFE PRECISA DE MAIS DE R$ 1 BILHÃO PARA RESOLVER SUCATEAMENTO
O governo federal precisaria investir, de imediato, mais de R$ 1 bilhão para fazer com que o Metrô do Recife voltasse a operar com as mínimas condições. Na verdade, seriam entre R$ 1,2 bilhão e R$ 1,5 bilhão. O valor foi apresentado pela Superintendência da CBTU no Recife, durante audiência pública no Senado Federal, em junho deste ano.
Os recursos seriam necessários apenas para reerguer a operação do Metrô do Recife, mantendo as condições operacionais mínimas. Seria para recuperar o material rodante, que são os trens e veículos de manutenção, realizar obras e serviços na via férrea e na rede elétrica, além de edificações no sistema. E seriam valores para serem aplicados no prazo de quatro a seis anos”, afirmou, na época, o gerente operacional de recursos humanos da CBTU/Recife, José Inocêncio Andrade.
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Até agora, o Metrô do Recife conseguiu a promessa de que o governo federal irá enviar R$ 260 milhões para o custeio, o que é considerado muito pouco diante do sucateamento do sistema.
CBTU E TRENSURB SEGUEM NO PROGRAMA DE PRIVATIZAÇÕES
As companhias metroferroviárias controladas pelo governo federal e que estavam com estudos de privatização concluídos seguem na mesma situação, apesar de o terceiro governo do presidente Lula ter chegado aos oito primeiros meses.
E vão continuar assim, pelo menos por enquanto e até que a revisão dos estudos seja finalizada. Até lá, vão permanecer no PPI (Programa de Parcerias de Investimentos).
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A permanência afeta diretamente os processos de duas empresas estatais: a CBTU, que opera o Metrô do Recife e outros três sistemas no Nordeste (João Pessoa-PB, Natal-RN e Maceió-AL, tendo perdido no fim de 2022 o Metrô de Belo Horizonte-MG para a concessão privada), e a Trensurb, que atende a Região Metropolitana de Porto Alegre (RS).
METRÔ DO RECIFE TEM UM DÉFICIT ANUAL DE R$ 300 MILHÕES
O Metrô do Recife é, atualmente, um sistema abandonado, sem recursos sequer para garantir uma boa operação diária. Sem falar em investimentos, que inexistem há pelo menos cinco anos. O déficit de custeio anual é de R$ 300 milhões.
E são muitas as consequências do abandono. Mas a principal delas é a quebra e a consequente paralisação do sistema, prejudicando os passageiros que dependem do serviço. Já foram 400 mil pessoas transportadas por dia, nas duas linhas principais do sistema: Linhas Centro e Sul. Agora, são menos de 200 mil passageiros diários (algo próximo a 160 mil).
A crise econômica aliada ao aumento de mais de 180% no valor da passagem - que subiu de R$ 1,60 para R$ 4,25 num período inferior a dois anos - e as quebras provocadas pelo sucateamento espantaram o usuário.
Também de acordo com os dados encaminhados pela CBTU, foram nove quebras somente entre janeiro e abril de 2022. Em 2021, outras 22 paralisações. Algumas superiores a 24 horas de interrupção do sistema, o que comprova o grau de desmonte do metrô. A maioria com mais de 10h.
ENTENDA O PROCESSO DE PRIVATIZAÇÃO DO METRÔ DO RECIFE
O processo de estadualização e concessão pública do Metrô do Recife seria iniciado ainda em maio de 2022. A modelagem e os valores foram apresentados ao Ministério da Economia no fim de 2021 e já tinham sido validados pela equipe técnica que está à frente dos estudos.
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O governo de Pernambuco seria o gestor do futuro contrato de concessão pública do Metrô do Recife, no valor de R$ 8,4 bilhões e com validade de 30 anos. Desse total, R$ 3,8 bilhões seriam aportes públicos para reerguer o sistema e cobrir a diferença entre receita tarifária e despesa de operação.
Sendo, R$ 3,1 bilhões mobilizados pelo governo federal e R$ 700 milhões pelo governo de Pernambuco. E, dos R$ 3,1 bilhões bancados pela União (Ministério da Economia), R$ 1,4 bilhão seriam recursos que ficariam guardados para serem utilizados pelo Estado ao longo do contrato de concessão pública.
O R$ 1,4 bilhão seria a reserva para garantir o equilíbrio econômico financeiro do contrato, já que os estudos realizados em dois anos já apontaram que a receita gerada pela demanda de passageiros do Metrô do Recife não seria suficiente para cobrir o custo de operação.
O modelo a ser adotado pelo governo do Estado seria de concessão pública simples, sem contrapartida financeira ao longo do contrato. Mas tudo foi engavetado pelo então governador de Pernambuco (PSB), Paulo Câmara, às vésperas das eleições estaduais e a pedido dos metroviários.