*Reportagem atualizada em 10/02/2023, às 13h07
(Reportagem atualizada para informar sobre resolução de 10/02/2023, que proíbe TODAS AS POMADAS DE CABELO)
Nos últimos dias, oftalmologistas de todo o Brasil têm relatado um aumento no número de casos que associam graves prejuízos oculares, incluindo cegueira, ao uso de pomadas para cabelo utilizadas para modelar e fixar penteados.
Só no domingo (5), as emergências da Fundação Altino Ventura (FAV), no Iputinga, Zona Oeste do Recife, e do Hospital de Olhos de Pernambuco (Hope), na Ilha do Leite, área central, atenderam, juntas, cerca de 100 mulheres com dor e irritação nos olhos, pálpebras inchadas e dificuldade para enxergar.
O relato das pacientes é de uso de pomada para modelar e fazer tranças no cabelo.
A informação é do oftalmologista Kayo Espósito, da FAV. "São pomadas que causam uma conjuntivite química. Só na FAV, foram 60 atendimentos ontem (domingo, dia 5)", diz.
A maioria das pacientes apresentou os sintomas nos olhos, incluindo muita dor, após fazerem penteados feitos para ir a prévias carnavalescas.
Geralmente, os sintomas são observados depois da lavagem dos cabelos onde foi utilizado o produto ou depois do contato com água da chuva, banho de chuveiro, água de piscina ou do mar.
Entre as pacientes que foram à FAV com lesão nos olhos, está a operadora de caixa Marcela Carolino Machado, de 39 anos.
Ela fez tranças no cabelo no último sábado (4) e não tinha conhecimento dos riscos associados a pomadas para modelar os cabelos.
"Fiz o penteado para ir a um bloco de Carnaval, e a pessoa que fez até comentou que eu tivesse cuidado ao lavar o cabelo, para não cair (o produto) nos olhos, como qualquer outro penteado. Quando começou a chover no sábado, a maquiagem e o produto do cabelo escorreram para os olhos", conta Marcela.
Imediatamente, ela sentiu ardência nos olhos, mas achou que o incômodo era por causa do glitter da maquiagem. "Era como se fosse uma conjuntivite. Dormi e, no dia seguinte (domingo), acordei com os olhos colados. Lavei com água gelada e soro. No fim da tarde de ontem (domingo), não aguentei e fui para a emergência (da Fundação Altino Ventura). Quando eu cheguei lá, só vi mulheres com tranças no cabelo."
Como tratamento, o oftalmologista prescreveu dois colírios e um lubrificante para os olhos de Marcela. Além disso, o olho esquerdo, que foi o mais afetado, recebeu um curativo. "Hoje ainda sinto arder os olhos, e a vista permanece embaçada. Mas meus olhos estão 70% melhores, em comparação com ontem. Passei seis horas com o curativo."
Para quem pensa em fazer penteados com pomadas modeladoras, Marcela dá um recado. "A minha mensagem é que as pessoas não usem esses produtos. São várias pessoas que apresentam esse problema na visão, e isso é causado pela mesma composição das pomadas."
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) tem investigado marcas e fabricantes relacionados às reações adversas, que já levaram milhares de pessoas às unidades de pronto atendimento em diversos Estados do Brasil.
Desde dezembro, a Anvisa tem publicado alertas orientando sobre o uso das pomadas de cabelo e resoluções suspendendo produtos irregulares.
Nos dias 23 e 24 de janeiro, a Anvisa novas medidas de fiscalização para as pomadas capilares para trançar cabelos.
As medidas têm relação com a investigação sobre a ocorrência de eventos adversos graves após o uso dos produtos. Todos esses produtos podem oferecer risco à saúde.
E na sexta-feira (10/02/2023), a Anvisa publicou resolução em que PROÍBE TODAS as pomadas para modelar e trançar cabelos estão com a comercialização proibida pela Anvisa. Enquanto a medida estiver em vigor, nenhum lote de qualquer desses produtos pode ser comercializado e não deve ser utilizado por consumidores e profissionais de beleza.
"Caso você tenha adquirido algum desses produtos, não faça uso dele. Caso tenha em sua residência ou estabelecimento produtos para os quais foi determinado recolhimento, a recomendação é de que entre em contato com a empresa onde o produto foi adquirido, para verificar a forma de devolução", orienta a Anvisa.
"Quem fez uso recente de algum desses produtos deve observar o cuidado ao lavar os cabelos, para que o produto não entre em contato com os olhos. Em caso de qualquer efeito adverso, procure imediatamente o serviço de saúde mais próximo de você e informe a Anvisa pelos endereços eletrônicos abaixo."
A Anvisa destaca que a interdição do produto é uma medida cautelar que visa proteger a saúde da população em caso de risco à saúde e permanece vigente, enquanto são realizados testes, provas, análises ou outras providências requeridas para a investigação mais aprofundada do caso.
Em janeiro, o Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO) fez um alerta sobre os cuidados com o manuseio das pomadas para cabelo.
O presidente da Sociedade Brasileira de Córnea, Sérgio Kwitko, membro do CBO, alerta que é necessária atenção por parte dos consumidores à composição química desses produtos.
"Os relatos que circulam em redes sociais e em ambientes hospitalares associam reações, como cegueira temporária, irritação e sensação de queimadura nos olhos, ao uso de pomadas modeladoras de diferentes marcas e fabricantes, o que indica a necessidade de atenção por parte dos consumidores à composição química desses produtos", diz a nota de alerta do Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO).
Segundo o alerta do CBO, a metilcloroisotiazolinona (MCI) e a metilsotiazolinona (MI), que são compostos químicos comumente utilizados na formulação dessas pomadas para cabelos, são uma ameaça à visão.
"Esses conservantes contêm elementos tóxicos à pele e mucosas, podendo causar alergias e queimaduras nos olhos e na pele, além de toxicidade pulmonar e neurotoxicidade."
Nos olhos, esses compostos químicos podem provocar blefarites (inflamações das pálpebras), conjuntivites (inflamação da conjuntiva) e ceratites (úlceras de córnea), assim como grave comprometimento da visão.
O Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO) orienta os consumidores a consultarem o rótulo dos produtos cosméticos.
Em caso de compra, é importante observar que o uso não deve ser feito nas proximidades dos olhos.
Também se deve ficar atento à possibilidade de o produto escorrer para os olhos, quando houver contato com a água ou o suor.
"Como orientação de forma geral, eu recomendo evitar o uso dessas pomadas a princípio, já que a gente não consegue identificar quais são as pomadas que estão com formulação que causa dano", diz o oftalmologista da FAV Kayo Espósito.
"Pacientes estão chegando com amostras de várias pomadas diferentes. Então, a minha orientação é evitar usar qualquer uma dessas pomadas neste momento, já que a gente não sabe ainda qual dos agentes está na formulação e que causa esses problemas na visão", alerta Kayo.