Caso Arturo Gatti: sete anos e muitas dúvidas

Ex-boxeador canadense havia sido encontrado morto dentro de um flat em 2009
Raphael Guerra
Publicado em 06/07/2016 às 7:00
Foto: Inicialmente, polícia afirmou que Gatti foi morto pela esposa, mas mudou versão. Foto: Alexandre Belém/ Arquivo JC


Férias de 30 dias no paraíso de Porto de Galinhas. Lugar perfeito para ir com a mulher e o filho. O famoso boxeador canadense Arturo Gatti, 37 anos, estava de volta ao Brasil para descansar. Mas, dias após chegar à praia do litoral pernambucano, uma discussão por ciúmes em um bar foi o pontapé para uma tragédia. A série de reportagens "Investigações sob suspeita" tem início hoje relembrando as reviravoltas e dúvidas que cercam a morte do campeão mundial de boxe.  Poucas horas depois de ter início mais um plantão no Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), a força-tarefa sul foi acionada. A equipe, comandada pelo delegado Josedite Ferreira, seguiu às pressas para a praia de Porto de Galinhas. Não era um caso comum: um ex-boxeador canadense havia sido encontrado morto dentro de um flat. Era manhã de 11 de julho de 2009. O corpo de Arturo Gatti estava caído no meio da sala. O pugilista trajava apenas cueca. Ao lado, uma alça de bolsa suja de sangue. Peritos criminalistas encontraram duas marcas de ferimentos: uma no pescoço e outra na parte de trás da cabeça dele. À polícia, Amanda Rodrigues, esposa de Gatti, contou que foi a primeira pessoa a encontrar o corpo. Dizia estar em choque pelo suicídio do marido. 

Diante do cenário, Josedite Ferreira pediu que ela o acompanhasse até o DHPP. Era preciso, naquele momento, um depoimento formal da mulher - a única que estava dentro de casa com o lutador, além do filho do casal, de apenas um ano. Delegado experiente, Josedite não tinha dúvidas: Amanda havia assassinado o próprio marido, por enforcamento, enquanto ele dormia. Mas tudo foi negado por ela, que revelou ter tido uma discussão na noite anterior por conta de ciúmes. Gatti, embriagado, teria a agredido. Mesmo assim, foram para casa e dormiram. Somente no meio da manhã, ao acordar, é que ela teria visto o corpo e acionado a polícia. Ao final do depoimento, a surpresa. Na condição de viúva, ela foi informada que seria autuada em flagrante por homicídio e encaminhada à Colônia Penal Feminina. "Há contradições", sentenciou Josedite Ferreira. À imprensa, ele ainda afirmou que a mulher teria questionado sobre a possibilidade de outra pessoa ter entrado no quarto. "Humanamente impossível isso. No quarto só entra quem tem cartão magnético. E fica no segundo andar. Não tinha como alguém ter subido pela janela", disse à época.  

PRIMEIRA REVIRAVOLTA

Amanda permaneceu por 19 dias presa até que a Justiça concedeu o habeas-corpus, graças a uma reviravolta no caso. Laudos dos institutos de Medicina Legal e Criminalística apontaram que o ex-boxeador havia cometido suicídio. O delegado Paulo Alberes, que havia assumido as investigações, decidiu seguir a tese dos peritos e encerrou o caso concluindo que Amanda era inocente e que a vítima tirou a própria vida em um momento de fúria. Mas os familiares de Gatti não aceitaram esse resultado. Para eles, a mulher do ex-boxeador foi responsável pelo assassinato dele com o objetivo de ficar com a herança. O testamento havia sido modificado cerca de um mês antes dele morrer. Nas linhas, Gatti afirmava que tudo seria deixado para Amanda e  para os filhos. O Ministério Público de Pernambuco seguiu a tese  da polícia. Pediu o arquivamento do processo.

SEGUNDA REVIRAVOLTA

Em 2011,  o caso Arturo Gatti volta à tona: peritos particulares, contratados pela família do lutador revelam supostas contradições nos laudos dos profissionais pernambucanos. Eles concordaram com a teoria do enforcamento. Mas, enquanto os peritos daqui afirmaram que a morte foi provocada por asfixia após o ex-boxeador se enforcar, os estrangeiros garantiram que a asfixia foi provocada por "ação homicida". A novela Gatti ganhava novo capítulo. O Ministério Público de Pernambuco decidiu analisar as duas perícias para decidir se o caso seria reaberto. E foi o que aconteceu meses mais tarde, já em 2012. A promotora de Justiça Paula Catherine Ismail anunciou à imprensa que novas diligências e solicitações de perícias complementares seriam necessárias para esclarecer a morte de Gatti. Amanda Rodrigues estava de volta à condição de suspeita. Mas com um vitória: a Corte Superior de Justiça da cidade de Quebec, no Canadá, decidiu que ela e o filho teriam direito a US$ 3,4 milhões (aproximadamente R$ 6,1 milhões) do patrimônio do ex-lutador.

O DEFECHO

Sem alarde, todas as solicitações de perícias foram atendidas, a pedido da Justiça. No ano seguinte, a promotora afirmou novamente que Gatti cometera suicídio. O caso estava encerrado. "Não havia qualquer indício de homicídio nos exames realizados pelos peritos. Para mim, não há dúvidas de que foi suicídio. E a justiça acatou a recomendação do Ministério Público para que o processo fosse arquivado", revelou a promotora Paula Ismail, em entrevista ao Ronda JC. Às vésperas de o caso completar sete anos, a morte de Gatti permanece emblemática para amigos, familiares e fãs. Para eles, a teoria do suicídio está longe de ser a verdadeira.        

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