INVESTIGAÇÃO

Após 11 meses, nenhum PM foi punido por ação violenta no ato contra Bolsonaro no Recife

Dois trabalhadores perderam a visão após serem atingidos por tiros de bala de borracha disparados por policiais

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Raphael Guerra

Publicado em 03/05/2022 às 17:35
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Já se passaram 11 meses, mas a Corregedoria da Secretaria de Defesa Social (SDS) não concluiu nenhum dos sete procedimentos administrativos disciplinares (PADs) instaurados para apurar a conduta dos policiais militares que agiram com violência contra manifestantes que participavam de um ato pacífico em repúdio ao governo do presidente Jair Bolsonaro, na área central do Recife, em 29 de maio de 2021.

Questionada pela coluna Ronda JC, a assessoria da SDS alegou que três relatórios foram concluídos, mas "estão em análise para elaboração de parecer pelo corregedor-geral". Os outros quatro estão em andamento. Não foi dado prazo para a conclusão e publicação de possíveis penalidades aos policiais.

Ao todo, segundo a SDS, 16 policiais (três oficiais e 13 praças) foram identificados e afastados das atividades nas ruas no começo de junho do ano passado. A coluna questionou à SDS quantos deles permanecem afastados, mas a pasta não respondeu.

No final de março deste ano, a SDS informou que o Inquérito Policial Militar que havia sido instaurado foi concluído com o indiciamento, por prática de crime militar, de quatro dos policiais investigados, sendo dois oficiais e dois praças, todos já submetidos a processos disciplinares.

"Os autos do IPM foram encaminhados à Central de Inquéritos do Ministério Público, para análise e possível oferecimento da denúncia", disse a nota.

Apesar de questionada, a SDS também não quis informar por quais crimes os militares vão responder.

INDICIAMENTOS

No mês passado, a Polícia Civil de Pernambuco confirmou que indiciou o policial militar do Batalhão de Choque que atirou no adesivador Daniel Campelo da Silva, de 51 anos. A vítima passava pela Ponte Duarte Coelho, durante o protesto, quando foi atingida no olho esquerdo e perdeu a visão.

A Polícia Civil informou que o PM foi indiciado pelos crimes de lesão corporal gravíssima e por omissão de socorro. Além disso, outros oito policiais do Batalhão de Radiopatrulha também foram indiciados por omissão de socorro.

Os indiciamentos dos outros PMs ocorreram porque, após ser atingido pelo tiro de bala de elastômero (borracha), Daniel Campelo chegou a pedir ajuda. Mas, como mostraram imagens gravadas, os policiais que estavam na ocorrência não prestaram assistência à vítima.

Os nomes dos policiais não foram divulgados pela Polícia Civil. O resultado do inquérito foi encaminhado ao Ministério Público, que vai decidir se oferece denúncia à Justiça.

Em caso de condenação, a pena para o crime de omissão de socorro é de um a seis meses de detenção, que pode ser convertida em multa arbitrada pela Justiça. Já para o crime de lesão corporal gravíssima, a pena pode chegar a oito anos de prisão.

OUTRA VÍTIMA

Além de Daniel Campelo, que só passava perto do protesto, o arrumador de contêineres Jonas Correia de França, de 29 anos, foi atingido na Ponte Princesa Isabel.

O terceiro sargento do Batalhão de Choque Reinaldo Belmiro Lins, acusado de disparar o tiro de elastômero, foi indiciado e, atualmente, responde na Justiça pelo crime de lesão corporal grave, com o agravante de o crime ter sido cometido por um militar.

A pena, em caso de condenação, pode chegar a cinco anos de prisão. O processo ainda está em fase de audiências de instrução e julgamento para ouvida de testemunhas.

Durante a ação desastrosa da PM, a vereadora Liana Cirne (PT) foi atingida no rosto por spray de pimenta ao tentar negociar com policiais militares do Batalhão de Radiopatrulha, na Ponte Santa Isabel. Esta investigação foi concluída pela Polícia Civil, mas a SDS não revelou o resultado, sob a alegação de que o caso está sob segredo de Justiça.

QUEM DEU A ORDEM PARA ATIRAR?

DIEGO NIGRO / ACERVO JC IMAGEM
DE SAÍDA À frente da corporação desde fevereiro de 2017, o coronel Vanildo Maranhão deixa o cargo em momento de extrema turbulência e insatisfação entre os militares - DIEGO NIGRO / ACERVO JC IMAGEM

Três dias após a ação desastrosa da PM, o então comandante geral da corporação, Vanildo Maranhão, foi exonerado. No seu lugar, ficou o coronel José Roberto Santana. A saída de Maranhão se deu em meio aos depoimentos que apontaram ele como o responsável por dar a ordem de ação dos policiais contra os manifestantes, mesmo com o ato ocorrendo de forma pacífica, conforme documento revelado em primeira mão pela coluna Ronda JC.

Vanildo nunca veio a público dar sua versão sobre o caso. Ele foi transferido para a reserva remunerada.

Dias depois, o delegado federal Antônio de Pádua, até então secretário estadual de Defesa Social, também foi exonerado do cargo. Humberto Freire, até então secretário adjunto, assumiu a titularidade da pasta.

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