SAÚDE MENTAL

"PMs se queixam da carga horária extensa e falta de efetivo", diz psicóloga sobre situação da Polícia Militar de Pernambuco

Tiros e mortes no 19º Batalhão e ameaça à subcomandante do 16º, ambos no Recife, expõem crise na PM pernambucana

Raphael Guerra
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Raphael Guerra
Publicado em 16/01/2023 às 15:26 | Atualizado em 16/01/2023 às 16:04
GUGA MATOS/JC IMAGEM
Policiais militares reclamam que estão fazendo muitos plantões extras em dias de folga - FOTO: GUGA MATOS/JC IMAGEM

O ataque a tiros praticado por um soldado contra colegas do 19º Batalhão e a ameaça a uma subcomandante do 16º, em menos de um mês, expõem uma crise na Polícia Militar de Pernambuco. Mais do que isso: há urgência de maior atenção à saúde mental dos cerca de 16 policiais militares que estão na ativa.

No segundo semestre de 2022, a psicóloga Ana Cristina Fonseca foi uma das responsáveis por ministrar um curso para profissionais da segurança pública na Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe). Segundo ela, 70% dos participantes relataram a preocupação com a saúde mental. 

"Várias categorias estão propensas a lidar com situações desgastantes. Mas, no caso dos policiais, a vida está em risco todo dia. Isso afeta muito a saúde deles", pontuou a psicóloga. 

"No curso, os policiais relataram os problemas que os afligiam. Eles destacaram a saúde agravada pela profissão e por causa do contato com as armas de fogo. Os PMs também se queixam  da carga horária extensa e da necessidade de reforçar o efetivo", disse Ana Cristina Fonseca, que também é coordenadora geral de Graduação da Faculdade Frassinetti do Recife (Fafire).

O excesso de carga horária, que tem relação com os plantões extras em dias de folga, é uma reclamação cada vez mais comum entre policiais militares do Estado. Muitos relatam que, apesar da participação no Programa de Jornada Extra de Segurança (PJES) ser voluntária, há forte pressão nos batalhões para que eles trabalhem nos dias de descanso.

Atualmente, os policiais podem participar de até dez plantões extras por mês. Na semana passada, o governo estadual lançou a operação Pernambuco Seguro, com a promessa de mais policiamento nas ruas. Sem efetivo suficiente para isso, foi preciso recorrer, mais uma vez, ao PJES - sacrificando os PMs. 

De acordo com dados do Portal da Transparência, o Estado deveria contar com, no mínimo, 27.672 militares na ativa, ou seja, faltam cerca de 11 mil

Ana Cristina destacou que outro ponto chamou a atenção dela durante o contato com os policiais militares. "Apesar de muitos apresentarem sinais de síndrome de burnout, eles continuam gostando e tendo muito orgulho do trabalho e da corporação", disse.

A síndrome de burnout é caracterizada por um distúrbio emocional causado por estresse e esgotamento físico resultante de situações de trabalho. 

PROJETO DE SAÚDE MENTAL PARA POLICIAIS MILITARES

A psicóloga disse que uma equipe de professores da Fafire está elaborando um projeto de extensão para ajudar na saúde mental dos policiais militares do Estado. 

"A ideia é realizar atividades individuais e coletivas para acompanhamento da saúde mental dos policiais e identificar os casos que precisam ser encaminhados para os centros de atendimento à PM ou para nossa clínica-escola. Também há casos que podem ser encaminhados aos CAPs (Centros de Atenção Psicossocial)", explicou.

O projeto deve ser iniciado ainda neste primeiro semestre de 2023. 

PSICÓLOGOS NOS BATALHÕES DA POLÍCIA MILITAR

O novo comandante geral da Polícia Militar de Pernambuco, coronel Tibério César dos Santos, afirmou que está em análise a contratação de mais psicólogos para atendimento ao efetivo policial.

"O objetivo é lutar para que cada batalhão tenha um psicólogo no seu quadro para dar prevenção, orientação e identificar possíveis comportamentos que precisam de atenção", explicou, em entrevista à Coluna Segurança.

Os profissionais estão divididos em 26 batalhões - sem contar as outras 14 unidades especializadas (a exemplo do Batalhão de Polícia de Radiopatrulha e Batalhão de Operações Especiais).

"A Polícia Militar já tem a Diretoria de Ação Social, com psicólogos (fica no Recife). Nossa proposta é aumentar a quantidade desses profissionais, através de contratação junto ao governo do Estado. Nós também temos núcleo de assistência no município de Petrolina, com psicólogos que atendem também Salgueiro e Cabrobó. Nós temos em Serra Talhada, que atende Afogados da Ingazeira", citou o comandante.

Também há centros de assistência à saúde da PM em Palmares, na Mata Sul do Estado, e em Caruaru, no Agreste.

Segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, sete policiais militares da ativa cometeram suicídio em Pernambuco em 2021. Já em 2020, foram quatro óbitos.

O comandante geral da PM não deu prazo para aprovação do projeto de contratação dos psicólogos para cada batalhão. 

AMEAÇA À SUBCOMANDANTE DO 16º BATALHÃO

Por volta das 17h40 desse domingo (15), um tenente que estava de plantão no 16º Batalhão, no bairro de São José, área central do Recife, informou ao seu superior que havia encontrado na parede do auditório a seguinte mensagem: "Cuidado Maj para não ser a próxima".

O nome da major, que é subcomandante do batalhão, foi escrito na parede. Mas não será informado na reportagem por motivo de segurança. 

Após a descoberta da mensagem, o local foi isolado e passou pela perícia do Instituto de Criminalística. O laudo ainda será entregue.

REPRODUÇÃO
Ameaça à subcomandante do 16º Batalhão da PM foi escrita em parede de auditório - REPRODUÇÃO

A suspeita é de que a mensagem tenha sido escrita por um policial militar lotado no batalhão, visto que o acesso ao imóvel é bastante restrito. 

Em nota, a Polícia Militar de Pernambuco declarou que "os fatos estão sendo apurados em investigação específica, inclusive com os procedimentos periciais necessários, de maneira a identificar circunstâncias e autoria, para completa elucidação da questão". 

O prazo legal para conclusão do inquérito policial militar é de 40 dias, podendo ser prorrogado por mais 20. 

A Coluna Segurança questionou à assessoria da Polícia Militar sobre quais medidas foram adotadas para garantir a segurança da subcomandante do 16º Batalhão, mas não houve resposta.

A coluna apurou que, já há algum tempo, o clima no batalhão é de muita insatisfação entre os militares. Os relatos são de pressão por queda nos números da violência, perseguição e excesso de plantões extras. Fatos que podem ter relação com a ameaça à subcomandante. 

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Ameaça à subcomandante do 16º Batalhão da PM foi escrita em parede de auditório - FOTO:REPRODUÇÃO

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