Notícias e análises sobre medicina e saúde com a jornalista Cinthya Leite

Saúde e Bem-estar

Por Cinthya Leite e equipe
TRANSTORNOS ANSIOSOS

ANSIEDADE: O perigo da falta de ambulatórios de saúde mental públicos no Brasil, o país mais ansioso do mundo

Psiquiatras fizeram alerta para esse cenário durante o 40º Congresso Brasileiro de Psiquiatria, que terminou neste sábado (21) em Salvador

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Cinthya Leite

Publicado em 21/10/2023 às 19:45 | Atualizado em 21/10/2023 às 19:53
"Uma em cada três pessoas, ao longo da vida, vai ter sintoma significativo de ansiedade, a ponto de preencher critérios diagnósticos", alerta psiquiatra - FREEPIK/BANCO DE IMAGENS

SALVADOR (BA) - Durante a pandemia de covid-19, os transtornos de ansiedade aumentaram em 32% nas Américas, segundo dados da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas). Antes da crise sanitária, o Brasil já liderava o ranking, com a população mais ansiosa do mundo. Um retrato dos transtornos mentais feito pela Organização Mundial de Saúde (OMS) mostra que 9,3% dos brasileiros têm ansiedade patológica, tipo que prejudica a qualidade de vida e pode durar a vida inteira, se não houver tratamento.

Esse foi o tema de uma das sessões voltadas para jornalistas que fizeram a cobertura da 40ª edição do Congresso Brasileiro de Psiquiatria, que terminou neste sábado (21) no  Centro de Convenções Salvador. O debate foi mediado pelo presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), Antônio Geraldo da Silva. 

"Uma em cada três pessoas, ao longo da vida, vai ter sintoma significativo de ansiedade, a ponto de preencher critérios diagnósticos. A boa notícia é que a maioria dos quadros tem boas opções de tratamento medicamentoso e psicoterápico. Mas nem todas as pessoas recebem acompanhamento adequado. E estamos falando de uma doença (ansiedade) que não tem remissão espontânea (controle espontâneo de uma patologia com o passar do tempo, sem tratamento formal)", alertou o psiquiatra Márcio Bernik, coordenador Programa de Ansiedade do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (IPQ-FMUSP). 

LACUNA NO SUS

O médico lamenta que, "apesar de existir uma grande oportunidade de tratamento das chamadas doenças mentais comuns, que são a ansiedade e a depressão basicamente", os programas de saúde nacionais não dão a devida atenção para os casos.

"Nós temos as UBS (Unidades Básicas de Saúde), onde os médicos não são muito capacitados (para atender os quadros de ansiedade e depressão) e raramente há psiquiatras. Há ainda os Caps (Centros de Atenção Psicossocial), que são mais voltados para (transtornos de) álcool e drogas, doenças mentais graves, esquizofrenia... E os ambulatórios de saúde mental públicos, que poderiam dar conta dessa grande quantidade de pessoas com transtornos mentais comuns, praticamente não existem. Os que temos estão em atividade em grandes universidades públicas", salienta Bernik. 

ANSIEDADE: "A PESSOA VIVE ESPERANDO O PIOR"

Ao lado dele, o também psiquiatra Antonio Nardi, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) participou da sessão para a imprensa sobre ansiedade, durante o 40º Congresso Brasileiro de Psiquiatria, e fez um alerta importante sobre os quadros graves. "Nos casos de transtorno de ansiedade generalizada (conhecido pela sigla TAG), sem tratamento, a pessoa vive esperando o pior. É uma situação patológica, que prejudica o indivíduo. Ele fica tão preocupado com algo que acaba por limitar a vida. E isso, sem acompanhamento adequado, pode durar a vida inteira."

Na visão de Antonio Nardi, a pessoa que se mantém o tempo todo em alerta, esperando o pior, não consegue viver bem. "Há quem pense que esperar o pior é bom, porque o que vier é lucro. Mas isso é algo que gera ansiedade. São crenças disfuncionais que trazem sofrimento. Ao esperar o pior, a pessoa sofre com o pior todos os dias, a toda hora, achando que vai acontecer algo ruim."

O psiquiatra sublinhou que o TAG tem tratamento eficaz. "Há medicamentos, terapia cognitivo-comportamental... Ainda destacamos a importância de mindfulness (conjunto de técnicas de meditação e respiração) e de tarefas relaxantes, como também atividades religiosas, capazes de trazer boas energias que acalmam. São indicações que controlam os quadros ansiosos graves."

RECOMENDAÇÕES

Ainda segundo ressaltou Antonio Nardi, é necessário não negligenciar, nem normalizar, a exacerbação dos sintomas de ansiedade. "O TAG é um transtorno crônico de ansiedade e geralmente quem o vivencia não procura tratamento. Mas é algo muito comum. E muitas pessoas acham que se preocupar e sofrer é um traço bom da personalidade, que mostra responsabilidade, maturidade... Mas não é verdade. Quem tem TAG se preocupa com tudo e sofre com tudo. Qualquer coisa vira um problema, e os acontecimentos diversos são experimentados com o mesmo nível de gravidade na mente da pessoa", afirma o psiquiatra. 

O médico ainda acrescentou que a sociedade precisa enxergar o TAG como um problema psiquiátrico que, não tratado, provoca sintomas físicos como enxaqueca, dores, tensão muscular e insônia. "São sinais que levam as pessoas aos médicos em geral, e não ao psiquiatra. Dessa forma, o TAG acaba sem tratamento adequado", alertou. 

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