Um estudo da Rede de Observatórios da Segurança, divulgado nesta quarta-feira (09), sugere que o racismo está relacionado a uma parte significativa das mortes registradas em ações policiais. Em Pernambuco, 93% das vítimas da violência letal policial são negras. Esse dado é referente ao ano de 2019.
“Entre os estados brasileiros que foram analisados na pesquisa, Pernambuco aparece com um dos maiores percentuais de mortes em ações policiais. Isso nos leva a apontar um racismo institucional. Há um desequilíbrio que deve ser observado. Um recado muito enérgico de que algo precisa ser mudado, como por exemplo a necessidade de investimentos em capacitação policial”, afirmou a socióloga Edna Jatobá, uma das pesquisadoras do estudo.
No ano passado, 74 pessoas foram mortas em ações policiais no Estado, segundo os dados obtidos com a Secretaria de Defesa Social (SDS). Desse total, 68 eram negros (inclui pretos e pardos) e cinco eram brancos e um não teve a cor informada. “É preciso entender como cada uma dessas mortes aconteceram”, cobrou Edna Jatobá.
“Há quem diga que mais pessoas negras morrem pela violência policial porque existem mais pessoas negras na sociedade. Se pensarmos desta forma, também deveria haver mais representação negra nas universidades, no mercado de trabalho e na política. Mas só observamos mesmo a representatividade nos índices de mortes. Em Pernambuco, negros compõem 61,9% da sociedade e são 93,1% das pessoas que foram mortas pela polícia em 2019. Assim, o discurso de quem tenta nos convencer de que a violência não tem cor é desmontado”, apontou relatório da Rede de Observatórios da Segurança.
MORTES EM AÇÕES POLICIAIS CRESCEM
O número absoluto de mortes em decorrência de ação policial em Pernambuco, em 2019, é bem menor do que em outros estados pesquisados, como o Rio de Janeiro (1.814), São Paulo (815) e na Bahia (650). Mas a pesquisa aponta que essas mortes estão em crescimento no Estado. Em 2015, por exemplo, foram 37 óbitos - metade do número registrado em 2019.
Segundo a SDS, 101 pessoas já foram mortas em ações policiais neste ano - ultrapassando o número registrado ao longo de todo o ano passado. Desse total, só cinco eram brancos.
Uma das vítimas foi Jhonny Lucindo Ferreira, de 17 anos. Negro, morador de Jaboatão dos Guararapes, na Região Metropolitana do Recife, ele foi executado a tiros no último mês de agosto. Segundo familiares, ele seguia de moto com um amigo para a casa de uma tia. Houve uma abordagem feita por dois policiais militares e Jhonny acabou morto. A PM alegou, à época, que o adolescente e o amigo estariam em “atitude suspeita”. Um inquérito policial foi instaurado para apurar as circunstâncias da morte de Jhonny, mas a família segue sem resposta até hoje.
O QUE DIZ A SDS
Em nota, a SDS afirmou que “s mortes por intervenção policial englobam confrontos com criminosos em operações policiais de repressão ao narcotráfico, legitima defesa e também situações em que houve imprudência, imperícia ou até dolo por parte do servidor público. Cada ocorrência é investigada com rigor, seja no âmbito criminal ou administrativo, de modo que haja a devida responsabilização em caso de cometimento de crimes ou infração disciplinar”.
A nota da SDS destacou ainda “o trabalho desenvolvido pelas forças de segurança de Pernambuco na busca da qualificação técnica e excelência dos procedimentos, operações com uso de inteligência policial para redução das chances de confronto armado e a adoção de práticas voltadas aos direitos humanos e à proteção de todas as vidas, desde a formação do servidor até os cursos de capacitação continuada ao longo da carreira”.
Por fim, a pasta afirmou que um estudo divulgado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública neste ano apontou que “Pernambuco foi o quarto estado do Brasil que mais reduziu as mortes decorrentes de intervenção policial no ano de 2019. Comparando com 2018, a diferença foi de -32,8%. Ainda de acordo com o mesmo levantamento, o Estado apresentou a 4ª menor taxa de mortes por intervenção policial do País (0,8 por 100 mil habitantes no ano)”.
DELEGACIA NÃO SAIU DO PAPEL
Criado há mais de 13 anos, o programa Pacto pela Vida previa a criação de uma delegacia para combater o racismo em Pernambuco. Mas, a promessa da unidade especializada não saiu do papel. E nem há mais expectativa para isso.
Nas diretrizes do Pacto pela Vida, a Delegacia Antidiscriminação, como foi denominada, teria por finalidade a "prevenção e repressão à discriminação ou preconceito social, de raça, cor, crença religiosa, idade, deficiência, convicção filosófica ou política, ideologia, sexo ou opção sexual, etnia ou procedência nacional ou regional". A promessa era de que a delegacia seria implementada ainda em 2007.
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