Às vésperas do leilão do Trem Intercidades (TIC) Eixo Norte - que ligará São Paulo a Campinas e significará a privatização da Linha 7 - Rubi da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), o sistema metropolitano de São Paulo -, ferroviários e metroviários tentam, de alguma forma, mobilizar a sociedade e convencer o poder público de que a privatização é mais um erro para o transporte público sobre trilhos.
O leilão do TIC e, consequentemente, da Linha 7 - Rubi está programado para esta quinta-feira (29/2) e, pelo menos por enquanto, caminha para acontecer sem atropelos ou adiamentos, e com pelo menos dois candidatos a assumir a concessão pelos próximos 30 anos.
Em conversa com a Coluna Mobilidade, a categoria - que atua no anonimato por medo de represálias administrativas - apresentou diversos argumentos para tentar suspender o leilão. O foco principal é a Linha 7, que deixará de ser operada pela CPTM após a concessão.
A empresa vencedora do leilão do TIC também passará a ser responsável pela Linha 7-Rubi, atualmente sob gestão da CPTM, ligando a estação Barra Funda a Jundiaí e passando por 17 estações.
O aumento do custo de operação para o governo do Estado e a necessidade de mais transbordos (mudança de veículo ou modal de transporte) para os passageiros são os principais pontos destacados pelos funcionários da companhia e defensores da gestão pública do transporte.
RAZÕES CONTRA A PRIVATIZAÇÃO
Confira, abaixo, algumas razões apontadas pela categoria para cancelar o leilão da Linha 7 - Rubi da CPTM ou, ao menos, desatrelar a ligação do projeto do TIC.
1) Fim do serviço da linha 710 (que permite viagens entre as linhas 7-Rubi e 10 -Turquesa da CPTM sem a necessidade de transferência de trens na estação Brás).
Com a privatização da linha 7 - Rubi, os ferroviários denunciam que o passageiro terá que realizar dois transbordos, descendo do trem duas vezes, na Barra Funda e no Brás, se quiser chegar ao ABC Paulista (e vice-versa).
2) O edital do leilão da Linha 7 - Rubi prevê a garantia de 90% da receita de bilheteria à concessionária que vencer a disputa, onerando ainda mais o poder público a longo prazo.
3) Os ferroviários alegam que as linhas privatizadas custam mais caro para transportar menos passageiros. Dizem que estudos mostram que as linhas concedidas recebem um repasse 4X maior para transportar metade dos passageiros.
4) Argumentam, por fim, que as linhas privatizadas têm maior número de falhas. Para isso, citam levantamentos feitos pela mídia oficial que mostram que, em 2023, as linhas 8-Diamante e 9-Esmeralda tiveram 95 falhas contra 48 falhas das 5 linhas públicas da CPTM.
5) Inicialmente, a Linha 7 - Rubi da CPTM não fazia parte do projeto do Trem Intercidades (TIC) Eixo Norte. A primeira proposta do TIC, inclusive, foi elaborada pela CPTM, mas revista pelo Estado para permitir a concessão à iniciativa privada. Os ferroviários alegam que o projeto que vai a leilão nesta quinta tem falhas que não vão garantir a demanda de passageiros necessária e, assim, onerar ainda mais o Estado pelo contrato de concessão.
LEILÃO ATRELADO AO TREM INTERCIDADES (TIC)
O leilão do TIC nesta quinta é o início de uma série de 13 leilões para concessões, desestatizações e parcerias previstas pelo governo de São Paulo para 2024, que têm investimentos estimados em R$ 120 bilhões. O Trem Intercidades Eixo Norte, que ligará São Paulo a Campinas, será o primeiro projeto a ser leiloado pelo estado este ano.
O Trem Intercidades será construído e operado via Parceria Público-Privada (PPP), com investimentos previstos de R$ 13,5 bilhões. O governo estima que o projeto beneficiará cerca de 15 milhões de pessoas em 11 municípios, gerando mais de 10,5 mil empregos, entre diretos, indiretos e induzidos.
A promessa do governo é de que o TIC Eixo Norte possibilite o transporte de quase 550 mil pessoas por dia no primeiro ano de operação completa do empreendimento. Isso porque, além do trem expresso que ligará a capital paulista a Campinas, com uma parada em Jundiaí, o projeto prevê o Trem Intermetropolitano (TIM) entre Jundiaí e Campinas, que vai passar pelas cidades de Louveira, Vinhedo e Valinhos.
O governo de São Paulo diz que a previsão é que, em 2031, os três modelos estejam em operação simultaneamente. Neste cenário, somando a quantidade diária de passageiros, o estudo de demanda prevê o transporte de mais de meio milhão de pessoas.
METROFERROVIÁRIOS CONTESTAM ESTIMATIVAS DO ESTADO
Os ferroviários, entretanto, contestam muitas dessas informações. Alegam que o projeto do TIC elaborado pela CPTM, ainda em 2018, foi completamente alterado para atrair a iniciativa privada, virando quase expresso. Quando, na verdade, deveria ser um sistema parador, com um traçado que atraísse passageiros lindeiros.
“Em resumo, não vai compensar ir de trem até Campinas porque a tarifa será cara e o tempo de viagem quase idêntico ao de um automóvel. A questão é o custo do trem, que vai onerar muito. E o TIC deveria ser uma alternativa ao carro, não ao ônibus. A previsão é de que leve 1h04 entre São Paulo e Campinas, enquanto que de ônibus são 1h20 e, de carro, 1h30. Com uma tarifa estimada em até R$ 64, você acha mesmo que as pessoas vão deixar o carro em casa e optar pelo trem?”, indaga um ferroviário.
“O projeto que o Estado estará leiloando não é sustentável e vai ter baixa demanda, fazendo com que o poder público coloque cada vez mais dinheiro da população no contrato de concessão privado. Temos feito esses alertas, mas o governo não volta atrás. Uma coisa é subsidiar um sistema de transporte para beneficiar o passageiro. Outra coisa é colocar dinheiro público por falta de planejamento”, critica outro ferroviário.