MPPE investiga e cobra medidas contra mortes de negros em ações da polícia em Pernambuco

Levantamento aponta que 100% dos mortos em ações policiais no Recife, em 2021, eram negros
Raphael Guerra
Publicado em 30/11/2022 às 14:50
Das 105 pessoas mortas em ações policiais em Pernambuco, no ano passado, 101 eram negras Foto: WELINGTON LIMA/JC IMAGEM


O Ministério Público de Pernambuco (MPPE) instaurou inquérito civil para investigar e cobrar do governo do Estado medidas contra a alta taxa de negros mortos em ações da polícia. Levantamento Rede de Observatórios da Segurança apontou que 100% dos óbitos ocorridos durante as abordagens policiais no Recife, no ano de 2021, foram de pessoas negras

Quando se observam os números de Pernambuco, o percentual é de 96,2%. Ao todo, 105 mortes decorrentes de intervenção policial no Estado foram somadas pela Rede de Observatórios no ano passado. Destas, 95 vítimas eram pardas e seis pretas. Apenas quatro eram brancas.

A classificação da raça tem o mesmo critério do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que considera negros a soma de pardos e pretos.

Entre os sete Estados brasileiros analisados (incluindo Bahia, Ceará, Maranhão, Piauí, São Paulo e Rio de Janeiro), Pernambuco aparece em segundo lugar com maior taxa de mortes de negros nas ações policiais em 2021. O Rio aparece em primeiro, com 1.060 óbitos. 

Diante dos números, o promotor Westei Conde, titular da 7ª Promotoria de Defesa da Cidadania da Capital Promoção e Defesa dos Direitos Humanos, determinou a instauração do inquérito civil para investigar a letalidade da população negra nas ações das polícias Civil e Militar nos anos de 2020, 2021 e 2022.

O promotor determinou que, no prazo de 30 dias, a Secretaria de Defesa Social (SDS)  apresente informações sobre as providências adotadas com o objetivo de reduzir os índices de letalidade policial da população negra e eventuais medidas de combate ao racismo adotadas pelas polícias.

Também solicitou à Corregedoria Geral da SDS, no mesmo prazo, informações sobre providências adotadas para apurar a responsabilidade administrativa de policiais envolvidos em ocorrências. 

Westei Conde determinou ainda que as polícias Civil e Militar apresentem relatórios detalhados sobre as operações que resultaram em mortes - apontando os locais (bairros/cidade) e características das vítimas (raça, idade, gênero). 

Por fim, o promotor decidiu designar uma audiência para tratar do tema com entidades ligadas aos direitos humanos - como o Conselho Estadual de Promoção da Igualdade Racial e o Gabinete Assessoria Jurídica Organizações Populares (Gajop). 

Procurada pela Coluna Segurança, a assessoria de imprensa da SDS não se pronunciou até a publicação deste texto. 

AÇÃO POLICIAL E MORTE EM SÍTIO DOS PINTOS

ALEX OLIVEIRA/JC IMAGEM - INVESTIGAÇÃO Segundo denúncia do MPPE, policiais simularam que Victor Kawan tinha uma arma de fogo, o que foi negado por testemunhas

Uma das mortes registradas no Recife foi a do adolescente negro Victor Kawan Souza da Silva, de 17 anos. Ele foi morto pela polícia no bairro de Sítio dos Pintos em 11 de dezembro de 2021. 

Segundo testemunhas, ele e um amigo andavam de moto quando passaram a ser seguidos pela viatura policial. Houve uma perseguição e, pouco depois, Victor, que estava na garupa, foi baleado no peito. Ele morreu na UPA da Caxangá. Na época, a Polícia Militar alegou que o tiro foi disparado porque os garotos teriam reagido. Victor estaria sem capacete.

Investigação da Polícia Civil, no entanto, apontou que não houve reação e que os policiais  mentiram ao dizer que a vítima estaria armada. Além disso, segundo o inquérito, os PMs tentaram destruir provas e o número de tiros disparados foi bem maior do que o dito por eles. 

Em outubro deste ano, o MPPE denunciou José Monteiro Maciel de Lima e Clezya Patrícia de Souza Silva pelos crimes de homicídio doloso duplamente qualificado (motivo torpe e sem chance de defesa da vítima) e homicídio tentado - este último referente ao amigo de Victor que não se feriu.

Os policiais tiveram as prisões decretadas e, atualmente, aguardam julgamento no Centro de Reeducação da Polícia Militar (Creed), em Abreu e Lima. Eles também respondem a um processo administrativo disciplinar, na Corregedoria da SDS, e podem ser expulsos da corporação. 

 

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