É um ganho quando alcançamos qualquer aumento, mesmo que discreto, na adesão média de isolamento social – reconhecido cientificamente como a alternativa que mais traz resultados para conter a transmissão do novo coronavírus. Mas o que vemos hoje, dia em que se completa a primeira semana de quarentena rígida em cinco municípios do Grande Recife, é que não conseguimos ir além da faixa média dos 50%, o que é bastante aquém do que recomenda a Organização Mundial de Saúde (OMS) para se deitar a curva epidêmica e salvar vidas.
Há 40 dias, quando Pernambuco iniciava o processo de aceleração de casos e mortes por covid-19, o secretário de Saúde de Pernambuco, André Longo, já clamava por um índice de isolamento elevado. “Se estivéssemos com nível de distanciamento social na casa dos 70%, certamente nossa curva de aceleração epidêmica estaria menor do que está. Mas se nenhum isolamento tivesse sido adotado, a curva estaria bem mais íngreme do que está hoje”, disse o secretário, em coletiva de imprensa transmitida online do dia 13 de abril.
Naquela ocasião, ele já deixava claro que o cenário poderia estar melhor se a população respeitasse as medidas de restrições à circulação. “O ideal seria algo em torno de 70%, e temos flutuado na casa dos 50%, o que mostra que ainda podemos nos esforçar mais”, acrescentou. Esse depoimento de Longo há mais de um mês, comparado com o panorama atual, faz a gente perceber o quanto pouco avançamos, mesmo vivendo uma quarenta dura no decorrer nos últimos sete dias.
Para a médica sanitarista Bernadete Perez, vice-presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), as taxas atuais de isolamento social no Recife, Jaboatão dos Guararapes, Camaragibe, São Lourenço da Mata e Olinda não estão suficientes para conter o crescimento dos casos e das mortes, como também para permitir que a rede de saúde consiga atender os pacientes de forma adequada. Na quinta-feira (21), nas cinco cidades, a taxa média de isolamento social foi de 50,3%, contra 48,4% da quinta-feira da semana anterior, antes do início da quarentena rígida. É um tímido aumento.
“Não adianta só termos um decreto para instituir uma quarentena se não existe uma política de proteção social para os mais vulneráveis. É muito difícil, por exemplo, fazer isolamento em palafitas do Recife. As pessoas que vivem nessas condições, aliadas ao calor da cidade, não conseguem sobreviver sem circular. São medidas delicadas para uma região com muita desigualdade social como a nossa”, acredita Bernadete, que também é professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
Para ela, as autoridades sanitárias precisam executar ações que dialoguem com as comunidades mais pobres e oferecer alternativas para realização do isolamento. “As escolas da rede pública de ensino estão fechadas. Elas poderiam servir de alojamento para essas pessoas (que não conseguem seguir as regras da quarentena por condições precárias de moradia). Não é só fazer isso. Também é necessário fazer orientação comunitária de forma continuada e possibilitar caminhos para que os agentes comunitários de saúde cheguem perto das pessoas neste momento, mesmo que remotamente, para fazer o trabalho de educação em saúde”, complementa Bernadete, com a certeza de que o isolamento social é valioso para salvar vidas, mas precisa vir acompanhado de medidas que garantam o bem-estar das pessoas socioeconomicamente vulneráveis.