SALVADOR - Um novo plano para a erradicação do câncer de colo do útero, a partir da vacinação contra o papilomavírus humano (HPV), tem levado médicos a defenderem a dose única da vacina contra o vírus para aumentar a cobertura vacinal.
O plano, divulgado recentemente pela Organização Mundial da Saúde (OMS), considera uma diminuição de doses da vacina para crianças e adolescentes. Em contrapartida, aumenta-se o alcance entre a população-alvo do esquema vacinal.
No Brasil, a aplicação da vacina contra HPV é feita em duas doses para crianças e adolescentes entre 9 e 14 anos. No Sistema Único de Saúde (SUS), o imunizante é distribuído gratuitamente e previne infecções para os tipos mais frequentes de HPV: 6, 11, 16 e 18 (quadrivalente). Nas clínicas privadas de vacinação, é aplicada a HPV nonavalente, recentemente disponibilizada no País e com a formulação de cinco tipos adicionais do vírus, em comparação com a que está no SUS.
"Os países que estão colocando a dose única são todos usando a nonavalente. O fato de ser nona ou quadri não muda (a recomendação do número de doses). O que muda é: nós temos segurança para introduzir a dose única de HPV, independente da vacina que a gente vai fazer?", questionou a médica infectologista Rosana Richtmann, do Instituto de Infectologia Emilio Ribas (SP), em palestra que ministrou ontem durante o 23º Congresso Brasileiro de Infectologia, em Salvador.
Ela é coautora do artigo HPV vaccination programs in LMIC: is it time to optimize schedules and recommendations?, publicado recentemente no Jornal de Pediatria. O texto revisa estudos sobre a eficiência da dose única contra HPV nas diferentes faixas etárias e aplicabilidade dessa nova recomendação da OMS. O trabalho observou resultados positivos, na literatura científica, sobre os efeitos da dose única em programas de vacinação.
"A partir dos estudos, estou cada vez mais convencida de que a gente, fazendo seguimento (acompanhamento) dessas meninas, faça dose única com a vacina que há hoje no Brasil. Assim, eu também ampliaria a faixa etária, colocaria mais gente sobre proteção e deixaria a dose única, desde que se faça acompanhamento (de quem recebeu o imunizante)", destacou Rosana.
ESTRATÉGIA
Segundo a OMS, adotar a dose única como estratégia pode ser um importante passo para aumentar as coberturas e proporcionar a proteção para um número maior de meninas que não têm acesso à imunização contra o HPV.
Com essa iniciativa, médicos acreditam que é possível favorecer o controle de doenças relacionadas ao HPV e, com isso, ter um impacto real e definitivo na mortalidade pelo câncer de colo do útero.
BAIXA COBERTURA
O HPV é um vírus que causa infecções sexualmente transmissíveis, provoca verrugas em tecidos orais e genitais e, dependendo do tipo do vírus, pode causar câncer, como os de colo do útero, vulva, vagina, pênis e canal anal.
A vacina contra o HPV é aplicada no sistema público de saúde, com foco principalmente em pessoas que ainda não iniciaram a vida sexual.
No Brasil, a adesão à vacina de HPV é baixa: não alcança o nível recomendado pela OMS, de 90% entre nove e 14 anos.
Segundo um estudo da Fundação do Câncer, com dados de 2013 a 2020, 76% do público-alvo tomaram a primeira dose e apenas 56% tomaram as duas doses previstas no esquema vacinal brasileiro. Em relação aos meninos, os números são ainda menores, com apenas 52% vacinados com a primeira dose em 2022.
SINTOMAS DO HPV
A infecção pelo HPV não apresenta sintomas na maioria das pessoas. Em alguns casos, o HPV pode ficar latente de meses a anos, sem manifestar sinais (visíveis a olho nu), ou apresentar manifestações subclínicas (não visíveis a olho nu).
As primeiras manifestações da infecção pelo HPV surgem entre dois e oito meses após a infecção, mas pode demorar até 20 anos para aparecer algum sinal.
COMO DETECTAR
O diagnóstico do HPV é atualmente realizado por meio de exames clínicos e laboratoriais, dependendo do tipo de lesão, se clínica ou subclínica.
O exame preventivo contra o HPV, o Papanicolau, é o mais comum para identificar de lesões precursoras do câncer de colo do útero. Esse exame ajuda a detectar células anormais no revestimento do colo do útero, que podem ser tratadas antes de se tornarem câncer.
O exame não é capaz de diagnosticar a presença do vírus. No entanto, é considerado o melhor método para detectar câncer de colo do útero e suas lesões precursoras.
Quando essas alterações que antecedem o câncer são identificadas e tratadas, é possível prevenir quase todos os casos. Por isso, é muito importante que as mulheres façam o exame de Papanicolau regularmente.